Tempo
|
A+ / A-

Europeias 2019

Se as europeias fossem decididas nas redes sociais, ganhava o PAN

23 mai, 2019 - 18:43 • Daniela Espírito Santo

Partido das Pessoas Animais e Natureza lidera no Facebook e no Instagram. Marisa Matias, Paulo de Morais e Rui Tavares surpreendem a solo.

A+ / A-

Se as eleições se decidissem nas redes sociais, o Partido das Pessoas, Animais e Natureza (PAN) tinha séria probabilidade de liderar a votação.

Olhando para o ranking de partidos no Facebook, esta é a força política com mais seguidores: soma mais de 154 mil. Seguem-se o Partido Social Democrata (PSD), com mais de 148 mil, o Partido Socialista (PS) e o Bloco de Esquerda, com 76 e 75 mil respetivamente.

Na "campanha" das redes sociais, há espaço para surpresas com alguns partidos: o Nós, Cidadãos tem cerca de 60 mil fãs no Facebook e a Iniciativa Liberal soma 42 mil.

O cenário repete-se no Instagram, mas a diferença aqui é menor: o PAN tem 12,9 mil fãs nesta rede social, sendo seguido de perto pelo PSD, com 12,4 mil. Números pouco expressivos mas que parecem ser regra para todos os partidos com presença no Instagram e que parecem denotar que, para os políticos portugueses, esta rede ainda é uma relativa novidade.

O PAN só não se destaca no Twitter, onde as forças ditas "tradicionais" lideram isoladas: o PSD tem 33,5 mil seguidores, o PS 30,5 mil, o Bloco de Esquerda 21,2 mil e o CDS 14,7 mil. O Livre de Rui Tavares soma 10,1 mil seguidores, tornando-se na quinta força política mais seguida no serviço de microblogging.


Total de seguidores, crescimento e percentagem de crescimento no Twitter, na semana de 13 a 23 de maio. Fonte: CrowdTangle



O que explica o sucesso do PAN?

Sergio Denicoli, especialista em análise de social media em campanhas políticas, explica à Renascença que "a política, nas redes sociais e na Internet, acaba por privilegiar grupos que tenham uma ideia mais definida".

Nesse sentido, adianta, "o PAN acaba por sobressair pois traz uma bandeira ideológica com que as pessoas acabam por se identificar", quando "os partidos mais centrais não têm essa bandeira tão definida".

Com essa estratégia, o PAN "consegue aglutinar pessoas que tenham um pensamento ideológico semelhante e acaba por se revelar uma surpresa das eleições em Portugal" -- com apenas um deputado eleito à Assembleia da República, as sondagens antecipam cerca de 3% dos votos nas europeias, o que poderá traduzir-se na eleição de um eurodeputado PAN pela primeira vez.

Perante tal cenário, o PAN acaba por ser "a grande surpresa de mobilização na Internet", apesar do "desinteresse das pessoas nas eleições europeias".

Marisa Matias, Paulo de Morais e Rui Tavares, os candidatos preferidos

No "campeonato" dos candidatos, o cenário modifica-se e Marisa Matias surge destacada. No Facebook, tem mais de 97 mil fãs. Paulo de Morais ocupa o segundo lugar com 90 mil seguidores. Bem distanciados estão Paulo Rangel e Nuno Melo, que conseguem angariar, nas suas páginas pessoais, 28 e 20 mil seguidores respetivamente. Este valor é particularmente interessante para Nuno Melo, tendo em conta que a página do CDS só soma mais 13 mil fãs que o candidato sozinho.

Já no Twitter, Rui Tavares é figura de destaque, com 54,7 mil seguidores. Marisa Matias volta a ter um bom resultado, com 42,8 mil e ambos surgem bem distantes dos restantes: o terceiro lugar do ranking pertence a Paulo Rangel (PSD), com mais de 3 mil seguidores, e Nuno Melo (CDS), com pouco mais de 2 mil.

Outro dado curioso que pode escapar num primeiro olhar: André Ventura pode não ter página própria de campanha no Facebook, mas canaliza mais de 31 mil seguidores no seu perfil de amigos, onde é dada a opção aos utilizadores de seguirem o candidato da coligação Basta.

Instagram ausente de muitas campanhas

No Instagram, a candidata do Bloco de Esquerda volta a surgir bem destacada dos demais: tem 15,8 mil seguidores, enquanto Nuno Melo aparece em segundo "lugar", com mais de 2.500, seguido de Rui Tavares com mais de 2.300. Paulo Rangel e Pedro Marques completam o "top 5" nesta rede social, com cerca de dois mil seguidores cada.

Já a maioria dos restantes candidatos não tem presença individual no Instagram, deixando a campanha em imagens para as contas oficiais dos partidos (quando as há).

PNR à frente do CDS-PP... no Facebook

O PNR reúne a preferência de mais de 40 mil pessoas na rede de Mark Zuckerberg, mais 7 mil que o CDS-PP, que tem, na sua página oficial, mais de 33 mil seguidores.

No PURP só há grupos

Curiosidade interessante: o Partido Unido dos Reformados e Pensionistas (PURP) optou pela estratégia de criar e alimentar grupos no Facebook em vez de criar uma página de fãs como é habitual. A estratégia valeu-lhe um universo de mais de 8 mil pessoas no grupo mais ativo do partido, com publicações constantes dos intervenientes.

