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Detetados erros de quase 42 mil euros na gestão de fundos para refugiados

08 mai, 2019 - 00:10 • Lusa com Redação

Tribunal de Contas deu 30 dias ao SEF para explicar o destino dado à diferença entre as verbas recebidas da Comissão Europeia para acolhimento de refugiados e as transferidas para as entidades beneficiárias. Ministério Público estará a investigar.

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O Tribunal de Contas detetou erros financeiros de quase 42 mil euros no Programa Nacional do Fundo para o Asilo, Migração e Integração, nomeadamente no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, com diferenças não explicadas entre valores recebidos e pagos.

De acordo com o relatório da auditoria enviado às redações, o Tribunal de Contas (TdC) detetou erros financeiros nos valores recebidos e pagos pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) em relação às operações de reinstalação, transferência e recolocação de refugiados.

Estas operações foram financiadas pela Comissão Europeia e criadas para fazer face “ao número sem precedentes de pessoas a entrar irregularmente na Europa e à necessidade de restabelecer a gestão ordenada das fronteiras na rota do Mediterrâneo, a partir de 2015/2016”, refere o relatório.

A Comissão Europeia transferiu para Portugal seis mil euros por pessoa recolocada e 10 mil euros por pessoa reinstalada, já que se tratava de “montantes fixos pagos por cada pessoa”, denominados 'lump sums'.

“Os valores pagos pelo SEF, aprovados pelo GTAEM [Grupo de Trabalho para a Agenda Europeia das Migrações], foram fixados em seis mil euros por pessoa, com a justificação de não criar situações de tratamento diferenciado entre as entidades de acolhimento”, lê-se no documento.

Outra discrepância teve a ver com o facto de o SEF fazer distinção entre o valor pago por adultos e menores, atribuindo a estes últimos apenas quatro mil euros, uma situação que terá sido corrigida em novembro de 2016, passando todos a receber os mesmos seis mil euros.

“Verificando-se, em ambos os casos, eventuais diferenças entre os valores recebidos e os valores pagos, questionou-se o SEF para que no exercício do contraditório esclarecesse os referidos diferenciais e o destino dado às verbas daí resultantes”, refere o TdC, acrescentando que “esse esclarecimento não foi prestado”.

O TdC deu um prazo de 30 dias ao SEF para que explique o valor e o destino dado à diferença entre as verbas recebidas da Comissão Europeia para acolhimento de requerentes das ‘lump sums’ e as transferidas para as entidades beneficiárias.

“No que respeita às ‘lump sums’, que representam 50% do financiamento total e a maior parte do que já foi executado, observou-se que no período 2016/2017 foram consideradas 39 pessoas reinstaladas (para uma meta de 281), e 1.110 recolocados (para uma meta de 2.981), sendo 825 vindos da Grécia e 285 de Itália”, refere o TdC.

Dentro dos erros financeiros, o TdC detetou “inelegibilidade de 18 mil euros” relativos a três requerentes de asilo vindos da Grécia que não compareceram em Portugal.

O TdC encontrou também erros ao analisar cinco projetos, entre 41 com execução, para os quais foram destinados quase 23 milhões de euros e que representavam 67,9% da despesa total.

A análise, de procedimentos, candidaturas e transferência de verbas, revelou que “o controlo administrativo efetuado pelas entidades competentes é por vezes insuficiente, evidenciando desconformidades e, em quatro operações, erros financeiros no total de 41.987,11 de euros”, diz o TdC.

Um desses projetos era da Organização Internacional para as Migrações (OIM) – Missão em Portugal, onde foram encontradas despesas de quase 15.500 euros “com um funcionário com funções administrativas e financeiras”, aprovadas pela secretaria-geral do Ministério da Administração Interna (SGMAI), que contrariam as indicações e deveriam enquadrar-se nos custos indiretos.

O tribunal detetou também quase oito mil euros que não deveriam ter sido colocados num projeto da Cruz Vermelha Portuguesa pelas mesmas razões.

O TdC refere que nenhum dos cinco projetos analisados está financeiramente concluído, referindo que o projeto de reinstalação, concluído em agosto de 2018, tinha uma taxa de execução de 76%, abrangendo 214 pessoas das 281 programadas.

O projeto de transferência e recolocação, finalizado em setembro de 2018, teve uma taxa de execução de 52%, abrangendo 1.545 requerentes, para 2.981 programados.

