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Tudo o que já se sabe sobre o sismo na Turquia e Síria

08 fev, 2023 - 13:36 • Pedro Valente Lima

Não era registado um sismo tão forte na região há quase 100 anos. Balanço de mortos nos dois países já ultrapassa barreira dos 11 mil. Milhares de pessoas continuam desaparecidas. Ajuda está a chegar aos dois países, mas regime de Assad dificulta contactos com a Síria.

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Turquia e a Síria tentam erguer-se dos escombros na sequência do sismo de segunda-feira. São milhares de mortos, dezenas de milhares de feridos e centenas de milhares desalojados em ambos os países, em contagens ainda por fechar dado o elevado número de pessoas desaparecidas.

As operações de resgate não descansam, calculando-se que milhares de pessoas ainda se encontrem presas entre os vários prédios que colapsaram com o terramoto e as réplicas seguintes.

O sismo, de 7.8 graus de magnitude na escala de Richter, foi um dos mais fortes dos últimos 100 anos. A OMS calcula que 23 milhões de pessoas tenham sido diretamente afetadas pelos abalos.

Em diversas cidades turcas, falta agora água, eletricidade e acesso a comunicações. Na Síria, a situação consegue ser mais drástica, com o sismo a somar-se à crise humanitária que se vive no país na sequência da guerra civil que estalou em 2011.

A ajuda internacional já está a começar a chegar às áreas afetadas, com Portugal a enviar uma equipa de 53 operacionais da Proteção Civil, GNR, INEM e bombeiros, que deverá partir rumo à região esta quarta-feira à noite.

Mas, afinal, o que é que se sabe até agora sobre o terramoto que abalou e destruir largas partes do sul da Turquia e do norte da Síria?

Quão violento foi o sismo?

O terramoto, de 7.8 na escala de Richter, aconteceu durante a madrugada, pelas 4h17 locais (1h17 em Lisboa), num momento em que a grande maioria da população se encontrava a dormir, dificultando que se protegesse atempadamente aos primeiros sinais do sismo.

"Fugi imediatamente, não tinha onde esconder-me", conta à Renascença André Sousa. O português, hospedado em Gaziantep, revela ter acordado com o abalo e que, enquanto "descia pela escadaria", viu "tudo a partir, os pedaços de revestimento todos a cair para o chão".

André Sousa diz ter tido a "sorte" com o hotel, que resistiu aos danos mais graves. No entanto, na rua, estava instalado o pânico.

"As pessoas gritavam por Deus, enquanto os edifícios ruíam totalmente."

Ao sismo inicial, seguiram-se dezenas de réplicas, todas acima de 4 graus de magnitude na escala de Richter, com a mais forte a atingir os 7.5.

O tremor de terra foi dos mais violentos na região no último século. A última vez que se registou um abalo de igual intensidade foi a 26 de dezembro de 1939, em Erzincan, no leste da Turquia.

Na altura, o sismo causou mais de 32 mil mortes e provocou um "tsunami" no Mar Negro, a cerca de 160 quilómetros do epicentro.

Que impacto está a ter nas populações?

Até ao momento, as autoridades turcas e sírias já confirmaram milhares de mortes. O Presidente turco, Recep Erdogan, já declarou três meses de estado de emergência e um fundo de cinco mil milhões de euros.

No total, as previsões da OMS apontam que 23 milhões de pessoas tenham sofrido as consequências diretas do sismo, entre as quais 1,4 milhões são crianças.

Dia e noite, as operações de resgate têm retirado as populações dos escombros. Mas, de acordo com as estimativas da mesma organização, os números finais poderão atingir os 20 mil mortos nos próximos dias.

À Renascença, Nelson Olim, conselheiro da Organização Mundial da Saúde, diz que a "maior parte dos desaparecidos vão ser dados como mortos mais cedo ou mais tarde".

"Basta saber ler nas entrelinhas. Centenas de prédios colapsados, sabendo que o sismo ocorre às 4 da manhã, com a probabilidade de estar muita gente em casa a dormir. Basta começar a multiplicar isto."

Dias depois dos abalos, contam-se já dezenas de milhares de feridos e milhares de edifícios e infraestruturas destruídas. Na Turquia, centenas de milhares de desalojados foram acolhidos em alojamentos provisórios, montados em centros universitários, por exemplo.

Contudo, boa parte da população afetada vê-se obrigada a pernoitar ao relento, com chuva, neve e temperaturas negativas, que têm chegado aos -7ºC.

Depois do sismo, sobreviventes tentam resistir ao frio na Turquia
Depois do sismo, sobreviventes tentam resistir ao frio na Turquia

Em Gaziantep, a apenas sete quilómetros do epicentro do sismo, André Sousa relata que as pessoas têm feito "fogueiras nas ruas, porque está muito frio". "Nos últimos dois dias, houve fortes nevões."

Segundo o viajante português, a eletricidade "já foi reposta", mas "ainda não existe" água nas torneiras.

À Renascença, Amina Naham confirma este cenário, dois dias depois: "O que tem feito mais falta é a água potável, que foi cortada em todos os prédios".