O Nós, Cidadãos também decidiu criar um grupo associado à sua página, que reúne cerca de 26 mil membros e que não aceita "pedidos de adesão com nomes estrangeiros, de quem seja membro de 0 grupos ou esteja no Facebook há menos de seis meses".

Os campeões da interação

Nem só de seguidores vive esta campanha. Há quem tenha os números, mas não interaja com quem os segue e quem se esforce em todas as frentes para agradar aos eleitores. No Twitter, por exemplo, Rui Tavares até pode ter mais seguidores, mas Marisa Matias publicou muito mais (80 twits versus 29) desde 13 de maio, data em que arrancou oficialmente a campanha eleitoral. O trabalho reflete-se na interação que geraram esses twits (3500 interações versus 2400), segundo dados recolhidos pela Renascença na plataforma Crowdtangle.


Total de interações, média de interações por semana e percentagem de interações por semana no Twitter, na semana de 13 a 23 de maio. Fonte: CrowdTangle



Igual cenário pode ser encontrado nas páginas individuais dos candidatos no Facebook: Marisa Matias volta a ser quem mais publica (64 posts desde 13 de maio), "contra" os 32 'posts' de Paulo Rangel, o segundo mais "interativo". O volume de publicações da candidata do Bloco de Esquerda acabou por valer a pena: conseguiu quase 20 mil interações no que publicou, enquanto Nuno Melo apenas conseguiu quase cinco mil interações, entre "gostos", comentários e partilhas.

No Instagram, a bloquista também consegue fazer mais posts que os restantes candidatos (28) e recolhe os "frutos" deste esforço: as suas publicações feitas durante o período de campanha reuniram quase dez mil "likes" e 133 comentários.

Total de interações, média de interações por semana e percentagem de interações por semana no Instagram, na semana de 13 a 23 de maio. Fonte: CrowdTangle



Extrema-direita sai derrotada da campanha nas redes

Numas europeias enquadradas pelo crescimento da extrema-direita, o que se espera em Portugal? Para o especialista de comunicação digital da Universidade do Minho, Sergio Denicoli, Portugal está a passar relativamente incólume ao fenómeno da extrema-direita, que vai dominando estas eleições numa espécie de "paradoxo".

"Estamos a falar de eleições europeias e os grupos que se estão a movimentar para representar os países no Parlamento Europeu são grupos extremamente nacionalistas", relembra o especialista em comunicação digital. Tal fenómeno, no entanto, não se está "a concretizar" no nosso país porque, entende, essas forças não conseguiram centralizar esforços num só candidato.

"As redes da extrema-direita estão presentes e falam de eleições, mas não canalizaram a força que criaram nas redes sociais para um candidato específico. É uma questão curiosa: nenhum candidato conseguiu realmente fazer uma aglutinação dessas forças em torno do nome dele", salienta Denicoli, falando especificamente de André Ventura, candidato da coligação Basta.

"Pode ser que tenhamos alguma diferença nos resultados [das sondagens] mas, pelo que tenho visto nas redes, ele não conseguiu canalizar todo esse movimento da extrema-direita que acontece diariamente nas redes sociais. Não acredito que ele saia das eleições como uma grande força aglutinadora das ideias mais conservadoras."

O "amadorismo" que nos protege das "fake news"

A "culpa" é, também, do relativo amadorismo das campanhas eleitorais portuguesas, refletido num dos casos destas eleições, e que envolveu um consultor do PSD. "Ainda é tudo muito amador. O foco não está muito nos partidos, está mais nos próprios candidatos, nas lideranças desses partidos, e não há uma unificação da comunicação", aponta o analista.

"Cada um tenta fazer de uma forma que acha mais apta e não temos ainda as ideologias partidárias nos partidos mais tradicionais, porque estes se perderam muito em relação a essas ideologias para tentar abarcar o maior número de eleitores possível. Como não têm uma 'cara' definida, têm mais dificuldade em navegar nesse universo onde as pessoas procuram uma identificação por ideologia, mas a tendência é que isso se altere", acredita Denicoli.

Em última instância, isso acaba por ser positivo. "Talvez a falta de profissionalização desses sistemas políticos nas redes sociais tenha até colaborado para que o público decida de uma forma mais isenta."

O que também ajuda, defende o especialista, é o facto de as pessoas começarem agora a "ter um filtro maior em relação às fake news".

"As pessoas estão mais atentas do que estavam em relação a produção de notícias falsas", o que também está a levar a uma mudança de estratégia entre quem pretende "disseminar desinformação".

Agora, indica o especialista à Renascença, esses agentes "começam a tentar desconstruir as narrativas dos jornais, a tentar impor uma narrativa. Continuam a usar fake news, mas tentam impor-se muito mais pela desconstrução de narrativas do que pela imposição de mentiras".

Apesar disso, a tendência de nichos deverá ter os dias contados na internet, conlui Denicoli. "Temos algumas forças que se organizaram nas redes e saíram à frente das outras, mas as demais forças começam a entender melhor como é que as redes sociais operam. A ascensão da extrema-direita, de ideias mais radicais, é um fenómeno que vai ter um prazo de validade nos próximos anos."

[Actualizada às 22h18 com o segundo perfil do candidato Paulo Morais]

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

Destaques V+