22 out, 2016 - 11:57
O Patriarca de Lisboa chamou a atenção este sábado para uma contradição fundamental da sociedade actual, nomeadamente o faco de, apesar da globalização, as pessoas viverem num profundo individualismo.
D. Manuel Clemente falava na abertura da Conferência Anual da Comissão Nacional Justiça e Paz, este sábado de manhã, em Lisboa.
O Cardeal lamenta que apesar de estarmos cada vez mais perto, podemos estar cada vez mais longe uns dos outros. “A grande contradição do nosso tempo está precisamente aqui. Por um lado, a globalização põe-nos cada vez mais perto uns dos outros, quantitativa e mediaticamente falando. Por outro, a individualização sociocultural pode reter, e retém, cada vez mais cada um em si mesmo, eliminando vizinhanças, desvitalizando comunidades, rarefazendo cooperações, virtualizando o mundo e abstendo-nos politicamente.”
A conferência anual deste ano é dedicada aos impostos e à justiça social. Dom Manuel Clemente defendeu que só há justiça social quando cada um contribui apenas com o que pode para as necessidades comuns. “Creio estar aqui o princípio básico da relação sistema fiscal/justiça social: Precisamente o contribuir para o bem comum, conjugando as próprias possibilidades com as necessidades alheias.”
“A justiça manda-nos dar a cada um o que lhe é devido, a caridade faz-nos tomar como próprias as necessidades dos outros. E assim mesmo alcançaremos um bem que se possa dizer verdadeiramente comum”, conclui.
Já Pedro Vaz Patto, presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz, diz que sem justiça fiscal, haverá sempre fuga aos impostos e cita o exemplo da grande multinacional americana Apple que beneficiou de um tratamento fiscal de excepção na Irlanda.
Ver que quem mais pode paga menos, enquanto quem menos lucros tem é forçado a contribuir com mais, desmobiliza as pessoas de pagar impostos, avisa: “Este e outros exemplos são reveladores das graves injustiças dos sistemas fiscais, que nos regem na era da globalização, e que só podem ser combatidos no plano transnacional”.
A justiça no sistema é essencial “para que os cidadãos se sintam motivados a cumprir os seus deveres fiscais, para que neles surja e se reforce a consciência de que esta é uma forma de contribuir para o bem comum e de exercício de solidariedade para com os mais pobres”, diz ainda o juiz, concluindo que só assim se conseguirá mudar a mentalidade que se traduz no ditado popular “morrer e pagar impostos, quanto mais tarde, melhor”.
A conferência anual da Comissão Nacional de Justiça e Paz decorre este sábado ao longo de todo o dia e conta ainda com a participação de Maria do Rosário Carneiro, de Bagão Félix e de Graça Franco, directora de informação da Renascença. A conferência termina com uma intervenção de D. Jorge Ortiga, arcebispo de Braga.