15 dez, 2015 - 20:27
José Sócrates garante que nunca interferiu no Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve (Protal) para beneficiar o empreendimento de Vale do Lobo. Na segunda-parte da entrevista à TVI, transmitida esta terça-feira, o antigo primeiro-ministro conta que foi a mãe que lhe deu dinheiro para viver em Paris, que o amigo Carlos Santos Silva também lhe fez um empréstimo e admite processar o Estado português.
Sobre a sua alegada intervenção na aprovação do Protal em Conselho de Ministros, começou por afirmar que "são acusações estratosféricas” e "abracadabrantes".
Garante que a suspeita “não tem o mínimo de fundamento”, porque o “Protal não atribui direitos a ninguém. Era impossível que alguém pudesse beneficiar do Protal”. A cláusula de excepção prevista no Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve "não se aplicou a Vale do Lobo".
"Não tenho nada a ver com o empréstimo da Caixa”
O ex-primeiro-ministro nega qualquer intervenção para que a Caixa Geral de Depósitos (CGD) desse luz verde a um empréstimo para o empreendimento de Vale do Lobo.
Armando Vara, antigo administrador da CGD, também é arguido no processo. José Sócrates diz que o antigo ministro é seu amigo e acredita na sua inocência, mas sublinha: "Não tenho nada a ver com o empréstimo da Caixa Geral de Depósitos”.
"Não encontraram ligação minha ao dinheiro de Santos Silva"
O antigo líder socialista também fala das suspeitas de que o amigo Carlos Santos Silva tinha contas na Suíça e agia como uma espécie de testa de ferro. O empresário transferiu 23 milhões de euros para Portugal ao abrigo do Regime Excepcional de Regularização Tributária (RERT), mas José Sócrates diz que não há provas de que esse dinheiro seja seu.
“Disseram que o dinheiro era meu. Em nenhum documento vem o meu nome. Nas buscas que fizeram não encontraram qualquer documento que sustentasse a tese de que esse dinheiro era meu”, declarou. "Não encontraram ligação minha ao dinheiro de Santos Silva", reforçou.
José Sócrates garante que "não sabia que Carlos Santos Silva", de quem é amigo há 40 anos, "tinha dinheiro na Suíça", nem moveu influências para a criação de um novo RERT.
"Dinheiro que me permitiu viver em Paris foi dado pela minha mãe"
O antigo primeiro-ministro nega também ser o verdadeiro proprietário de um apartamento numa das zonas mais nobres de Paris, que está em nome do amigo Carlos Santos Silva.
Explica que viveu nessa casa emprestada quando foi tirar um mestrado, mas depois saiu por causa da realização de obras e passou a morar num outro apartamento que alugou.
“Tinha esperança em ir para o apartamento depois das obras mas, como estavam a demorar muito, aluguei outro apartamento. Como me acusam de ser proprietário se eu aluguei outro apartamento? E o procurador disse-me: ‘ você fez isso para disfarçar’. Mas eu nem sabia que estava a ser investigado. O apartamento de Paris onde vivi era alugado”, disse na entrevista à TVI.
O antigo primeiro-ministro desmente as notícias de que manteve uma vida de luxo durante o período em que viveu na capital francesa. "O dinheiro que me permitiu viver em Paris foi dado pela minha mãe", afirmou.
“A vida faustosa é ir tirar um mestrado a Paris e querer que os filhos acabem o liceu numa escola internacional. É isto a vida faustosa para o ´Correio da Manhã’. Fizeram uma campanha política com o objectivo de prejudicar o Governo anterior”, acusou.
Sócrates não sabe "exactamente" quanto dinheiro deve a Santos Silva
José Sócrates admite que, mais tarde, pediu dinheiro emprestado ao amigo Carlos Santos Silva. Revela que já pagou 250 mil euros, mas ainda não sabe quanto falta para saldar a dívida.
"Preciso de falar com ele para saber exactamente quanto lhe devo. Planeio pagar tudo o que devo a Carlos Santos Silva", afiança, sendo que os dois arguidos na "Operação Marquês" estão, actualmente, impedidos de contactar um com o outro.
O antigo líder do PS afirma que Carlos Santos Silva é o seu "melhor amigo fora da política", conhecem-se há 40 anos e passam férias juntos há 20 anos. "É uma pessoa honesta, decente, bondosa e um grande empresário".
Sócrates admite processar o Estado
Depois de ter tecido duras criticas à procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, responsabilizando-a pela forma como decorre o processo “Operação Marquês”, na segunda-parte da entrevista Sócrates considerou que o Ministério Público lhe devia pedir desculpas.
O antigo primeiro-ministro garantiu ainda que não vai deixar de pedir uma indemnização ao Estado pela prisão ilegal e pelo envolvimento do seu nome neste processo.
“Eu admito processar o Estado português, agir contra o Estado português, mas ainda não é esse o momento. Lá chegaremos, porque eu acho que tem havido uma reiterada quebra naquilo que são as obrigações de respeito pelas normas do Direito Penal por parte do Estado português. E não é só de agora, é de há muito tempo. Eu já fui vítima disto duas vezes”
"Se calhar quiseram evitar que fosse candidato a Belém"
Nesta entrevista à TVI, José Sócrates reafirma que o seu caso teve contornos e consequências para o Partido Socialista, mas também para o seu futuro na política.
"Se calhar quiseram evitar que fosse candidato a Belém" nas eleições de Janeiro, atirou Sócrates, garantindo que nunca pensou na possibilidade de avançar para a Presidência da República. Confessa que ainda não sabe em quem vai votar, mas tem uma certeza: Não vai ser em Marcelo Rebelo de Sousa.
“Gostaria que o PS tomasse uma posição. Não pode ficar
fora. Ficar de fora estará a favorecer Marcelo Rebelo de Sousa”, alerta.
Considera que o novo Governo de António Costa tem toda a legitimidade política. Sobre o acordo das esquerdas vê “com agrado este novo diálogo” e mostra que PCP e Bloco de Esquerda "aprenderam a lição" de 2011, quando o seu Governo caiu após o chumbo no Parlamento do PEC4.
José Sócrates está indiciado de crimes de fraude fiscal
qualificada, branqueamento de capitais e corrupção passiva para acto ilícito no
âmbito da “Operação Marquês”.
Foi libertado a 16 de Outubro passado, mas continua proibido de se ausentar de Portugal e de contactar com os outros arguidos do processo da “Operação Marquês”. A medida de coacção foi alterada para prisão domiciliária, com vigilância policial, a 4 de Setembro.
Além de Sócrates, são arguidos no processo o ex-ministro socialista Armando Vara, a filha deste, Bárbara Vara, assim como Carlos Santos Silva, empresário e amigo do ex-primeiro-ministro, Joaquim Barroca, empresário do grupo Lena, João Perna, antigo motorista do ex-líder do PS, Paulo Lalanda de Castro, do grupo Octapharma, Inês do Rosário (mulher de Carlos Santos Silva), o advogado Gonçalo Trindade Ferreira e os empresários Diogo Gaspar Ferreira e Rui Mão de Ferro.
[notícia actualizada às 03h14]