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A Economia de Francisco

As empresas só pensam no lucro? As coisas estão a mudar, mas ainda "há muito a fazer"

03 mar, 2020 - 15:55 • Ângela Roque , Sofia Freitas Moreira (fotos)

Diretora-geral da AESE Business School e jovem gestor formado na Nova BSE analisam desafio do Papa para encontrar um novo modelo económico “que ponha as pessoas no centro”.

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Entrevista a Fátima Carioca e Pedro Mendonça sobre "A Economia de Francisco", da jornalista Ângela Roque (03/03/2020)

Uma das críticas do Papa ao atual modelo económico é que deixou de ter as pessoas no centro. Fátima Carioca, diretora-geral da AESE Business School, reconhece toda a razão a Francisco quando fala na “economia que mata”, porque apesar do progresso ser “bom e desejável”, e ter melhorado a qualidade de vida das pessoas, também provocou “uma grande desigualdade social”. Mas acredita que ainda se vai a tempo de reverter a “cultura da indiferença”.

Da escola que dirige – garante – os executivos e homens negócios já saem sensibilizados para estas questões. “A AESE, tendo uma matriz católica, desde a sua fundação que infunde nas pessoas que passam por lá a ideia de que o propósito da liderança vai mais longe do que manter organizações que sejam economicamente viáveis”. E valoriza-se muito “a ética” e a “responsabilidade social” das empresas perante as pessoas que tocam – sejam colaboradores, clientes, fornecedores, ou “a própria comunidade” onde as empresas se inserem.

Para esta responsável, que leciona ‘fator humano’, a responsabilidade de quem está à frente de uma empresa passa por “considerar em cada momento as consequências sociais de todas as suas decisões”, seja quando tem de se despedir alguém, seja nas condições que se dá aos empregados para conciliarem a vida profissional com a vida pessoal e familiar, dimensão que considera “muito importante considerar quando estamos a falar de pessoas numa organização”, explica.

"Os jovens estão hoje muito mais atentos, quer ao mundo quer às pessoas. Arriscam ter soluções criativas e provavelmente economicamente viáveis"

Como formadora no recente curso de preparação para o encontro 'A Economia de Francisco', diz que sentiu interesse e preocupação por esta área, e que não foi por acaso que o Papa escolheu a geração até aos 35 anos para fazer esta reflexão de futuro.

“Os jovens estão hoje muito mais atentos, quer ao mundo quer às pessoas”, sendo que muitos deles já têm “comportamentos e atitudes mais sóbrios, e estilos de vida diferentes daqueles que eram padrão há uma geração atrás” e “arriscam ter soluções que são criativas e provavelmente economicamente viáveis”.

Pedro Mendonça concorda. Aos 23 anos é licenciado em gestão pela Nova BSE, onde também trabalha. Muito ativo ao nível do voluntariado, através do Banco Alimentar ou da Missão País, assegura que as novas gerações estão hoje muito mais atentas às necessidades das pessoas.

“Vivemos um tempo de grande novidade digital e grande complexidade virtual, mas eu acredito que há um outro lado, que é o de realçar o valor autêntico da relação humana”, que os jovens sabem que “não é substituível por qualquer outro tipo de interação virtual”. E dá testemunho do que conhece “ao nível dos jovens católicos, e dos movimentos de voluntariado”, onde muitos estão “ao serviço”.

“Temos vários exemplos como a Missão País, que faz os jovens universitários saírem das suas rotinas durante uma semana de férias para ir ao encontro das pessoas numa aldeia despovoada e envelhecida do país”. Outro projeto que destaca é o dos “Amigos Improváveis”, através do qual muitos jovens “apadrinham idosos que vivem mais sozinhos em Lisboa”.

No futuro Pedro Mendonça acredita que haverá mais “lideranças servidoras”, que ponham, de facto, as pessoas no centro das preocupações. “Tenho a certeza que sim. A minha experiência profissional ainda é curta, mas já vejo que há uma grande mudança dentro das empresas”, que já não têm só a “tradicional preocupação com a maximização dos lucros”, mas dão “maior atenção às pessoas”.

“Têm em conta o impacto e a sustentabilidade. São duas palavras novas que já não nos vão deixar nunca mais. As empresas começam cada vez mais a preocupar-se com o impacto que têm nas pessoas”.

Conciliação trabalho-família

Um dos problemas da atualidade no mundo empresarial é a conciliação entre trabalho e família. Fátima Carioca, que tem um mestrado em 'Matrimónio e Família', garante que apesar de haver cada vez mais “empresas familiarmente responsáveis”, ainda “há muito a fazer”.

“Isto insere-se num paradigma de olhar a empresa como tendo consequências - o impacto, como lhe chama o Pedro. A família dos colaboradores é algo que não está nem longe, nem está dentro da empresa, mas que a empresa toca diretamente com as suas políticas, seja pela forma como gere as pessoas, como gasta a energia das pessoas no seu dia a dia, seja na forma como paga salários justos, que permitem condições de vida digna à própria família”.

“Família todos temos, por isso não são apenas políticas para aqueles que são casados, mas é preciso pensar também na família alargada, nos pais. É muito importante este tipo de políticas, humaniza muito a relação que se vive entre os colaboradores”, acrescenta a responsável pela AESE Business School.

Pedro Mendonça, que vai participar no encontro ‘A Economia de Francisco’ – que por causa da epidemia do novo Corona vírus foi adiado de março para 21 de novembro – acredita que haverá compromissos importantes para o futuro.

“O Papa convida os jovens a uma postura muito ativa. Não nos convida só a ir ouvir, mas a participar neste debate por uma economia mais humana, mais centrada nas pessoas, e tenho a certeza de que (do encontro) vão sair ideias, moções, mas sobretudo vão sair jovens implicados e comprometidos em agir, em serem ativos nesta transformação que o mundo requer para a economia”.

“Cada jovem irá voltar e o seu papel, a sua missão, é implementar e agir na sua comunidade e dentro do seu contexto, por esta economia de Assis”.

O novo espaço de colaboração da Renascença com a Associação Cristã de Empresários e Gestores (ACEGE) sobre o encontro “A Economia de Francisco” é emitido todas as terças-feiras, depois das 13h00. Apesar do adiamento do encontro para novembro, até 26 de março vamos continuar a analisar as propostas da Igreja e do Papa com a ajuda de diversos protagonistas.
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