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Tradição e inovação: dilema ou paradoxo

08 mai, 2023 - 06:00 • Liliana Dinis

Ao tirar partido das suas tradições e património desta forma, as empresas familiares podem criar uma vantagem competitiva única que as distingue da concorrência.

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Um dilema tal como um paradoxo, envolve elementos que aparentam ser conflituosos ou contraditórios. No entanto, um dilema não é a mesma coisa que um paradoxo na medida em que um dilema implica a necessidade de fazer uma escolha, que pode ser difícil, entre as opções disponíveis. Qualquer que seja a escolha acarreta consequências e terá certamente vantagens e desvantagens. Já um paradoxo é composto por dois lados que parecem opostos, mas que, na realidade, se apoiam mutuamente e se complementam.

Os paradoxos são frequentemente utilizados para desafiar as nossas suposições e preconceitos sobre o mundo. Por exemplo, os gestores de uma empresa podem desejar reter capital tanto quanto possível para reinvestir no negócio, enquanto os acionistas esperam pelo retorno do seu investimento. Esta necessidade de equilíbrio entre os interesses dos acionistas e dos gestores, chama-se de paradoxo do crescimento e da liquidez.

O Paradoxo do Crescimento e da Liquidez é particularmente importante em contexto de empresas familiares, uma vez que estas enfrentam frequentemente uma série de desafios que são diferentes dos das empresas não familiares. Nomeadamente a necessidade de equilibrar a dinâmica familiar com a tomada de decisões empresariais e a possibilidade de conflitos entre os membros da família que têm prioridades ou objetivos diferentes.

De facto, as empresas familiares são conhecidas por serem mais eficientes nos seus processos de inovação. Um estudo de Nadine Kammerlander and Marc van Essen revelou que por cada dólar investido em I&D (investigação e desenvolvimento), estas empresas conseguem obter mais resultados inovadores, o que é medido através do número de patentes, novos produtos ou receitas geradas com novos produtos. Logo, o nível de inovação é assim mais alto nas empresas familiares.

Porquê? A concentração da riqueza da família no negócio leva a que se tornem mais cautelosos com os seus investimentos e como tal o desperdício é evitado a todo o custo.

Para além da necessidade de equilibrar gestão do crescimento e da liquidez, também a tradição ocupa um papel fundamental no processo de inovação de uma empresa familiar. Esta constitui frequentemente a base da identidade e dos valores da família e pode moldar a cultura e os processos de tomada de decisão da empresa. A, por vezes longa, história e um forte sentido de responsabilidade para com o legado recebido das gerações anteriores, fomentam o orgulho e o empenho entre os membros da família, condicionando a sua tomada de decisão.

Por exemplo, uma empresa familiar pode dar prioridade à manutenção de relações com clientes ou fornecedores de longa data, mesmo que isso signifique aceitar margens de lucro mais baixas ou renunciar a oportunidades de crescimento a curto prazo. Em alternativa, pode dar prioridade à manutenção da sua independência e controlo sobre a empresa, mesmo que isso signifique rejeitar ofertas de fusão ou venda da empresa.

No entanto, Alfredo De Massis, no seu estudo sobre o uso da tradição como fonte de inspiração para a inovação, diz-nos que as empresas familiares aproveitam as suas tradições e património para impulsionar a inovação e a competitividade. Segundo este autor, estas empresas têm uma vantagem única em termos de inovação, uma vez que têm frequentemente uma longa história e um conhecimento profundo dos seus mercados e clientes. Ao tirar partido deste conhecimento e experiência, estas podem desenvolver novos produtos ou serviços que se baseiam nos seus pontos fortes tradicionais e que as diferenciam da concorrência.

Como é que o podem fazer? Em primeiro lugar, devem identificar os valores e tradições fundamentais que moldaram a sua atividade ao longo do tempo (valores como a qualidade, o artesanato ou o serviço ao cliente, ou ainda técnicas específicas de produção ou de marketing que foram desenvolvidas ao longo de muitos anos).

De seguida, devem explorar novas oportunidades de inovação que se baseiem nestas tradições. Isto pode envolver a adaptação de produtos ou serviços tradicionais a novos mercados ou segmentos de clientes, ou o desenvolvimento de novos produtos que potenciem os conhecimentos e capacidades existentes na empresa.

Finalmente, devem implementar uma cultura de inovação que valorize a tentativa e erro e a aprendizagem contínua.

Ao tirar partido das suas tradições e património desta forma, as empresas familiares podem criar uma vantagem competitiva única que as distingue da concorrência. Esta abordagem à inovação pode também ajudar estas empresas a manter a sua identidade e valores ao longo do tempo, enquanto se adaptam às condições de mercado e às necessidades dos clientes em constante mudança.

A tradição e a inovação podem assim ser duas faces da mesma moeda. Para saber mais sobre este tema e as várias camadas que o compõem, venha assistir ao Family Business Day, no próximo dia 10 de Maio, às 9h00, na Católica Lisbon School of Business and Economics.


Liliana Dinis, Professora da Católica Lisbon School of Business & Economics

Este espaço de opinião é uma colaboração entre a Renascença e a Católica Lisbon School of Business and Economics

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