Emissão Renascença | Ouvir Online
A+ / A-

Morreu Isabel II, a Rainha da força tranquila que marcou uma era

08 set, 2022 - 18:46 • Filipe d'Avillez , Sofia Freitas Moreira (vídeo)

Com a morte de Isabel II, aos 96 anos, os seus súbditos em 15 Estados diferentes perdem mais que um chefe de Estado, perdem uma referência moral e uma ligação a outra era.

A+ / A-
Morreu a mãe e Rainha de quase 150 milhões de pessoas
Morreu a mãe e Rainha de quase 150 milhões de pessoas

Veja também:


Quando Elizabeth Alexandra Mary nasceu, em 1926, dir-se-ia que estava destinada a ser uma figura secundária na vida social do Reino Unido, sobrinha do Rei Eduardo VIII, alvo de uma curiosidade popular que diminuiria na medida em que ela se tornava mais velha e a família nuclear do tio, a verdadeira Família Real, crescia.

Mas o destino não estava a contar com a influência da americana Wallis Simpson, que tomou de assalto o coração de Eduardo VIII, ao ponto de ele preferir abdicar do trono a ter de a abandonar. Uma crise institucional mais tarde o seu pai era o Rei Jorge VI e Isabel era a herdeira de um império de centenas de milhões de pessoas, onde o sol nunca se punha.

Tinha 25 anos apenas, uma jovem esposa e mãe, quando o seu pai morreu. O facto obrigou-a a interromper mais cedo uma viagem ao Quénia. Foi em solo queniano, na altura uma colónia britânica, que escolheu o nome pelo qual seria conhecida enquanto Rainha. Ao contrário do que tinha feito o seu pai, optou por manter o seu nome de batismo. Seria Isabel II.

Foi coroada, com toda a pompa e circunstância, no dia 2 de junho de 1953. Ao seu lado estava o seu jovem marido, com quem casou por amor e por sua livre vontade, e com o qual veio a ter quatro filhos no total. Filipe foi seu fiel e bem-humorado companheiro – mais bem-humorado que fiel, ao que consta – durante quase 75 anos, até ao dia da sua morte, em junho de 2021.

Isabel II foi Rainha de 32 estados independentes no total, durante o seu longuíssimo reinado, embora não tenha sido de todos em simultâneo. Houve até um país, a então Rodésia, que reconhecia Isabel como chefe de Estado, mas que ela própria nunca reconheceu, uma vez que o Reino Unido discordava da política de governação exclusiva por parte da minoria branca naquele país.

Com o passar das décadas cerca de metade destes países tornaram-se repúblicas, na maioria sem consultas populares, sendo que a mais recente foi os Barbados, em novembro de 2021. Curiosamente, na maioria dos casos em que os povos foram chamados a pronunciar-se sobre o regime a República foi chumbada por maiorias assinaláveis.

No dia da sua morte perderam o chefe de Estado, para além do Reino Unido, a Antígua e Barbuda, a Austrália, as Bahamas, o Belize, o Canadá, Granada, a Jamaica, a Nova Zelândia, a Papua Nova Guiné, São Kitts e Nevis, Santa Lúcia, São Vicente e as Granadinas, as Ilhas Salomão e o Tuvalu, que no seu conjunto representam perto de 150 milhões de pessoas. Muitas mais, em todo o mundo, choram agora a morte de uma mulher que se tornou um símbolo de continuidade histórica, de dignidade e de serviço público.

70 anos, 170 primeiros-ministros

Um inquebrantável sentido de dever será talvez o que marcou mais o reinado de Isabel II. Durante 70 anos nunca fugiu às suas obrigações, nunca pôs um pé fora do risco e enfrentou até as maiores dificuldades e crises com estoicismo.

Desde o trabalho como mecânica de automóveis durante a II Guerra Mundial até anfitriã dos Jogos Olímpicos de 2012, em Londres, quando contracenou com Daniel Craig no vídeo de apresentação para a cerimónia inaugural, teve sempre os interesses da Coroa e da nação em primeiro lugar. Se há crítica que se lhe pode fazer é o de ter deixado a família para segundo plano. Apenas se pode especular se a sua forma de ser mãe teve influência na desastrosa vida pessoal dos seus quatro filhos que culminou no famoso “annus horibilis” de 1992, quando três dos casamentos destes terminaram em divórcio.

De todas as novelas reais, a que mais cativava era a de Carlos e Diana, que passaria por vários capítulos dolorosos antes de terminar em tragédia num túnel em Paris. A crise que se seguiu à morte de Diana foi talvez a maior ameaça ao reinado de Isabel II e à própria instituição real, não obstante a “Princesa do Povo” nunca ter defendido o republicanismo.

A Monarquia britânica saiu das chamas intacta, mas diferente. A Rainha também, embora a diferença seja mais notória no seu neto Guilherme, na linha de sucessão ao trono depois do seu pai, e que tem apresentado, na sua vida profissional e pessoal – se é que na realeza essa distinção existe – um bom equilíbrio entre a lealdade e sentido de dever dos Windsor e a espontaneidade e charme da sua mãe, Diana Spencer.

Ao longo destas sete décadas o Reino Unido esteve envolvido em várias guerras, entrou e saiu da União Europeia, viu o seu império diminuir drasticamente e a dar lugar a uma das maiores organizações internacionais do mundo, o Commonwealth. A Irlanda do Norte ardeu e renasceu das cinzas para uma nova era de paz.

Desde Dudley Senanayake no Ceilão, em 1952, até à tomada de posse de Liz Truss –escolhida pelo Partido Conservador para substituir Boris Johnson -, na última terça-feira, dia 6, serviram-lhe em toda a Commonwealth mais de 170 primeiros-ministros. Liz Truss é a 15ª chefe de governo em Londres nos 70 anos de reinado de Isabel II. Os líderes de executivos britânicos, em particular, com quem teve sempre um contacto mais próximo, são unânimes em elogiar o seu sentido de Estado e a sabedoria que demonstrava durante as suas reuniões semanais.

Isabel II morreu aos 96 anos. Choram-na quatro filhos, oito netos, 12 bisnetos e quase 150 milhões de súbditos, das montanhas da Papua Nova Guiné às praias da Terra Nova.

Saiba Mais
Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

Destaques V+