20 abr, 2018 - 07:58 • Teresa Almeida
Se nada for feito em matéria de incêndio florestais, o pior ainda pode estar para vir. O alerta é deixado pelo especialista norte-americano em incêndios florestais Mark Beighley.
O especialista, antigo dirigente dos Serviços Florestais dos Estados Unidos, está em Lisboa para apresentar, esta sexta-feira, um novo estudo sobre os incêndios em Portugal. O documento conclui que os fogos do ano passado não foram “o pior” que pode acontecer.
Em 2017, arderam 500 mil hectares de floresta. Os céus negros, assim se chama o novo patamar referido por este especialista norte-americano, pode chegar aos 750 mil hectares de área ardida num só ano.
O relatório atribui a esse cenário, o mais grave até agora, uma probabilidade de concretização de 5%, uma percentagem baixa mas real, sobretudo à medida que os impactos das alterações climáticas se acentuam.
O consultor norte-americano avisa que há 45% de probabilidades de Portugal enfrentar um ano de fogos que consumam entre 100 a 200 mil hectares. A probabilidade desce para 20% de voltar a ocorrer incêndios em que ardam entre 200 e 500 mil hectares, como aconteceu no ano passado. Já anos de incêndios que destruam até 50 mil hectares e até 100 mil hectares têm uma probabilidade de 12% e 18%.
Neste contexto, Mark Beighley volta a sua atenção para os meios técnicos e humanos de que o país dispõe. Neste campo, o panorama não é otimista. Diz este especialista que Portugal não tem experiência ou forças de combate aos incêndios para gerir um fogo de grandes dimensões. O norte-americano lembra o relatório de 2009, onde já previa anos como 500 mil hectares de área ardida - notas que pouca influência tiveram na implementação de medidas, desde então, para prevenir tal catástrofe.
Beighley fala de medidas marginalmente implementadas - sobretudo as que se relacionam com a prevenção, a gestão de combustíveis e a redução de ignições - mas admite que para estas falhas poderá ter contribuído o contexto de crise financeira.
Tempestade perfeita
De uma forma particular, Beighley fala de uma "tempestade perfeita" para explicar o que aconteceu no ano passado: seca severa, ondas de calor, os vastos oceanos de florestas inflamáveis e o furacão "Ophelia" a meio de outubro, a que se juntaram os milhares de fósforos fora de controlo - é assim que este especialista caracteriza a população portuguesa.
O autor lembra que, quando comparado com outros países do sul da Europa com as mesmas condições meteorológicas e de combustíveis, Portugal apresenta um desproporcional número de ignições de origem humana face à sua população. De todos os fogos registados, 98% apontam para esta causa.
O relatório versa ainda sobre a perspetiva do combate e dos meios disponíveis. O norte-americano recorda que o ponto forte do combate aos incêndios não são os aviões ou os camiões, mas os bombeiros, destacando que o número de bombeiros profissionais e voluntários ter caído 33% em 11 anos.
A idade e o desinteresse por uma profissão mal paga e sem carreira podem justificar esse afastamento dos jovens e dos mais experientes. Neste capítulo, este especialista aponta o recurso a outros meios, como a Força Aérea, que poderia servir para a verificação do terreno e um combate musculado.
Neste relatório, o autor fala ainda da organização e admite que, a par da Autoridade Nacional de Proteção Civil, que deveria ficar apenas com os fogos urbanos, deveria surgir uma agência para a gestão integrada de fogos rurais, que deveria ficar responsável pelos restantes incêndios no país.