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Negócios atrasados, identidades trocadas e o primo de George Weah. Estes são os insólitos do mercado

31 jan, 2019 - 19:45 • Inês Braga Sampaio

O mercado de transferências é rico em casos caricatos, confusos e até trágicos. No dia em que a janela de inverno fecha, a Renascença conta-lhe algumas histórias que marcaram as janelas de transferências, recentes e antigas.

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O mercado de transferências costuma ser rico em casos, seja por negócios atrasados, inscrições inviabilizadas, chumbos nos exames ou historiais mal investigados. No dia em que a janela de inverno fecha, a Renascença apresenta-lhe alguns insólitos do mercado.

Um caso que salta, desde logo, à memória, tanto por ser recente como por ter sido marcante, é o de Adrien Silva. Num negócio que só ficou fechado no último dia do mercado de verão de 2017, o Leicester pagou 24,5 milhões ao Sporting para adquirir o médio internacional português.

No entanto, os leões enviaram a documentação com 14 segundos de atraso — o prazo para inscrições termina à meia-noite em ponto — e a FIFA não permitiu que os ingleses inscrevessem o jogador. Ao contrário de outros casos, a transferência processou-se mesmo, porém Adrien ficou sem jogar durante seis meses, até à seguinte abertura de mercado.

Seis anos antes, em 2011, o Sporting já tinha protagonizado um caso parecido. O processo da transferência de Yannick Djaló do Sporting para o Nice sofreu um atraso e ficou feita fora do prazo regular. A FIFA rejeitou a transferência e, após recurso dos franceses, o Tribunal Arbitral do Desporto recusou a inscrição do avançado na Ligue 1.

O Nice recusou-se a pagar o valor que estava acordado – 4,5 milhões de euros, segundo a imprensa – e tentou devolver o jogador, mas o Sporting rejeitou recebê-lo. Um ano depois, Djaló rumou ao Benfica, a custo zero, e os leões recorreram para a FIFA. A primeira instância condenou o Nice a pagar um milhão de euros. Os franceses recorreram, mas o caso não chegou a ser novamente apreciado. Os dois clubes chegaram a acordo em 2015 e o Nice aceitou pagar 800 mil euros ao Sporting.

Os tubarões também se atrasam a caçar a "presa"

Em 2015, Real Madrid e Manchester United tinham um acordo por David De Gea. O guarda-redes espanhol rumaria a Madrid, após anos de interesse, por 35 milhões de euros, mais Keylor Navas, que faria o caminho inverso. Porém, num volte-face de última hora, a documentação não foi entregue a tempo e o negócio caiu por terra.

O Real culpou o United e acusou-o de “falta de experiência”, alegando que recebera um fax vital apenas às 23h59, ficando sem tempo para o reencaminhar para a Liga a horas – terá sido enviado um minuto depois do prazo. Chegou mesmo a circular o rumor de que o Manchester United se tinha atrasado no envio da documentação de propósito, porque não queria perder De Gea. Verdade ou não, De Gea e Navas continuam nos respetivos clubes até hoje, embora o costarriquenho tenha perdido o lugar para o belga Thibaut Courtois, contratado este verão ao Chelsea.

O Manchester United é, de resto, protagonista assíduo em casos insólitos. Em 2013, os “red devils” estavam interessados em Ander Herrera, médio do Atlético de Bilbau, e pareciam ter chegado a acordo com os bascos, por valores a rondar os 36 milhões de euros.

No último dia do mercado, a imprensa internacional noticiou a presença de três indivíduos, que alegavam representar dirigentes do Manchester United, na sede da Liga espanhola, em Madrid, para pagar a cláusula de rescisão de Herrera. O negócio caiu por terra sobre o prazo, supostamente porque os três indivíduos não contavam com o IVA.

Mais tarde, veio a público que, afinal, os três homens eram impostores e que o United nem sequer queria pagar aquele valor pelo jogador. O clube inglês frisou, de forma categórica, que não sabia da existência dos três advogados, não os conhecia e não os tinha comissionado. Versão negada pela imprensa espanhola, que acusou o emblema de Manchester de mentir para não ficar mal na fotografia. De qualquer forma, Herrera rumou mesmo ao Manchester United, um ano depois.

