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Patriarca do Iraque ameaça levar Parlamento ao tribunal internacional

10 nov, 2015 - 17:09 • Filipe d'Avillez

Em causa está uma lei que obriga os filhos de um homem que se converta ao Islão a adoptarem a religião do pai, independentemente da vontade dos mesmos ou da mãe.

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O patriarca da Igreja Caldeia, a maior do Iraque, ameaça levar o parlamento de Bagdad aos tribunais internacionais, em protesto contra a aprovação de uma lei que considera discriminatória contra os cristãos.

A 27 de Outubro o parlamento aprovou uma lei que estipula que no caso de um homem se converter ao Islão os seus filhos menores tornam-se muçulmanos também, independentemente da sua vontade ou da vontade da mãe das crianças. Também no caso de uma cristã com filhos menores que se case com um muçulmano, os enteados do marido tornam-se automaticamente muçulmanos.

Uma vez que no Iraque, como em muitos países de maioria muçulmana, a conversão do Islão para qualquer outra religião é proibida por lei ou, nos poucos casos em que é permitida, representa um perigo à vida de quem se quer converter, a medida aprovada pelo Parlamento significa, na prática, que as crianças em causa terão de ser oficialmente muçulmanas para sempre, sob pena de serem perseguidas ou terem de fugir do país.

Vários deputados que representam as minorias não muçulmanas, incluindo os cristãos, os yazidis e os mandeus tentaram convencer o parlamento a incluir uma ressalva, permitindo às crianças manter a sua religião até aos 18 anos, altura em que poderiam escolher, mas a ideia foi rejeitada. No final da votação todos os deputados não muçulmanos abandonaram o hemiciclo em protesto.

Num comunicado enviado à Renascença pela fundação Ajuda à Igreja que Sofre o patriarca Louis Sako não poupa palavras a criticar a nova lei e apela ao Presidente que mande a lei de volta para o Parlamento, para ser reavaliada, e ameaça levar o caso aos tribunais internacionais.

“Apelamos ao presidente da República do Iraque Fuad Masoum, que devolva a lei à Assembleia dos Deputados para ser modificada e ao mesmo tempo, pedimos aos deputados que assumam as suas responsabilidades e criem realmente condições de justiça e igualdade entre os cidadãos do Iraque. Mais uma vez, queremos sublinhar que, no caso de aplicação desta lei, faremos ouvir a nossa voz ao nível internacional e asseguraremos que a Assembleia de Deputados responda por isto diante do tribunal internacional”.

Inconstitucional

Segundo o patriarca caldeu a lei é ainda inconstitucional, uma vez que viola três artigos, incluindo os que garantem a “protecção do indivíduo contra qualquer coacção doutrinal, política ou religiosa” e ainda a “liberdade de pensamento, consciência e ideologia” de cada pessoa. Mas Sako vai mais longe e acusa os autores da lei de estarem a violar o próprio Alcorão, que em várias passagens rejeita a coacção em matéria de religião.

Para o patriarca da Igreja Caldeia, uma igreja católica de rito oriental, os iraquianos estão perante uma das normas mais discriminatórias de que há memória. “Esta norma é das mais discriminatórias, porque revela total desrespeito pelos valores da civilização do Iraque e contra aqueles que são considerados como sendo entre os primeiros cidadãos deste país. Tudo isto é uma ameaça à unidade da nação, bem como ao equilíbrio social, pluralismo religioso e o princípio da aceitação dos outros na sua diversidade”.

Existem cristãos no Iraque desde o início do Cristianismo, séculos antes do advento do Islão. As comunidades cristãs, divididas entre diversas igrejas, algumas católicas outras ortodoxas, têm sofrido vários episódios de perseguição ao longo das últimas décadas, mas a situação piorou bastante desde a queda do regime de Saddam Hussein em 2003. Mais recentemente o avanço do auto-proclamado Estado Islâmico levou à fuga em massa de centenas de milhares de cristãos da região de Mosul e do Vale de Nínive, que na sua maioria procuraram refúgio no Curdistão Iraquiano.

A lei acima referida não se aplica na região autónoma governada pelos curdos.

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