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Foi abusado pelo pároco, a mãe não acreditou e não espera nada desta cimeira

21 fev, 2019 - 13:00 • Aura Miguel

James Faluszczak abandonou o sacerdócio quando percebeu que não conseguia lidar com o facto de ter sido abusado e de ver casos de abuso à sua volta que estavam a ser ignorados. Hoje, dedica-se a ajudar outras vítimas como ele.

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James Faluszczak nasceu e cresceu nos Estados Unidos. Foi abusado na adolescência por um padre, que se aproveitou da proximidade à sua família.

Esta quinta-feira, em Roma, à margem da primeira cimeira sobre abusos sexuais que decorre no Vaticano, falou com a Renascença sobre a sua experiência.

Pode contar-nos a sua história?

Chamo-me James Faluszczak e, quando era adolescente, em Erie, na Pensilvânia, vivia muito perto da nossa Igreja paroquial. A minha mãe tinha trabalhado na chancelaria da diocese de Ogdensburg, Nova Iorque, e adorava o facto de o nosso pároco me dar muita atenção. Achava perfeitamente inocente que eu passasse tanto tempo na Igreja.

Mas foi nesse contexto que o padre Daniel Marten soube das dificuldades na minha família, que a minha mãe e o meu pai estavam a ter problemas no casamento, porque era ele que ouvia as suas confissões. E sabia os efeitos que isso tinha sobre mim, porque foi o padre a quem eu me fui confessar pela primeira vez.

Ele tornou-se meu amigo e, como vivíamos tão perto da Igreja, os padres e as freiras não eram apenas parte da vizinhança, eram como parte da nossa família alargada. Por isso, ele aproveitou-se disso e de todas as dificuldades em casa e das minhas inseguranças para me abusar.

Que idade é que tinha, na altura?

Tinha 16 anos quando tudo começou e 19 quando, finalmente, pus fim à situação.

Como é que fez isso?

Eu não era o único de quem ele abusava, havia um grupo e havia umas freiras que estavam mais ou menos envolvidas, também. Eu, simplesmente, afastei-me de tudo isso.

Entretanto, tornou-se padre…

Sim. Ainda hoje sinto que Deus me chamou a ser padre. Acho que a minha vocação era válida. Mas, quando já era padre há alguns anos, tinha reprimido o que me tinha acontecido, suponho que para poder lidar com o assunto, mas estava a ver amigos a envolver-se em comportamentos inadequados e outros colegas que sabia que eram abusadores e que estavam a regressar ao ministério.

Em 2013, contei ao bispo o que me tinha acontecido e falei-lhe também de outros casos de abuso sexual de crianças, sobre os quais nada foi feito.

Quando abandonei o sacerdócio, em 2014, o bispo queria que eu ficasse, dizia-me que era um ótimo padre, mas eu sentia que ele apenas me queria controlar.

Em que diocese se passaram esses factos?

Foi na diocese de Erie, na Pensilvânia. Quando fui ordenado, era bispo o Donald Trautman e, quando saí, era o bispo Lawrence Persico.

Eu não sentia que poderia continuar a ser um padre e manter-me saudável, sabendo o que se estava a passar e que, apesar de eu denunciar os casos, nada estar a ser feito. Virei-me novamente para o álcool e tive problemas por ser apanhado a conduzir bêbado. Isso foi um despertar para mim, um aviso de que não poderia permanecer e estar bem.

Contou a alguém quando estava a ser abusado?

Contei à minha mãe, cerca de duas semanas depois de ter acontecido. É difícil para mim dizer isto, e é difícil de compreender, mas ela, basicamente, disse-me para tentar lidar com o problema sozinho. Olhando para trás, acho que ela, inicialmente, não acreditou em mim. Mais tarde, acreditou e apoiou-me muito, mas, da primeira vez que lhe contei, não, acho que não acreditou. Estava muito envolvida na Igreja e era difícil para ela acreditar.

Perdeu a fé?

Tenho tido dúvidas, algumas vezes - sobretudo desde que abandonei o ministério. Houve períodos em que duvidei da existência de Deus, da sua bondade e da sua proximidade. Agora, não me sinto assim. Sou cristão, ainda me considero um padre e acredito que Deus está a olhar por mim, mas, quando temos centenas de bispos em todo o mundo que não escutam o seu patrão, isso pode ser desolador.

O que espera desta cimeira?

Não espero nada do Papa Francisco e não espero nada de substancial, em termos de mudanças de procedimentos, do Vaticano. Ainda nem sequer mudaram a linguagem que usam. Ainda falam destas coisas no passado, quando é evidente que ainda ocorrem.

Há duas semanas, um oficial da Congregação para a Doutrina da Fé foi removido e era uma pessoa próxima da acusação em casos destes. O cardeal di Nardo, presidente da Conferência Episcopal dos Estados Unidos, que está presente, removeu do ministério, há cerca de duas semanas, um padre que já sabia que era um abusador. Portanto, isto é uma coisa que está a acontecer agora. Estes crimes são atuais. Os encobrimentos, a cumplicidade e a ameaça às crianças são atuais e há casos atuais de abusos de crianças por padres, na diocese de Erie e na diocese de Buffalo, onde vivo agora.

Acho que tudo o que os bispos vão conseguir aqui é uma boa refeição de pasta. Não acredito que consigam alcançar alguma coisa de concreto, transparente, prático ou imediato.

Comentários
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  • Joaquim Santos
    22 fev, 2019 Tojal 17:19
    Senhor JJ, eles pertencem à futura Igreja do anticristo. Pergunte-lhes quantos aceitam os dogmas da Santa Igreja?
  • JJ
    21 fev, 2019 Zero 14:34
    Os jornalistas da RR são sadomasoquistas. Tenham pena de vós mesmos. Não se achincalhem nem achincalhem a Igreja Católica!!

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