Emissão Renascença | Ouvir Online
A+ / A-

Depois de Guadalajara “é preciso ser mais proactivo na internacionalização de autores portugueses”

03 dez, 2018 - 06:07 • Maria João Costa

Em Guadalajara chegou ontem ao fim a Feira Internacional do Livro. Portugal passou o testemunho à Índia, o próximo país convidado de honra da maior feira do livro da América Latina que teve este ano 819 mil visitantes. Na hora de balanço, a comissária portuguesa aponta que Portugal precisa “ser mais proactivo na internacionalização de autores portugueses”.

A+ / A-

José Saramago dizia que a feira em que mais gostava de participar era a de Guadalajara. Isso mesmo lembrou na sessão de encerramento o primeiro-ministro António Costa. 20 anos depois do Nobel, 40 autores de língua portuguesa mostraram a força viva da literatura em português aos mexicanos. Ao longo de oito dias de feira, em Guadalajara venderam-se obras de autores de língua portuguesa, mais de três mil delas, na livraria do Pavilhão de Portugal.

De acordo com a comissária Manuela Júdice, embora as contas finais não estejam fechadas, além dos mais de 3 mil livros vendidos na livraria situada no coração do pavilhão há que ter em conta também os livros de autores de língua portuguesa que estavam à venda noutros espaços da feira. Manuela Júdice dá mesmo o exemplo de autores como José Luís Peixoto e Nuno Júdice que esgotaram nas editoras onde são publicados.

No topo da lista dos autores mais vendidos estão “José Saramago, Gonçalo M. Tavares, António Lobo Antunes e Eça de Queirós” indica Manuela Júdice. O facto de muitos deles terem participado em sessões também contribuiu que os mexicanos conhecessem melhor e pudessem procurar os seus livros.

No saldo desta feira há a contabilizar também mais de 50 obras que receberam apoio para serem traduzidas e que estiveram á venda na feira. Mas muitos foram também os leitores mexicanos que procuraram títulos escritos em português.

Os cerca de 40 autores que estiveram em Guadalajara, marcaram presença sempre constante no Pavilhão de Portugal cujo teto tinha telas em forma de marcador de livros com autógrafos dos escritores de língua portuguesa. Além das sessões dentro do auditório do pavilhão, houve também sessões de debate e conversa noutras salas da feira, no salão de poesia, ou fora da feira e também em idas a escolas mexicanas.

Juventude Mexicana

Uma das notas que os autores mais referem quando lhes perguntamos balanço sobre a participação na feira, é o facto de ser uma feira cheia de jovens. Na quinta-feira que foi o ponto alto da visita dos estudantes quase não se conseguia caminhar na feira.

Em entrevista à Renascença, João Tordo diz que “quando se chega à feira vê-se milhares e milhares de miúdos com idades entre os 15 e os 18 anos.” Na opinião do autor de “O Bom Inverno”, “é muito engraçado de ver este publico, porque num certo sentido dessacraliza isto que é a literatura”. Tordo refere que este exemplo de Guadalajara em que o Estado mexicano tem um programa para a ida das escolas a esta feira que é a segundo maior do mundo de livros deveria ser replicado. O escritor sugere mesmo que em Portugal “as câmaras municipais deveriam pegar nos alunos e leva-los por exemplo à feira do livro de Lisboa”. No entender do autor isso “deveria acontecer mais”.

Convidados para Guadalajara foram também autores lusófonos, como José Eduardo Agualusa, Mia Couto, Ondjaki e o Prémio Camões de 2018, Germano Almeida que voou de Cabo Verde para participar nesta feira que recebeu este ano 819 mil visitantes. Em entrevista à Renascença o autor de “O Fiel Defunto” diz com graça que “habituado ao tamanho de Cabo Verde” admite que nunca viu “tanta gente junta sobretudo numa feira do livro!”. De acordo com Germano Almeida “a participação portuguesa foi muito boa e está a ser bem aproveitava”, “fala-se de Portugal” conclui Germano Almeida.

E depois de Guadalajara?

Agora é preciso apostar no futuro diz Manuela Júdice. A comissária da representação portuguesa afirma que esta feira de Guadalajara “foi uma porta que se abriu”, sobretudo numa fase também de mudança política no México. “Agora é preciso entrar”, admite Júdice que para isso refere que é preciso “ter uma política do livro” e que Portugal “não deve ficar à espera que apareçam candidaturas.

No último dia de feira, depois de ter recebido o primeiro-ministro com um miniconcerto surpresa de Kátia Guerreiro no pavilhão de Portugal em que a fadista cantou também “Cielito lindo” um tema muito popular mexicano que pôs o publico a cantar, Manuela Júdice é critica e afirma: “É preciso ser mais proactivo na internacionalização dos autores portugueses”.

Moonspell, o sucesso

A presença portuguesa no México fez-se também com outras artes. E se é verdade que o cinema teve pouco sucesso, “talvez por ser fora da feira” admite Manuela Júdice, não menos verdade é o facto de os Moonspell terem sido a aposta ganha na feira. A banda de Fernando Ribeiro, que canta Fernando Pessoa foi a primeira banda de heavy metal a atuar na feira em 32 anos. A praça encheu-se de fãs.

Os Moonspell têm no México, onde atuam desde 1998 uma legião de seguidores. Mas a presença de outros nomes como o fadista Camané, os Dead Combo, os Amor Electro e Capicua também deu frutos. Ficaram apalavrados novos concertos no México

Além dos espetáculos de música, a feira contabilizou ainda uma homenagem ao arquiteto João Luís Carrilho da Graça e uma série de outras conversas na área da ciência. Outra das apostas foram três exposições. Uma delas sobre Almada Negreiros provocou o espanto nos mexicanos que desconheciam o artista e escritor português.

Bogotá versus Guadalajara e a Índia

A última vez em que Portugal esteve como país convidado de uma feira do livro do outro lado do atlântico, foi em Bogotá, na Colômbia. Perante algumas críticas à livraria e ao pavilhão da feira de Guadalajara, em comparação com o pavilhão de Bogotá, o antigo comissário Jerónimo Pizarro descreve: “Tínhamos em Bogotá um pavilhão enorme, gigantesco. Dava para estacionar um avião lá dentro. Este parece um espaço subdividido de um escritório onde poderia trabalhar uma equipa de vinte pessoas”. No entanto, o colombiano, investigador da obra de Fernando Pessoa refere que “não é um problema de Portugal, os países convidados em Guadalajara costumam ter sempre um espaço muito pequeno.”

Mais pequeno poderá ser espaço de Portugal na feira do livro de Guadalajara em 2019, já que o nosso país foi desafiado pela organização no próximo ano a marcar presença na área internacional da feira. Em Guadalajara, o testemunho está passado à India que será o próximo convidado de honra.

Para casa, no regresso muitos são os autores que levam a mala cheia de livros comprados na feira. Contudo, há também quem leve outro tipo de “recuerdos” mexicanos. É o caso de João Tordo que à Renascença conta que lhe foi oferecido por um grupo de estudantes de uma escola que visitou, “um cato mexicano” com a sua cara desenhada, “um farol” a evocar o livro “O Luto de Elias Gro” e porque alguém disse que gostava de abacates, deram-lhe “uma caixa cheia de abacates” que, Tordo diz não saber como irá levar para casa! “Foi uma experiência incrível” conclui João Tordo.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

Destaques V+