Os "toma lá, dá cá" que marcam rivalidades

Também há casos em que ninguém fica bem na fotografia. Tudo começou quando a Roma oficializou a contratação de Malcom ao Bordéus, a 23 de julho de 2018. Porém, um novo clube entrou na jogada, com mais dinheiro, e o Bordéus terá proibido Malcom de viajar para Itália. No dia seguinte, o avançado brasileiro era oficializado como reforço do Barcelona. A passagem pela Catalunha não tem sido feliz.

Uma operação que traz à memória contratação de Alfredo Di Stéfano, dos episódios mais marcantes da rivalidade entre Barcelona e Real Madrid.

Os catalães pagaram ao River Plate, clube que detinha os direitos do avançado, e levaram Di Stéfano para Espanha, contudo não se entenderam com o Millonarios, da Colômbia, em que o jogador militava.

O Real Madrid entrou no jogo com acordo com o Millonarios. Após várias confusões — com, dizem na Catalunha, mão de Franco à mistura —, a Real Federação Espanhola de Futebol determinou que os dois rivais teriam “custódia” partilhada de “La Saeta” – uma temporada para um, outra para o outro, e assim sucessivamente. O Barça rejeitou o acordo, optando por vender ao Real a parte a que tinha direito.

Di Stéfano viria a tornar-se o maior símbolo da história do Real Madrid, com cinco Ligas dos Campeões conquistadas consecutivamente.

Fábio Coentrão é adepto assumido do Sporting, mas em 2013 acabou por “ajudar” o Benfica, clube que o lançou para a ribalta. O internacional português esteve muito perto de rumar ao Manchester United, por empréstimo do Real Madrid. Para o substituir, os “merengues” tinham alinhavado o brasileiro Guilherme Siqueira, do Granada.

Todavia, os papéis de Coentrão não terão entrado a tempo e a mudança falhou à última hora. Consequentemente, a ida de Siqueira para o Real, que estava dependente do agora jogador do Rio Ave, também caiu.

O brasileiro acabaria por ser emprestado ao Benfica, com que completou uma época de grande nível. O diretor desportivo do Granada, Juan Carlos Cordero, revelou, já depois do fecho do mercado, que Siqueira chegou a ser jogador do Real Madrid “durante meia ou uma hora”.

O estranho caso do primo de George Weah - ou a pior transferência de sempre da Premier League

Beneficiado por trocadilhos foi Barkley Miguel-Panzo, que no passado verão foi contratado pelo FK Panevezys. O clube lituano enalteceu que o jogador era internacional angolano e tinha representado o Queens Park Rangers, clube por que havia marcado 45 golos em 36 jogos. Informações todas retiradas da "Wikipedia", mas que, afinal, não eram verdade.

Um caso a fazer lembrar o de Ali Dia, suposto primo de George Weah, que chegou à Premier League pela mão do Southampton. Corria o verão de 1996 quando o então treinador dos “saints”, Graeme Souness, recebeu um telefonema de George Weah, avançado liberiano do AC Milan e eleito melhor jogador do mundo daquele ano. Weah falou a Souness de Ali Dia, um primo internacional senegalês, de 22 anos, que tinha deixado o Paris Saint-Germain e estava interessado em jogar no Southampton.

Souness ficou interessado, já que o jogador tinha um currículo muito interessante e o clube precisava de reforços. Dias depois, Ali Dia assinou contrato por um mês. O primeiro teste foi num jogo do campeonato, frente ao Leeds United, em casa. Mathew Le Tissier lesionou-se aos 33 minutos e pediu para sair. O suplente foi Dia que, com a camisola 33, deixou marca indelével na história da Premier League — pelos piores motivos. Dia jogou 53 minutos, antes de ser substituído.

No final, Le Tissier comentou que o jovem “parecia o Bambi a tentar correr sobre gelo”. Souness ligou a Weah para protestar com a recomendação, apenas para lhe ser informado que o liberiano nem sequer conhecia esse tal Ali Dia. Ao que parece, teria sido um colega de faculdade de Dia a contactar vários clubes, fazendo-se passar por George Weah. Ao que a imprensa britânica descobriu pouco depois, Dia tinha 31 anos, em vez 22, e era estudante de economia da Universidade de Northumbria. Ao invés do PSG, tinha curtas aventuras em equipas semi-profissionais de França e nos amadores do Blyth Spartans.

