Emissão Renascença | Ouvir Online
A+ / A-

Segurança e Saúde no Trabalho

Estado não cumpre regras que impõe aos privados

29 abr, 2019 - 06:54 • Ana Carrilho

As entidades empregadoras estão obrigadas ao cumprimento da legislação sobre Higiene, Segurança e Saúde no Trabalho, mas a entidade empregadora “Estado” raramente cumpre com os seus trabalhadores o que impõe ao sector privado.

A+ / A-

Em 2018, morreram 131 trabalhadores em acidentes de trabalho. Este ano, a informação atualizada pela Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) a 10 de janeiro refere apenas uma morte. E quantas pessoas morrem anualmente por doença profissional? Essa é uma conta incerta, mas, a fazer fé nas estimativas da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o número é quase sete vezes superior.

As entidades empregadoras estão obrigadas ao cumprimento da legislação sobre Higiene, Segurança e Saúde no Trabalho, mas a entidade empregadora “Estado” raramente cumpre com os seus trabalhadores o que impõe ao sector privado. A denúncia veio das centrais sindicais, mas também da Ordem dos Médicos.

Há cada vez mais estudos sobre o impacto dos riscos psicossociais em determinadas profissões e eles mostram maior prevalência entre os trabalhadores da saúde, ensino e forças de segurança, de acordo com Mário Freitas, membro do Colégio da especialidade de Medicina do Trabalho, em entrevista à Renascença. Esta realidade "não tem tido das entidades empregadoras a atenção devida”, diz Mário Freitas.

O especialista aponta o exemplo dos professores, que não têm serviços de segurança e saúde no trabalho, ou dos hospitais, onde um médico de Medicina do Trabalho tem a seu cargo um número de trabalhadores várias vezes superior ao do sector privado. “Não podemos continuar a ter serviços nas empresas privadas a cumprirem critérios de capitação de 1/1.500 trabalhadores em situação de risco ou 1/3.000 (sem risco acrescido) e, depois, vermos que para a Administração Pública é completamente diferente: chega a ser 1/12.000. Isto é inaceitável”, desabafa Freitas, sublinhando que a Ordem se preocupa com mais e melhor saúde para todos os cidadãos, independentemente de quem é a entidade patronal.

“O Estado impõe as regras aos privados - e muito bem -, mas ignora-as para os seus funcionários. Isso não pode acontecer", enfatiza, considerando que, cada vez mais, as entidades públicas têm que ter serviços organizados de segurança e saúde no trabalho.

Esta falha também é referida pelas centrais sindicais, embora Fernando Gomes, da CGTP, admita que na Administração Local já se assista a um investimento nesta área. Há, inclusivamente, eleição dos representantes dos trabalhadores para as comissões de segurança e saúde. “São essenciais para que nos locais de trabalho se faça a avaliação de riscos e se definam políticas de prevenção de acidentes e doenças profissionais. O que não acontece, claramente, na Administração Central”, afirma o sindicalista.

Médicos têm que estar alerta com a profissão dos seus doentes

O sistema está preparado para que qualquer médico – e não apenas os de medicina de trabalho ou os de família – presumindo uma doença profissional no seu doente, a notifique ao Departamento de Proteção contra Riscos Profissionais, da Segurança Social e este dê seguimento ao processo. “Mas por alguma falha no sistema, a profissão da pessoa, muitas vezes, é subvalorizada, não lhe é dada relevância no contexto de saúde”, admite Mário Freitas.

“A população passa boa parte do dia a trabalhar, na empresa, em casa, em qualquer lado – as novas tecnologias também nos arrastam para isso – e nós, médicos, temos que perceber estas coisas e contextualizar cada vez mais para perceber até que ponto o posto de trabalho terá ou não a ver com a queixa”, esclarece este representante da Ordem dos Médicos.

Embora ainda seja necessário fazer mais trabalho para sensibilizar os clínicos para a eventual ligação, Mário Freitas também admite que em muitos casos falta tempo porque esta notificação exige um processo administrativo/burocrático que leva muito tempo.

Mário Freitas defende que deve haver uma equipa multidisciplinar na segurança e saúde no trabalho para mais facilmente detetar as doenças de origem profissional. Com responsabilidade acrescida para os médicos de medicina do trabalho que, obviamente, têm que conhecer os postos de trabalho dos trabalhadores que acompanham.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

Destaques V+