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Portugal e Suécia de candeias às avessas. O que se passa?

26 mar, 2021 - 08:38 • Anabela Góis

Primeiro foi a ministra das Finanças sueca que perdeu a paciência e ameaçou rasgar a convenção fiscal que tem com Portugal; agora, são os reformados suecos que cá vivem que ameaçam fazer as malas e ir embora.

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Portugal tem sido um autêntico “Eldorado” fiscal para os pensionistas suecos que escolhem vir para cá viver. Isto, porque, além do sol e boa comida, ao abrigo de um regime especial, os suecos não pagam IRS sobre as pensões que recebem nem na Suécia nem no nosso país – ou seja, beneficiam de uma dupla isenção.

Que regime é esse?

É o chamado Regime de Residentes Não Habituais (ou RNH) e foi criado pelo Governo português em 2009 para atrair estrangeiros, sejam trabalhadores qualificados ou reformados.

Este regime também pode ser usado por portugueses, desde que não tenham residido no país nos cinco anos anteriores.

Em traços gerais, é um programa que permite que as pessoas que integram uma lista de profissões consideradas de elevado valor acrescentado paguem uma taxa de IRS de 20% sobre os rendimentos do trabalho. O problema – e por isso é que Portugal tem sido alvo de críticas – é que, no caso dos reformados, as pensões não são sujeitas a IRS, desde que sejam pagas por outro país.

Estas condições são válidas por um período de 10 anos, não renovável, desde que a pessoa resida em Portugal, pelo menos, 183 dias por ano.

E a Suécia quer acabar com esse benefício e tributar as pensões?

Isso mesmo. E as negociações até correram bem. Em 2019, ainda Mário Centeno era ministro das Finanças, foi estabelecido um novo acordo tributário, segundo o qual alguns pensionistas seriam tributados na Suécia, enquanto outros pagariam impostos apenas no país de residência, neste caso Portugal.

O problema é que Portugal não chegou a ratificar este acordo. O Governo até alterou algumas regras no Orçamento do Estado de 2020 para que os reformados com pensões pagas no estrangeiro – e que aderissem a esses benefícios fiscais – pagassem uma taxa de 10% de IRS, mas a medida só se aplica aos novos aderentes.

Ou seja, quem estava isento de IRS continua a não pagar enquanto não terminarem os 10 anos do benefício estabelecido no regime. Além de que o Governo sueco considera 10% um imposto demasiado baixo e lembra mesmo que é injusto para os próprios portugueses, que ganham muito menos e pagam muito mais do que os reformados suecos, muitos deles milionários.

Então e agora? O vai fazer a Suécia?

Para já, ameaça rasgar o acordo com Portugal e já apresentou um decreto no Parlamento que vai ser discutido em abril. Se for aprovado, acaba com a convenção fiscal entre os dois países no final do ano.

Significa isto que, a partir do dia 1 de janeiro de 2022, os pensionistas suecos residentes em Portugal, abrangidos pelo RNH, passarão a pagar IRS na Suécia.

E o que querem os pensionistas suecos?

Também querem que o Governo ratifique o tal acordo, porque se a convenção fiscal – que evita a dupla tributação – for rasgada, as consequências para os suecos que residem no nosso país serão desastrosas.

Numa carta enviada esta semana ao Governo português, o representante da comunidade sueca a viver em Portugal diz que “a carga tributária sobre pensões e rendimentos de capital subiria para níveis quase impossíveis de suportar” e, por isso, o mais natural é que muitos tenham de abandonar o país.

Há muitos pensionistas suecos em Portugal?

Abrangidos por este Regime de Residentes Não Habituais são mais de três mil. É a sexta nacionalidade com mais adesões, depois de franceses, britânicos e irlandeses, brasileiros, portugueses e italianos.

O Governo português já se pronunciou?

Que se saiba não. A Renascença contactou o gabinete do ministro das Finanças, João Leão, que nos prometeu uma resposta, mas que, até agora, não chegou.

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