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​Como o Papa Francisco “deu” a Maria Rueff uns sapatos

28 mar, 2019 - 22:54 • Ana Catarina André

A atriz foi a primeira de 11 figuras públicas a participar na iniciativa ‘E Deus nisso tudo’, promovida pela jornalista Maria João Avillez, na igreja do Campo Grande, em Lisboa.

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CONF CAMPO GRANDE MARIA RUEFF D28

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Maria Rueff era ainda criança. A família tinha regressado há pouco tempo de África e a menina tinha sido escolhida para ser um dos anjinhos da procissão do Senhor dos Passos da Graça, em Lisboa. “Era preciso ter sapatos pretos e eu disse à minha catequista que não tinha nenhuns. Então ela proibiu-me de ir na procissão. Entrei em choque. Fui ter com a minha mãe e ela pintou de preto os únicos sapatos que eu tinha – e pude participar”, contou a atriz, na primeira de 11 conversas conduzidas por Maria João Avillez, na igreja do Campo Grande, em Lisboa, no âmbito da iniciativa “E Deus nisso tudo”.

Um pouco mais à frente, Maria Rueff voltaria a evocar o mesmo episódio para falar do papel do Papa Francisco na sua vida. “É como se [o seu pontificado] tivesse trazido àquela pequenina os sapatos da cor que eram. Trouxe isto que nos deve seguir a todos: amarmos o outro como ele é. É isso que o humorista faz de alguma forma”.

Durante cerca de uma hora, Maria Rueff falou sobre o seu percurso e a sua relação com o catolicismo. “Estou aqui por uma promessa que a minha mãe fez. Em África não havia grandes ajudas da medicina, e aparentemente eu era um bebé com defeito. A minha mãe disse: ‘Seja o que for, eu quero tê-lo. E se nascer no dia de Corpo de Deus, será Maria de Deus’; e assim foi”, revelou. “Chamo-me Maria de Deus.”

Ainda que a sua fé seja pública, Maria Rueff prefere mantê-la numa esfera de intimidade. “Gosto de preservar o meu jardim secreto: a minha filha e a minha relação com Deus no sentido de não deixar que essa relação se transforme numa coisa panfletária. Gosto de procurar intimidade com Deus”, afirmou a comediante para quem “Deus é um amigo de almofada”.

“Normalmente no teatro estamos rodeados de ateus. Quem sou eu para julgar? Como não julgo ninguém, tenho a enorme felicidade de ter pessoas à minha volta que também não me julgam.”

Ao longo da carreira, Maria Rueff foi questionando a sua posição de humorista. “Tive várias crises de fé”, confessou. “Como é que se pode fazer humor que aparentemente magoa o caricaturado? Como posso fazê-lo sem castigar o outro?” E contou: “Numa das minhas noites escuras, fiz um retiro e descobri um livro de um jesuíta que defende que há um humor que é bom e outro que, de facto, não é feito da melhor maneira. O bom é catártico e o outro sobranceiro, arrogante”. E concluiu: “Sinto-me ao serviço do outro e é assim que resolvi [a questão] no meu coração. Encaro o humor como espelho do outro e não como uma farpa”.

Nas próximas semanas, Maria João Avillez receberá figuras como o advogado e conselheiro de Estado António Lobo Xavier, o historiador de ciência Henrique Leitão, a maestrina Joana Carneiro e a presidente da Fundação Champalimaud, Leonor Beleza. “São conversas com pessoas com responsabilidade na vida portuguesa sobre a sua relação com o sagrado. A ideia é fazer uma viagem pelas suas vidas, perguntando-lhes onde está Deus nisso tudo”, explica a jornalista. E acrescenta: “É o ângulo confessional de cada uma destas pessoas”.

A Renascença transmite um excerto de cada conversa às quintas-feiras entre as 23h00 e a meia-meia e publica aqui a conversa na integra.

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