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Combate à corrupção é brincar com o fogo, reconhece Lourenço. “Mas não nos vamos queimar”

22 nov, 2018 - 13:18 • Filipe d'Avillez

Portugal e Angola são amigos, e “os amigos querem-se juntos”, disse esta quinta-feira o Presidente de Angola João Lourenço, em conferência de imprensa conjunta com Marcelo Rebelo de Sousa.

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O Presidente da República de Angola diz que não desarma no combate à corrupção no seu país, apesar de reconhecer os riscos inerentes a esta missão.

Já depois dos discursos dos dois chefes de Estado, João Lourenço foi questionado por um jornalista sobre o combate à corrupção e se o seu executivo não estaria a “brincar com o fogo”, e usou a mesma expressão na resposta.

“Vamos continuar a brincar com o fogo, mantendo-o sempre sob controlo. Não nos vamos queimar”, disse.

“Quando decidimos combater a corrupção em Angola tínhamos noção que era preciso muita coragem. Estávamos a mexer no ninho do Marimbondo”, disse, explicando tratar-se de uma espécie de vespa que existe naquele país africano.

“Já começámos a sentir as picadelas, mas isso não nos vai matar. Não vamos recuar. É preciso destruir o ninho do Marimbondo. Quantos marimbondos existem? Não são muitos. Angola tem 28 milhões de habitantes, não há 28 milhões de corruptos”, sublinhou.

Amizade à prova de irritantes

A conferência de imprensa conjunta foi marcada por elogios mútuos, com ambos os chefes de Estado a sublinhar a proximidade entre os povos angolano e português. Marcelo Rebelo de Sousa disse que os dois povos já “votaram muitas vezes estarmos juntos. Votam ao viajarem, ao fixarem-se, ao viverem em conjunto alegrias e tristezas, ao sentirem na mesma língua da escrita e do coração”.

Já João Lourenço estranhou o facto de se ter passado tanto tempo sem visitas oficiais entre os presidentes dos dois países, dizendo que “os amigos querem-se juntos, devem-se visitar mutuamente. A última vez que um Chefe de Estado angolano visitou Portugal foi há nove anos, o que mostra que alguma coisa terá falhado nesta busca permanente de alimentar uma amizade entre dois países.”

Questionado sobre as recentes dificuldades na relação entre os dois Estados lusófonos, incluindo o processo na justiça portuguesa que envolveu o vice-presidente de Angola, na altura, Manuel Vicente, o Presidente João Lourenço disse que nunca gostou desse termo. “O que se passou é que da parte de Portugal havia o incumprimento de um acordo que existia. O que Angola fez foi apenas recordar a um país amigo, de boas relações, da necessidade de respeitar o acordo. Só havia duas saídas, ou denunciar o acordo, ou cumprir. Foi isso que aconteceu.”

Dizendo logo de seguida que “não ficam rancores, antes pelo contrário” e que “A vontade dos povos dos dois países é indomável, única, os povos sempre se quiseram bem, e os povos não mudam. A classe política é que às vezes muda. Mas a classe política tem a obrigação de saber interpretar bem a vontade dos povos, e a vontade dos nossos povos sempre foi de amizade e cooperação.”

João Lourenço optou por não responder a uma pergunta sobre as recentes críticas, ou avisos, da parte da família de José Eduardo dos Santos e a sua filha Isabel dos Santos, que alertam para o perigo de uma “crise política profunda” em Angola.

Ajuda para "acordar" a economia

O chefe de Estado angolano, que falou de improviso, sem discurso escrito, sublinhou ainda na sua intervenção a sua satisfação por celebrar nesta visita 12 acordos de cooperação, em diversas áreas, sublinhando a importância de captar investidores portugueses para Angola, especialmente para outros setores que não o petróleo.

“Não podemos de forma nenhuma deixar de contar com a intervenção de Portugal, dos empresários portugueses, que gostaríamos de ver em força a investir nos mais diversos domínios da nossa economia, e não apenas no petróleo. Gostaríamos de esquecer que o petróleo existe e passar a viver de outras formas de economia. Angola tem grande potencial noutras áreas, que está adormecido. Para levantá-lo do estado de letargia contamos com o contributo dos homens de negócios portugueses”, afirmou.

Na sessão de perguntas e respostas houve ainda tempo para Marcelo Rebelo de Sousa comentar o lado mais difícil da história entre os dois países, nomeadamente a colonização e a escravatura. O Presidente português não fugiu à questão, dizendo que “a história é feita de virtudes e defeitos, assumimos umas e outros, sem complexos. Do mesmo modo que assumimos o papel que tivemos, atravessando oceanos, correndo riscos e sendo plataforma de relação entre culturas, reconhecemos o que houve de errado na nossa história, ou de injusto, como perseguições religiosas ou raciais e escravatura.”

“E assumimos plena responsabilidade por isso, sem ficar pelo mais fácil que é pedir desculpa sem assumir responsabilidade. Eu assumo”, disse.

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