O TdC remeteu o relatório para o Ministério Público.

Comissão Europeia ameaçou deixar de financiar programa nacional de apoio aos refugiados

A Comissão Europeia ameaçou retirar o financiamento ao Programa Nacional do Fundo para o Asilo, Migração e Integração por causa da baixa taxa de execução, uma perda de 16,7 milhões de euros para Portugal, uma possibilidade que se mantém.

A conclusão consta do relatório de uma auditoria do Tribunal de Contas (TdC) ao Programa Nacional do Fundo para o Asilo, Migração e Integração (FAMI), a que a Lusa teve acesso, e que revela que em julho de 2018 a taxa de execução era de “apenas 25%”.

Este programa foi inicialmente estruturado com quatro objetivos (Asilo, Integração e Migração Legal, Regresso e Solidariedade), aos quais foi posteriormente adicionado um quinto objetivo especificamente para apoiar “casos especiais-‘lump sums’”, também designados por requerentes de proteção internacional.

“Foi o esforço adicional decorrente do apoio aos requerentes de proteção internacional que aumentou o grau de execução do programa”, diz o TdC.

Segundo o TdC, “o montante executado do fundo, de 11,6 milhões de euros, em julho de 2018, representava cerca de 25,3% do valor aprovado” de 45,8 milhões de euros.

Destes 11,6 milhões de euros, 10,5 milhões de euros eram referentes à componente ‘lump sums’, o que significa que sem a componente prevista para os refugiados “a execução não iria além de 1,1 milhões de euros”.

“Os níveis baixos de execução do FAMI levaram a Comissão Europeia a considerar, em março de 2018, um eventual ‘decommitment’ [anulação de autorizações] em 2018, o que representaria uma perda de cerca de 16,7 milhões de euros para Portugal”, lê-se no documento.

O TdC refere que, no ano passado, uma derrogação da Comissão Europeia veio permitir aplicar as verbas não utilizadas noutros objetivos específicos, mas “tendo em conta o nível reduzido de execução registado, até à data, nesses objetivos, mantém-se latente o risco de perda de verbas”.

Relativamente ao objetivo integração e migração legal, o tribunal refere que apenas foram executados 300 mil euros face aos 9,2 milhões de euros aprovados, revelando, por isso, um “desempenho insuficiente”.

“Existem riscos significativos de que o programa venha a ter resultados limitados neste objetivo específico”, o que poderá pôr em causa, alerta o TdC, as políticas de migração e o trabalho de integração, capacitação e combate à discriminação de imigrantes e grupos étnicos na sociedade portuguesa, incluídos na Agenda 2030 das Nações Unidas.

O TdC aproveita também para chamar a atenção para o facto de Portugal não ter concretizado iniciativas para menores não acompanhados, inicialmente previstas no objetivo Integração e Migração Legal, “apesar das orientações da Comissão Europeia” para que os Estados-membros dessem especial atenção a estas crianças e jovens.

Relativamente à parcela para os refugiados dos ‘lump sums’, que representa 50% do financiamento total, a auditoria constatou que dos 1.520 refugiados recolocados em Portugal até final de novembro de 2017, 768 (50,5%) tinham saído do país.

Entre os que ficaram, 55% conseguiu autonomizar-se do acolhimento institucional, tendo os restantes sido reencaminhados para respostas complementares, verificando-se, no entanto, “dificuldades na implementação do programa de acolhimento de refugiados, que prejudicam a integração efetiva dos mesmos”.

O TdC aproveita para recomendar ao Ministério da Administração Interna (MAI) que reveja o modelo de gestão e pondere medidas complementares para ultrapassar as dificuldades identificadas na integração dos refugiados.

Já à secretaria-geral do MAI, ao Alto Comissariado para as Migrações e Serviço de Estrangeiros e Fronteiras recomenda níveis de execução que evitem perda de financiamento europeu, melhores procedimentos de controlo, critérios uniformes, recuperação das verbas indevidamente pagas e melhor sistema de informação sobre a execução física do programa.

O Programa Nacional do FAMI foi inicialmente dotado pela União Europeia com 33,8 milhões de euros, para o período 2014/2020, valor que foi várias vezes revisto e está agora nos 75,2 milhões de euros.

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