Emissão Renascença | Ouvir Online
A+ / A-

General Campos Gil

Guerra na Ucrânia. "Isto é tudo uma hipocrisia da política ocidental, qual dissuasão?"

25 fev, 2022 - 20:33 • Liliana Monteiro com redação

Ex-Vice-Chefe de Estado Maior do Exército critíca desinvestimento na área da Defesa da Europa.

A+ / A-

O general Campos Gil, ex-vice-chefe de Estado Maior do Exército, critica o comportamento do Ocidente em relação ao sistema de defesa e refere que o desinvestimento no setor como um facto pelo qual os europeus agora estão a pagar.

“Isto é tudo uma hipocrisia da política ocidental, qual dissuasão? Vamos lá meter estes soldados e isto é para inglês ver a nível político. Não tenho dúvida que o general que for à frente comandar esta gente, o capitão de fragata que vai com a fragata e o tenente-coronel que vai com a esquadra aérea, esses homens vão cumprir o melhor que podem e sabem e com alma de combatentes”, conclui.

Numa altura em que Portugal se prepara para enviar forças no âmbito da NATO para a missão de dissuasão junto dos países aliados, a Renascença procurou saber que estratégia é esta e qual a preparação para enfrentar a potência militar russa.

O General Campos Gil afirma que “uma coisa é uma força coesa treinada com noção clara do que faz e oleada”, e outra “é uma força reunida em sete dias que chega ao terreno e lhe falta o treino conjunto e combinado”.

Para este militar a organização e o esquema oleado das tropas russas salta à vista. “Putin quando manda fazer a invasão o que fez previamente? Concentrou forças na fronteira. E o que fez durante um mês? Exercícios para olear as forças, a capacidade de treino junto à fronteira, para depois as poder usar”.

Com a memória vivida de outros conflitos recorda que “no tempo da Guerra Fria tínhamos tempo para treinar, fazíamos exercícios internacionais onde estes procedimentos eram treinados, agora temos cada vez menos. Os países querem lá saber!”, critica.

Os governos europeus e democratas, segundo este general, desmobilizaram o exército e as forças armadas “e a sua capacidade e vontade de se defenderem”.

“Já não falo no sentido de ter desinvestido na defesa, desmobilizou o que é diferente. A desmobilização afetou a disponibilidade moral das Forças Armadas e não é só as portuguesas, mas da Europa”, remata.

O que é uma missão de dissuasão?

A NATO pretende dissuadir a Rússia de “eventuais intenções de agressão, uma intervenção militar alargada ou pontual em território dos países membros da NATO, como seja a Polónia, Eslováquia e a Roménia, que são os países fronteiriços que estão numa zona que pode ser mais ameaçada”, explica-nos.

O general Campos Gil, ex-vice Chefe de Estado Maior do Exército, recorda que “no tempo da Guerra Fria os planos defensivos da NATO eram claros. Havia forças sempre colocadas na fronteira, na linha de separação da Alemanha Leste e Oriental e do resto da fronteira com o Pacto de Varsóvia. Havia forças permanentemente estacionadas com postos de observação. Neste momento não deverá haver posicionamento permanente de forças na fronteira com a Rússia e Bielorrúsia”.

Explica que haverá movimentação de forças colocadas em bases para que depois possam vir a ocupar posições na fronteira assim que o conflito o exija. “Não haverá posicionamento imediato ao longo da fronteira”, refere.

Portugal disponibiliza forças do Exército, Marinha e Força Aérea. Esta disponibilização está prevista no planeamento da NATO que é revisto a cada dois anos.

“Se há hoje uma maior flexibilidade das forças, há também maior vulnerabilidade porque existe menor tempo das forças se familiarizarem com o terreno, menor prontidão e preparação”, alerta.

Há três fases de intervenção previstas e possíveis. Nesta primeira fase de reacção imediata no terreno (para mostrar determinação) estarão cerca de 10 mil homens (entre eles os pouco mais de mil militares portugueses). A fase seguinte conhecida por forças de “follow on forces” entram em campo 20 a 30 mil militares e, por fim, a última fase de ação, quando e se existir materialização concreta da ameaça, ou seja, a guerra generalizada, contará com o triplo dos homens no terreno.

Os sinais russos e capacidade bélica

A colocação de hospitais de campanha junto das forças russas que estão na fronteira da Ucrânia é um sinal claro da investidura. “Essa estrutura necessita de cerca de 500 efectivos num verdadeiro hospital de campanha, significa levar farmácias, reservas de sangue, que garanta pelo menos a capacidade em simultâneo (no mínimo) de duas salas cirúrgicas de trauma para apoiar uma brigada.”

“A minha experiência diz-me que tem capacidade para guerra longa. O problema é que nos tempos do século XXI não podemos olhar para o campo de batalha exclusivamente do ponto de vista militar, mas olhar para a questão política. Caso o conflito se prolongasse por muito tempo, mais dia menos dia haveria uma movimentação russa que iria sair para as ruas e tornar difícil para Putin garantir o prolongado na guerra, isso aconteceria quando aparecessem as baixas e o território Russo fosse bombardeado”, conclui.

A guerra faz-se em três frentes: no terreno com os militares, na política, com as negociações, e com as sanções que pretendem criar dificuldades de acesso ao financiamento e aos mercados.

“As sanções levam a economia russa a não ter capacidade logística de suportar um conflito mais prolongado no tempo e levam ao colapso económico e financeiro. E este é um ponto fulcral. Manter um conflito prolongado exige um esforço financeiro tremendo”, afirma o general Campos Gil.

“A NATO nunca vai entrar na Ucrânia”

Uma intervenção da NATO na Ucrânia não vai acontecer, seguramente, crê este general, “estaríamos na III Guerra Mundial, seria catastrófico e desastroso, seria uma ruína completa e era dar espaço aos russos para começarem um avanço pelo domínio da Nato e seria a guerra generalizada”, admite.

Mas, de uma coisa não tem dúvida, “o regime russo é um regime que quer repor a grandeza estratégia e geopolítica da federação russa, o grande império russo e nesse sentido a Ucrânia não fica por aqui e será um passo apenas”.

Para Campos Gil, a preocupação dos países Bálticos, mas também da Polónia, Eslováquia, Roménia e Hungria que fazem fronteira com a Rússia, faz todo o sentido.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

  • Jorge Graça
    26 fev, 2022 Leiria 01:27
    Na verdade, o Ocidente é um conjunto de hipócritas, cheios de conversa, de pura e inútil retórica. Vergonha! Ninguém assiste à morte de um amigo sem o ajudar e livrar do agressor e fazer frente a tal agressor. Aqui até são despudorados ao ponto de dizer logo que nunca irão entrar na Ucrânia para os ajudar contra o abjecto putin!
  • Calças abaixo
    25 fev, 2022 Derrotados FC 22:34
    Se baseiam os cálculos da Defesa no cagaço de uma guerra nuclear, apesar de terem tantas armas nucleares como eles, então mais vale baixarem já as calças e deixarem os Russos entrar.

Destaques V+