A enfermeira brasileira, a viver na cidade do sul da Turquia com o marido sírio, explica que o hospital local está "a retirar os doentes, porque o prédio está muito abalado" e em risco de colapsar.

"Quem tem carro está com as suas famílias dentro dos carros, nas praças", acrescenta Amina Naham. As pessoas têm evitado ficar em casa, com medo de novos desabamentos.

Que ajuda internacional está a ser prestada à Turquia?

Tem-se assistido a uma grande mobilização internacional, com vários países a prometer auxílio, nomeadamente através do envio de operacionais, material médico e provisões.

A União Europeia está a mobilizar 1.200 socorristas para a Turquia, num total de 25 equipas de busca e salvamento. Nestas contas inclui-se Portugal, que esta quarta-feira envia uma missão com 53 operacionais de Proteção Civil, GNR, INEM e bombeiros, assim como seis cães de busca.

O bloco comunitário está também a coordenar a entrega de geradores de eletricidade, tendas, cobertores e equipamentos de tratamento de águas, aponta a Agence France-Presse.

Já o sistema de satélite Copérnico, da UE, foi ativado para providenciar serviços urgentes de mapeamento das zonas afetadas, acrescenta a AFP.

O Reino Unido também assegurou o envio para a Turquia de 76 especialistas em busca e salvamento, assim como equipas de emergência médica.

Os Estados Unidos estão a coordenar iguais esforços no envio de equipas para apoiar as operações de resgate no país. De acordo com a AFP, 100 bombeiros e engenheiros de estruturas do condado de Los Angeles, a par de seis cães.

Japão, Coreia do Sul, México, Egito, Israel e também Rússia, entre outros, já prometeram apoio humanitário a Ancara.

E à Síria, tem havido apoio internacional?

O regime ditatorial de Bashar al-Assad e a guerra civil instalada no país desde 2011 não são, decerto, um facilitador de relações diplomáticas com a comunidade internacional.

À Renascença, o diretor executivo da Amnistia Internacional Portugal admite ser mais fácil ajudar a Turquia, embora destaque que a Síria não deve ficar para trás.

"Uma não exclui a outra. Muito do trabalho e do esforço que estão a ser feitos na Turquia - e bem -, tem também de ser replicado no noroeste da Síria, onde o terramoto também teve mais impacto."

Para Pedro Neto, "a comunidade internacional tem de lidar com o interlocutor principal, que é Bashar al-Assad, e tem de haver garantias de entrada" da ajuda humanitária.

"Muitas destas pessoas já eram deslocados internos, já viviam sem condições. Agora, com esta catástrofe, esse perigo e esse problema aumenta exponencialmente", salienta.

O diretor realça ainda haver um "sinal de alarme e preocupação sobre que ajuda é que estas pessoas estão a receber". "Se é que estão a receber alguma ajuda."

Apesar da rejeição geral no contacto com Damasco, somam-se as garantias de assistência à escala global. Balasz Ujvari, porta-voz da comissão europeia, explica que "a União Europeia está em contacto com os seus parceiros humanitários no terreno".

O bloco comunitário pretende "financiar organizações humanitárias que estejam a realizar operações de busca e salvamento, ao mesmo tempo que fornece água e apoio sanitário, e distribui cobertores e artigos de higiene nas áreas afetadas".

Os EUA mostram-se "comprometidos" na ajuda aos sírios afetados pelo sismo, mas rejeitam colaborar com o governo de Bashar al-Assad. Washington optará por canalizar apoios para organizações não-governamentais no terreno.

Já a Rússia confirmou o envio de equipas de resgate para o norte da Síria. Entretanto, os elementos das Forças Armadas russas destacados no país já enviaram 300 operacionais para ajudar nas operações de busca e salvamento, nota a AFP.

Iraque, Irão, Israel e Reino Unido também garantem ajuda humanitária às populações sírias.

Maioria das atualizações são da Turquia. O que se passa na Síria?

Essa é uma das grandes preocupações para a OMS e para a Amnistia Internacional. Enquanto as autoridades turcas têm apresentado uma resposta mais robusta à crise, a Síria terá maior dificuldade em prestar assistência à população afetada.

De acordo com Adelheid Marschang, responsável de emergências da OMS, é "uma crise que se sobrepõe a múltiplas crises" humanitárias e de saúde que afetam o país há mais de uma década.

O conflito na Síria, nomeadamente entre as forças de Damasco e rebeldes, não só dificulta a coordenação das operações de resgate, como impede um apuramento exato das vítimas e estragos decorrentes do sismo.

Sabe-se, no entanto, que o regime de al-Assad aproveitou o caos provocado pelo terramoto para bombardear a cidade de Marea, no noroeste do país, controlado por rebeldes.

De acordo com o The Guardian, o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros britânico, James Cleverly, já lamentou o que considera ser um ato "completamente inaceitável" e "hediondo".

Também na Síria, o sismo permitiu a fuga de vários jihadistas de uma prisão, perto da fronteira com a Turquia. As instalações prisionais sofreram danos com o abalo e pelo menos 20 homens aproveitaram os estragos nas portas e paredes para escaparem.

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