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Quase metade dos diabéticos não sabe que vive com a doença

14 nov, 2018 - 19:49 • André Rodrigues

Pedro Andrade descobriu que era diabético quando se casou. Hoje tem 41 anos. Na altura tinha 27 anos. Andava a dormir pouco e sentia-se cansado, "porque fomos nós que organizámos tudo, e eu tinha que deixar tudo preparado na empresa para depois ir de lua de mel", começa por contar.

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Portugal tem mais de um milhão de doentes com diabetes e mais de três mil crianças sofrem de diabetes tipo 1. Os números foram avançados pela Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, no dia em que se assinala o Dia Mundial da Diabetes.

Em declarações à Renascença, Davide Carvalho reconhece que dois em cada cinco diabéticos desconhecem o diagnóstico, uma tendência preocupante, sobretudo, nos jovens adultos.

“Temos mais de um milhão de doentes com diabetes em Portugal, 45% destes doentes não estão diagnosticados. Isto é particularmente evidente na faixa dos 20 aos 30 anos, porque não vão ao médico. A percentagem de idosos não diagnosticados é menor, mas a prevalência é muito grande: 470 mil pessoas com mais de 65 anos”, refere Davide Carvalho.

Pedro descobriu a diabetes na lua de mel

Pedro Andrade descobriu que era diabético quando se casou. Hoje tem 41 anos. Na altura tinha 27 anos. Andava a dormir pouco e sentia-se cansado, "porque fomos nós que organizámos tudo, e eu tinha que deixar tudo preparado na empresa para depois ir de lua de mel", começa por contar.

Só que o cansaço era a máscara de um problema de saúde inesperado.

A diabetes revelou-se numa crise grave em plena viagem de núpcias. "Ainda por cima, fomos para Cabo Verde e o médico do hotel diagnosticou desidratação. Cheguei a uma altura em que já nem conseguia comer".

A 'lua de mel' resume-se a dois dias fechado no quarto de hotel, até ao regresso de emergência. A mulher, Nathalie, tratou de tudo com a agência de viagens. Pedro tinha uma ambulância à espera em Lisboa.

Mas o voo de regresso foi, literalmente, a aventura de uma vida. "Eu vim quatro horas sempre a ver se ele respirava. Ele estava mesmo muito mal, podia entrar em coma a qualquer momento", revela Nathalie.

Depois da aterragem, Pedro foi levado até ao Hospital de Santa Maria. Foi lá que, depois de uma bateria de exames, viu confirmado o diagnóstico. Diabetes tipo 1. Nathalie suspirou de alívio, "afinal, ninguém morre de diabetes".

Mal sabia que aquela notícia era o início de uma vida que nunca mais seria a mesma. "Quando engravidei, esquecemos a diabetes". Mas quando a doença foi diagnosticada no primeiro filho do casal, "as dúvidas vieram todas de novo, e percebemos que não sabíamos nada".

Pedrinho, como lhe chama a mãe, tem hoje 13 anos. Mais três do que o irmão mais novo.

Diz viver bem com o problema, "porque me habituei, desde pequeno, a ver o meu pai fazer os tratamentos".

Pedro, o pai, nunca escondeu o problema mas reconhece que, por vezes, "não é fácil não sentir um pouco de culpa" pela doença do filho. Até porque receia "que o mais novo também possa ter".

Nathalie prefere não pensar. Prefere agir "como a avestruz que mete a cabeça debaixo da areia. Por um lado, é bom porque não nos assustamos. Por outro, é mau porque não podemos ignorar o problema".

Ter dois diabéticos numa família de quatro é um exercício permanente de adaptação. "É ter deixado de fazer sopa com batata há 14 anos, é olhar para uma bolacha ou para um prato e fazer contas aos hidratos de carbono que podem ser ingeridos, para depois gerir as tomas de insulina".

Nathalie reconhece que normalizou a mudança. Pedro também. Mas reconhece que quebra com frequência uma das regras sagradas da doença: comer a horas certas. "Não é fácil. A vida de comercial reparte-se entre reuniões com clientes e muitas horas na estrada".

E, no limite, "se for necessário, eu tomo a insulina num restaurante, pico-me à mesa", indiferente aos olhares de estranheza dos vizinhos de mesa.

"É a minha maneira de ser. É a minha maneira de lidar com a doença". Com a normalidade possível.

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