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​Kasparov critica passividade do Ocidente. “Putin nunca teria ido tão longe com Churchill”

13 nov, 2017 - 18:35 • Sandra Afonso

De passagem pela Web Summit, o activista russo e antigo campeão mundial de xadrez também falou da ascensão das máquinas.

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Vive em Nova Yorque, mas de olhos postos na mãe Rússia, sobre a qual fala e escreve com apego e sem filtros. Durante 20 anos lutou nos tabuleiros de xadrez pelo título mundial, ficaram para a história meia dúzia de partidas, incluindo a primeira derrota de um campeão para um computador, o Deep Blue, da IBM.

Agora, Garry Kasparov vira a página e volta a fazer história, é um dos rostos da oposição ao regime russo de Vladimir Putin, que já chamou de ditadura, comparou à máfia e à série “Guerra dos Tronos”. Quando faltam meses para as eleições presidenciais, garante que não passam de uma farsa.

Kasparov esteve por estes dias em Lisboa, na Web Summit, como embaixador da Avast, multinacional que desenvolve software antivírus. Mas falou sobretudo de xadrez, política e robôs, não necessariamente por esta ordem.

O xadrezista aponta inglês Winston Churchill como um dos homens que mais admira, “esteve sempre à frente do seu tempo”, e acredita que tudo seria diferente se hoje tivéssemos mais políticos como ele. “Vladimir Putin nunca teria ido tão longe, teria sido travado mais cedo. Pessoas como Churchil lembram-se das lições do bolchevismo, nazismo, da oposição ao comunismo e de defender o mundo livre.”

Conclui que, hoje, os ditadores têm o poder reforçado, porque “não temos políticos no mundo livre que possam dar uma ferroada depois de terminado o mandato, o que os torna vulneráveis aos ditadores, porque eles são grandes estrategas, podem decidir rapidamente, não querem saber da imprensa, da oposição ou da opinião pública. Por isso, quem compete com eles a curto prazo perde sempre”.

Em “O Inimigo que vem do Frio”, lançado em Portugal no final 2016, Garry Kasparov alerta para a passividade dos líderes do Ocidente quando lidam com o regime russo. Escreve que Boris Iéltsin ainda tentou instalar um regime democrático na Rússia, mas falhou. Putin desfez com êxito todo o trabalho do antecessor. “A corrupção dos oligarcas mudou-se para o interior do Kremlin, onde cresceu para níveis estarrecedores", acusa. O ex-Presidente norte-americano Ronald Reagen foi o único que identificou o problema, os restantes líderes ocidentais são acusados de passividade por Kasparov.

Putin ainda não se apresentou como candidato às eleições, mas todos esperam que o faça. Em caso de vitória, o líder russo permanecerá no poder até 2024, quando terá 72 anos. O seu principal rival, o líder opositor Alexei Navalny, tem sido impedido de apresentar a candidatura, mas está a fazer campanha.

As máquinas ainda não sabem fazer perguntas

Foi o primeiro campeão mundial a ser derrotado por um computador. Hoje admite que muitos empregos se vão perder com a evolução tecnológica, é inevitável, “tudo o que é quantificável as máquinas vão fazer melhor”.

Errar é humano, o homem contra a máquina não é uma partida justa nos dias que correm. “Enquanto num jogo entre dois humanos podemos esperar que o favoritismo tenha retorno, contra máquinas cometemos um erro e estamos fora de jogo.”

Kasparov acaba por admitir que estava no lugar certo, na altura certa. “Não sei se foi a minha maldição ou bênção, quando me tornei campeão mundial, em 1985, as máquinas eram fracas. Quando abandonei o xadrez profissional, 20 anos depois, em 2005, as máquinas eram imbatíveis”, recorda.

Acabou por fazer e assistir à história a ser escrita, por isso diz: “provavelmente foi a minha bênção, porque pude assistir a esta transição histórica e este é o padrão ou narrativa que funciona em qualquer situação, para qualquer tipo de actividade humana. Primeiro, é impossível fazê-lo com máquinas, depois as máquinas são muito fracas e não há oposição séria, de seguida e por um curto período há uma janela de oportunidade para competir, então é inevitável a superioridade das máquinas, para sempre.”

Mas as máquinas ainda não fazem tudo. “Não sabem fazer perguntas e identificar os problemas relevantes”, sublinha Garry Kasparov.

O dia do ano em que não deve desafiar Kasparov
O antigo campeão do mundo protagonizou uma minimaratona de xadrez na Web Summit. Bem-humorado, trocou piadas com os adversários, jogadores amadores, e foi esticando as partidas com trocas de peças. Só no fim partilhou com a Renascença uma dica para quem aspira derrotá-lo no tabuleiro: evitar o dia 9 de Novembro.
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  • Antonio
    13 nov, 2017 Mirandela 19:36
    Vai agir mesmo ou vai viver da saudade ?????

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