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Polícias voltam aos protestos. ​O que separa forças de segurança e Governo?

20 jan, 2020 - 22:49 • Celso Paiva Sol

Sindicatos mostram cada vez menos tolerância para promessas não cumpridas. Por outro lado, parece óbvio que a área da segurança continua a não ter o dinheiro de que precisa. Por exemplo, para aquilo que os polícias mais querem, razão pela qual os protestos continuam.

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Da manifestação de 21 de novembro às concentrações marcadas para esta terça-feira, o que continua a separar os sindicatos das forças de segurança e o Governo?

A grande diferença está na postura do Ministério da Administração Interna, tanto na forma como passou a encarar o diálogo com os sindicatos, como no conteúdo que tem levado para essas conversas.

O alcance social e político da manifestação de 21 de novembro, mostrando inequivocamente que alguma coisa tem que ser feita para devolver estabilidade e capacidade às forças de segurança, parece ter conseguido desbloquear algumas negociações. Mas ainda não chega.

Por um lado, os sindicatos mostram cada vez menos tolerância para promessas não cumpridas, por outro, parece óbvio que a área da segurança continua a não ter o dinheiro de que precisa. Não chega, por exemplo, para aquilo que os polícias mais querem, razão pela qual os protestos continuam.

Os temas que se seguem vão estar em discussão até março de 2020. Nalguns casos, as duas partes já chegaram a um consenso, mas noutros o acordo parece difícil.

  • Pagamento dos suplementos não pagos em período de férias

O problema remonta a 2011, ao último Governo de José Sócrates, quando foi decidido deixar de pagar, nas férias, os suplementos que os polícias recebem durante o resto do ano. Depois de uma longa batalha judicial pela recuperação daquele pagamento, a Associação Sindical dos Profissionais de Policia (ASPP) conseguiu, em outubro de 2018, que o Supremo Tribunal Administrativo lhe desse razão – uma ordem judicial que, ainda assim, o Ministério da Administração Interna só agora aceitou cumprir.

Mas, além de voltar a pagar os suplementos durante as férias, a tutela vai também pagar os retroativos ao longo dos próximos quatro anos, a um ritmo de 25% da dívida por ano. Os polícias vão receber essas verbas nos meses de março e de outubro de cada ano. Os sindicatos exigiam que a dívida fosse saldada toda de uma vez, mas acabaram por aceitar o calendário proposto, e dessa forma encerrar este dossier.

  • Plano Plurianual de Admissões das Forças de Segurança

Transformou-se na principal bandeira do ministro Eduardo Cabrita, não só no âmbito do Orçamento do Estado em construção para 2020, mas para toda a legislatura.

O ministro promete incorporar 10 mil elementos na PSP, na GNR e no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) até 2023. Os contornos exatos da medida só serão conhecidos quando o plano for aprovado em Conselho de Ministros, mas é desde já apresentada como a solução para o crónico problema da falta de efetivos. De caminho, ajuda também a rejuvenescer as forças e a criar o conceito de serviços partilhados.

Os sindicatos da PSP e associações da GNR dizem que, por mais espetacular que o anúncio possa parecer, isto é o mínimo que o Governo pode fazer para manter as forças operacionais. Só por limite de idade, até 2023 irão sair da PSP 3.600 elementos; da GNR outros 3.300. Também neste caso, e mesmo que os pormenores sejam ainda muito poucos, os sindicatos admitem aceitar o plano do Governo, e também fechar este dossier.

  • Suplementos remuneratórios

O Ministério da Administração Interna ainda não disse exatamente o que é que pretende fazer, mas tudo indica que irá finalmente pôr em prática a ideia antiga de reorganizar a lista de suplementos que existem nas duas forças de segurança, e sempre que possível uniformizá-los.

Em causa não estarão aumentos, mas apenas a sua redefinição. As associações e sindicatos já apresentaram propostas e agora esperam para ver.

  • Nova Lei de Programação das Infraestruturas e Equipamentos das Forças de Segurança

Faz parte do calendário negocial apresentado pelo MAI, mas a proposta concreta só será conhecida na reunião agendada para 13 de fevereiro.

Em causa está a renovação da lei que está em vigor (2017-2021) e por ela passam muitas das reivindicações dos sindicatos e associações. Os polícias queixam-se das instalações, dos equipamentos e das viaturas, e o investimento nessas áreas é determinante para aproximar posições.

  • Segurança e saúde no trabalho

No calendário proposto pelo Ministério da Administração, a conversa sobre segurança e saúde no trabalho com os sindicatos está agendada para 5 de março.

Mesmo não fazendo parte das reivindicações mais mediáticas, os polícias querem negociar melhorias nestas áreas.

Temas fora das negociações

Fora do plano negocial proposto pelo gabinete de Eduardo Cabrita estão as duas principais reivindicações dos profissionais da PSP e da GNR, razão pela qual os protestos se mantêm, e ameaçam repetir-se.

  • Actualização remuneratória

É a questão que mais divide as duas partes. Os profissionais da PSP e da GNR queixam-se da tabela remuneratória que têm, em especial nos índices de início de carreira. As críticas subiram de tom nesta mudança de legislatura, porque na anterior viram melhorias em quase todas as outras carreiras da área da justiça e segurança, como é o caso dos magistrados do Ministério Público, da Polícia Judiciária e do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.

Se 2020 não for o ano destes polícias, então é quase certo que Eduardo Cabrita não terá descanso por parte destes profissionais. O MAI não incluiu a questão nos cinco pontos do calendário negocial em curso e nas reuniões já realizadas deixou claro que não tem dinheiro para falar sobre melhorias remuneratórias.

  • Subsídio de risco

É uma das principais e mais antigas reivindicações, mas continua sem fazer parte dos planos do Governo. Apesar da recomendação aprovada por maioria na Assembleia da República, já lá vão dois anos, o Ministério da Administração Interna continua sem equacionar a sua implementação.

Aos sindicatos, o secretário de Estado adjunto e da Administração Interna já disse que esse assunto não está em cima da mesa, pelo menos neste calendário negocial.

Vai continuar a ser um ponto importante de divergência entre as partes, não só porque o Ministério ignora uma recomendação do Parlamento, mas sobretudo porque o dia a dia vai mostrando que o risco desta atividade é real. Os sindicatos não abdicam deste ponto e, enquanto estiver por concretizar, será sempre motivo de protestos.

Sindicatos e Movimento Zero separados nos protestos desta terça-feira

Ao contrário do que aconteceu a 21 de novembro, agora não há um protesto centralizado em Lisboa, mas sim mais de uma dezena espalhados por todo o continente e ilhas.

As organizações que convocaram a última manifestação optaram, desta vez, por dividir o protesto em três: em Lisboa, em frente ao Ministério das Finanças no Terreiro do Paço, a partir das 16h00; em Braga, a partir das 17h30, junto ao estádio que vai receber a primeira meia-final da Final Four da Taça da Liga entre o Braga e o Sporting; e em Faro, no Jardim Manuel Bívar, junto à marina da cidade, a partir das 16h00.

O Movimento Zero, de natureza inorgânica – que nasceu e cresceu nas redes sociais – marcou desta vez os seus próprios protestos. A partir das 9h30, promete estar em todos os aeroportos do país, tanto no continente como nas ilhas. Neste caso, anuncia-se um protesto por tempo indeterminado.

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