17 mar, 2020 - 10:27 • Marta Grosso , com BBC
Cansaço, febre e tosse seca são os principais sintomas da Covid-19. Mas o que faz o vírus quando entra no nosso organismo? William Schaffner, professor de medicina preventiva e doenças infecciosas no Centro Médico da Universidade Vanderbilt, nos EUA, explica.
As portas de entrada são os olhos, o nariz e a boca. Uma vez dentro, começa por se ligar “às células da mucosa do fundo do nariz e da garganta" e depois, para se multiplicar, vai sequestrar células.
De acordo com a notícia da BBC, é através das proteínas em forma de lança que se projetam da sua superfície que o coronavírus consegue penetrar na membrana dessas células.
"E uma vez dentro da célula, como os outros vírus, começa a dar ordem para produzir mais vírus", diz o professor norte-americano.
William Schaffner explica que o vírus é um agente infeccioso microscópico acelular, pelo que só se consegue multiplicar dentro das células de outros organismos.
Uma vez que outros vírus estão produzidos, deixam a célula de origem, destroem-na e começam a infectar outras células. Segundo o especialista, cada vírus pode criar entre 10 mil e 100 mil cópias de si.
É nessa altura que o corpo “percebe que o vírus lá está e começa a produzir uma resposta inflamatória para o combater". Sinais dessa reação são “um pouco de dor de garganta e nariz entupido".
A partir daqui, o vírus dirige-se aos “tubos brônquios [as vias aéreas que vão para os pulmões] e produz inflamação nessas mucosas", o que causa “irritação e, portanto, tosse" , continua Schaffner.
Nessa altura, "a resposta inflamatória do corpo aumenta e a febre aparece". Começamos a sentir-nos mal e o apetite começa a diminuir.
A maior parte dos casos não passa daqui, mas pode acontecer o vírus "sair do canal brônquio e atingir os pulmões”, provocando pneumonia. É aqui que a situação se agrava.
"Se uma porção suficiente de tecido pulmonar for afetada, será mais difícil para o paciente respirar”. Nesta altura, o doente paciente deve ser hospitalizado e pode ter de ser ligado ligado a respirador.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a maioria dos doentes com o novo coronavírus desenvolve sintomas leves da doença (febre e tosse), cerca de 14% revelam sintomas severos (com dificuldade em respirar e falta de ar) e 6% avançam para doença grave (insuficiência pulmonar, choque séptico, falência de órgãos e risco de morte).
O maior problema da Covid-19 é, além da infecção, a maneira como nosso corpo responde – avança, por seu lado, explica Kalpana Sabapathy, médico clínico e epidemiologista na Escola de Higiene e Medicina Tropical em Londres, à BBC News Mundo.
"Para evitar que a infecção sequestre nossas células, nosso corpo produz substâncias químicas bastante agressivas", refere. E, em caso de pneumonia, o vírus “cria congestão nos pequenos sacos de ar na base dos nossos pulmões” – os alvéolos, pequenas estruturas que normalmente se enchem de ar e onde ocorre a troca responsável pela distribuição do oxigénio ao resto do corpo.
"Mas se essas bolsas estão cheias de infecção, combinadas com a resposta do nosso corpo a essa infecção, elas têm menos capacidade de ar", diz Sabapathy. "E se o corpo não recebe oxigénio suficiente, fica em insuficiência respiratória e o coração, sem oxigénio suficiente pela corrente sanguínea, não pode funcionar".
Schaffner compara a resposta inflamatória com uma guerra: “existem dois exércitos que lutam entre si, mas às vezes as bombas atingem civis”. Ou seja, a resposta pode ser tão poderosa, que acaba por danificar o tecido onde o vírus é encontrado.
Assim, a infecção não precisa de passar para outra parte do corpo para que uma pessoa infectada fique em estágio crítico.
Um estudo (inconclusivo) publicado em março na prestigiada revista científica “The Lancet” sugere que a Covid-19 "pode causar danos a outros órgãos, como coração, fígado e rins, assim como em sistemas corporais como o sangue ou o sistema imunológico".
William Schaffner, o professor norte-americano de infecciologia, também considera que, com base em estudos realizados sobre a SARS (síndrome respiratória aguda grave), a Covid-19 “pode ir para outras partes do corpo”.
Isso pode explicar em parte que alguns pacientes infectados sofram de diarreia e dor abdominal, problemas não associados a uma infecção respiratória.
Mas, para se chegar à conclusão de que outros órgãos podem ser afetados, será preciso "conhecer os resultados das autópsias e essas informações ainda estão só a começar a ser reveladas", diz Schaffner.
Quanto a efeitos de longo prazo no organismo, o professor no Centro Médico da Universidade Vanderbilt (EUA) diz que a grande maioria dos pacientes tem uma recuperação completa.
Ainda assim, há "alguns relatos de pacientes que, como consequência da inflamação, poderão ter algumas cicatrizes nos pulmões e uma função pulmonar reduzida".
Para já, é cedo para falarmos de consequências. "Levará tempo para determinar os efeitos com mais precisão".
"Ainda não tivemos tempo para pensar no longo prazo", conclui.
Na China, onde o surto começou, registam-se os núm(...)