Não só com atrasos e de trocadilhos se fazem insólitos

Abundam histórias de jogadores que tinham tudo fechado e que, depois, chumbaram nos exames médicos. Caso de Aly Cissokho, que falhou a transferência do FC Porto para o Inter de Milão, então treinado por José Mourinho, devido a um problema nos dentes; ou de Lucas Silva, cujo empréstimo do Real Madrid ao Sporting ficou frustrado devido a um problema cardíaco. O médio brasileiro esteve dois meses em exames, para detetar uma arritmia, que, entretanto, foi tratada.

Na presente janela, Jordan Lukaku — irmão de Romelu, do Manchester United — viu gorado o empréstimo da Lazio para o Newcastle. No verão, Zakarya não trocou o Belenenses pelo FC Porto devido, explicaram os dragões, a uma lesão contraída no último jogo pelos lisboetas. Versão que o treinador do Belém, Silas, negou de forma categórica.

As lesões podem, de facto, estragar uma transferência, como no caso de Stefano Sturaro. Era uma das "bombas" do mercado de transferências português: um médio da Juventus, jovem e de qualidade reconhecida, aconselhado por Cristiano Ronaldo a rumar por empréstimo ao Sporting.

Porém, Sturaro chegou lesionado e chumbou nos exames médicos. Foi operado e os leões frisaram que não tratariam um jogador que poderia nem vir a jogar pelo clube e que só o aceitariam se ele recuperasse dentro de um período aceitável. Tal não aconteceu e o Sporting devolveu o médio à Juventus, que acaba de emprestá-lo ao Génova.

Insólito, embora pela positiva, é o caso de Roberto Firmino. Em 2010, o Hoffenheim contratou o avançado aos brasileiros do Tombense por “recomendação” do videojogo “Football Manager”. Agora, Firmino é internacional brasileiro e uma das estrelas do Liverpool, em que forma um trio atacante mortífero com Mo Salah e Sadio Mané.

O regresso de Niculae e a tragédia do Canal da Mancha

Um dos casos mais caricatos dos últimos anos aconteceu com o Sporting, em 2013. O regresso de Marius Niculae ao clube leonino já era conhecido, quando o blogue “Visão de Mercado” alertou que o avançado romeno já tinha jogado por duas equipas naquela época – jogara a Supertaça da Roménia pelo Dínamo de Bucareste, antes de se transferir para o Vaslui, por que marcara 12 golos em 23 jogos.

O regulamento da FIFA estipula que um jogador pode ser registado por um máximo de três clubes durante uma época, mas durante esse mesmo período só pode disputar jogos oficiais por dois clubes. Assim, Niculae, que representara o Sporting entre 2001 e 2005, tendo sido campeão logo na primeira época, não pôde regressar a Alvalade.

Também no campo do insólito, ainda que tingida de tragédia, está a transferência de Emiliano Sala do Nantes para o Cardiff, por 17 milhões de euros. O avançado argentino foi a Nantes despedir-se dos companheiros e, na viagem de regresso para o País de Gales, o avião que o transportava desapareceu de todos os radares, sem deixar rasto.

Após três dias de buscas pelo avançado e pelo piloto, únicos ocupantes do avião, a polícia de Guernsey anunciou o encerramento das buscas e assumiu que a possibilidade de encontrar Sala com vida era “remota”, o que provocou reação de várias estrelas, nas redes sociais, a pedirem que se continuasse a procurar por Sala. Entretanto, foram encontrados dois assentos que, “provavelmente”, pertenciam ao avião em causa.

Agora, a desgraça pode redundar numa polémica batalha judicial. Acontece que o Cardiff pede a devolução dos 17 milhões de euros que pagou por Sala, mas o Nantes recusa-se a abdicar do valor recebido.

Histórias que o mercado conta e que, nacional ou internacionalmente, pelas melhores ou pelas piores razões, ficam na memória dos adeptos.

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