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Uma outra guerra europeia, entre a coragem e a energia

01 abr, 2022 - 21:43 • José Pedro Frazão

Paulo Rangel e Jorge Vasconcelos analisam as opções da Europa no plano energético e das relações com a China, no contexto da guerra na Ucrânia.

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A viagem da presidente do Parlamento Europeu à Ucrânia responde directamente ao apelo dos cidadãos europeus a uma solidariedade sem quebras da sociedade europeia ao povo ucraniano. É desta forma que o eurodeputado do PSD Paulo Rangel analisa a notícia da deslocação de Roberta Metsola a Kiev, divulgada esta sexta-feira.

No Partido Popular Europeu, Metsola é vista como uma dirigente política corajosa, assinala Rangel, que subscreve a tese de uma acção europeia desencadeada por pressão decisiva das sociedades civis.“Uma das características desta crise e que alterou muito os equilíbrios europeus foi a liderança do processo pelos cidadãos e pelas opiniões publicas.

Os dirigentes europeus só tomaram as decisões porque se sentiram respaldados, até “empurrados” pelos cidadãos. Sendo o Parlamento Europeu o órgão representante dos cidadãos, a Presidente Metsola quis mostrar que os cidadãos europeus, com a sua dirigente máxima, estão ao lados dos ucranianos. É um sinal de coragem, de que não deve haver medo. É um sinal politico fortíssimo”, analisa Rangel na Renascença.

A questão chinesa

Em dia de Cimeira União Europeia / China, sobressaem os finos equilíbrios entre Moscovo , Pequim e as chancelarias europeias.

Em muitas capitais europeias, o desejo de uma intervenção firme da China que trave a guerra é encarado com algum realismo face aos cálculos que Pequim tem que fazer no plano económico e político .

Paulo Rangel admite que a China tem prestado “algum apoio logístico” à Rússia mas não militar.

“A China tem interesse em que a duração do conflito seja curta. Mas não quer que Putin seja humilhado. Isto coloca a China numa posição de grande ambiguidade. Não tem interesse no prolongamento da guerra. Pode afetar a taxa de crescimento económico e desencadear grandes efeitos internos nalguns domínios sociais, incluindo instabilidade social que tenha impacto político”, admite o eurodeputado do PPE, que admite ainda que a China e a Índia podem ter intervindo de forma massiva nos mercados para travar a queda do rublo, agora mais atenuada.

Dar gás às sanções

O quadro de sanções dirigidas ao regime de Putin situa-se a par de uma estratégia de rutura com a dependência energética da Europa face à Rússia, especialmente notada no centro e leste do continente europeu.

Jorge Vasconcelos, ex-presidente da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, afirma que houve uma “falha grave” da Europa ao não dar passos decisivos para o corte na dependência de determinadas fontes energéticas.

“Embora fosse uma preocupação periódica da UE , a verdade é que foi um pouco "esquecida" durante os últimos anos. E a dependência ocorrida face a um só país ocorreu relativamente a não apenas um vetor energético, como o gás natural, mas em relação aos três vetores, incluindo também o petróleo e o carvão”, analisa este especialista em energia.

Para Paulo Rangel, a “torneira russa” pode ser cortada no petróleo e “seguramente já” no carvão. No gás, ressalva o eurodeputado, “essa decisão implicaria alguns sacrifícios que não sei se as economias europeias estão dispostos a fazer. Mas pode pelo menos diminuir-se substancialmente a dependência dos gás russo num prazo aceitável”.

Os trabalhos de casa

Jorge Vasconcelos espera que exista em breve uma maior harmonização europeia das varias dimensões da política energética. “Falta a articulação com a dimensão ambiental e redução de emissões de gases com efeito de estufa”, alerta o ex-presidente da ERSE.

Este especialista em energia pede a reforma urgente dos mercados elétricos europeus e sugere que uma abordagem liberal não favoreceu a Alemanha do ponto de vista das fontes energéticas.

“A Alemanha empreendeu há muitos anos uma estratégia de modernização do sector energético, onde se incluía a subsidiação das energias renováveis. Mas foi dada grande liberdade para os agentes económicos procurarem fornecedores. Isso foi uma situação muito negativa para os alemães”, explica Jorge Vasconcelos que assinala agora os esforços da Alemanha nas novas técnicas de armazenamento, a par do aumento da mobilidade elétrica e da eletrificação dos sistemas de calor.

Um dos principais gastos energéticos do centro da Europa está no aquecimento dos ambientes interiores como habitações e unidades industriais.

Mais motivos para rejeitar o Nuclear

Subsiste ainda o debate sobre o ressurgimento ou pelo menos a manutenção de um paradigma de energia nuclear na Europa , não apenas como arma climática mas também como ferramenta energética europeia.

Para além dos problemas de gestão de resíduos e dos riscos de acidente, Jorge Vasconcelos avança dois argumentos adicionais para rejeitar a opção num contexto de pressão energética.

“As centrais nucleares precisam de combustível. É o caso do urânio e a Europa não é auto-suficiente nesse material. Estaríamos a trocar uma dependência de combustíveis fósseis por outra, que é a do urânio. Recordamos episódios recentes pouco edificantes de fornecimentos de urânio a França com vários escândalos”, observa um dos analistas energéticos de referência em Portugal .

Por outro lado, o argumento económico não é também favorável ao nuclear, garante Vasconcelos que fala mesmo numa opção de “desastre”.

“No Reino Unido, a construção de centrais novas nucleares vai levar a custos para os britânicos acima dos 100 euros por megawatt /hora a pagar por cerca de 30 anos. Nós em Portugal temos custos de energia fotovoltaica abaixo de 20 euros por megawatt/hora”, exemplifica Jorge Vasconcelos.

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