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“Sai da tua bolha”: o desafio dos Jesuítas aos jovens católicos

23 out, 2018 - 17:21 • Ângela Roque

Promover a reflexão e o diálogo, mesmo entre quem pensa diferente, é objetivo da iniciativa organizada pelo Ponto SJ e pelo Centro Universitário Padre António Vieira (CUPAV). Oradores representam diferentes realidades da Igreja, vão conversar e responder a perguntas.

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Com o Sínodo dos Bispos, que decorre em Roma, a entrar na reta final de trabalhos, os Jesuítas desafiam os jovens portugueses a conversarem “sem filtros” sobre a Igreja. O encontro “Sai da tua bolha” está marcado para as 21h desta quarta-feira, na fábrica do Braço de Prata, em Lisboa, numa iniciativa conjunta do Ponto SJ e do Centro Universitário Padre António Vieira (CUPAV).

O diretor do CUPAV, padre João Goulão, explica à Renascença que o objetivo é “pôr à conversa” quem não pensa da mesma forma, porque ouvir o que os outros pensam e têm a dizer é cada vez mais uma urgência.

“Não só a Igreja, mas em geral o espaço cultural, necessita de um outro modo de estar que fomente o diálogo, que fomente a saída dos guetos e das tribos, algumas urbanas”, afirma Goulão, reconhecendo que na própria Igreja pensar diferente “pode levar a duas atitudes extremadas: ou fugir e ninguém conversa, ou o ataque feroz”. Por isso, “é preciso promover o diálogo como método de vida, como modo de estar”.

O Sínodo dos Bispos dedicado às questões da juventude foi um pretexto para organizar este encontro, que pode ser útil para todos. “Nós como educadores, preocupados com a Igreja e o mundo de amanhã, claro que queremos fomentar e levar para a frente uma transmissão da fé dialogante, como foi a marca da Igreja em toda a sua história. Só andou para a frente sempre que os vários carismas, as várias correntes teológicas se puderam encontrar e conversar”, diz.

João Goulão admite que o título escolhido para o encontro - “Sai da tua bolha” - é “provocatório”, mas garante que a iniciativa não revela uma preocupação particular em relação à adesão de alguns jovens às tendências ditas mais tradicionalistas dentro da Igreja em Portugal.

“Não necessariamente. É muito importante perceber que em toda a história da Igreja houve sempre diferentes sensibilidades a conviverem juntas, e é disso que é feita a própria essência da Igreja”. Mas, hoje há várias “bolhas”? “Pode haver, a partir do momento em que nos começamos a fechar nelas, sejam mais tradicionalistas ou mais liberais.”

“A questão não é se a nossa sensibilidade vai mais por um lado ou por outro, está na forma como a vivemos”, explica, considerando que “quando estamos muito metidos no nosso contexto, ou na nossa cidade, achamos que o mundo se fecha sobre ela, e acabamos por estar fechados numa bolha. Por isso eu poria aqui a ‘saída da bolha’ a vários níveis: saída da bolha da minha realidade de Igreja, saída da bolha da própria Igreja, saída da bolha da minha cultura”.

Para esta conversa “sem filtros” foram convidados cinco jovens de realidades eclesiais diferentes: Tomás Virtuoso, que participou na reunião pré-sinodal com o Papa, como representante mundial do movimento Equipas Jovens de Nossa Senhora; Maria Correia, do Movimento Católico de Estudantes; Bernardo S. Brochado, da paróquia de S. Nicolau, em Lisboa; Ariana Rodrigues, do movimento ‘Jovem, Levanta-te’, da paróquia da Amora; e Ana Mano Correia, do Corpo Nacional de Escutas. O objetivo é que “possam refletir movimentos grandes, de juventude, nacionais e internacionais”, mas também “os movimentos de jovens” e “o mundo das paróquias”, que possam “trazer à conversa sensibilidades mais tradicionais”.

O encontro tem entrada livre, mas os organizadores pedem que quem estiver interessado em participar os informe através do evento criado para o efeito no Facebook. “Julgo que virá muita gente, mas mais importante que o evento, é o que está por trás dele, a motivação e o que pode gerar. Esta lógica de nos podermos sentar à mesma mesa, conversarmos e sonharmos a Igreja, de percebermos qual é o percurso de fé de cada um, que Igreja é esta que estamos a querer construir, é esse trabalho que me parece interessante. Se este evento ajudar a isso, terá atingido o seu objetivo”, sublinha o responsável do CUPAV.

Jovens querem uma vida mais radical, verdadeira e coerente

Como diretor do Centro Universitário Padre António Vieira, o padre João Goulão contacta com centenas de jovens. “A grande maioria são católicos, fazem parte da Igreja”. Diz que em quase todos encontra “um desejo de radicalidade”, que se pode manifestar de muitas formas. “Alguns é na parte mais ritual, outros mais no estilo de vida”. Mas, “o que há do ponto de vista da juventude é um desejo de verdade, de simplicidade, de radicalidade, de uma vida coerente”, o que considera resulta já do exemplo do Papa Francisco. “O seu apelo à pobreza, à simplicidade, tem sido uma marca muito grande naquilo que me parece que a maioria dos jovens procura na Igreja”.

Relativamente ao Sínodo dos Bispos, João Goulão não espera “grandes metodologias ou grandes estratégias, porque isso é próprio das empresas, não é próprio da Igreja”. Mas tem um desejo – “que todos os que fazemos parte da Igreja, possamos ser ágeis no sentido de reconhecer as pessoas, neste caso os jovens, onde estão do ponto de vista existencial, e a partir daí começar a construir caminhos”.

“A arte de acompanhar, a arte de discernir, de estar à escuta e acompanhar, de perceber onde é que cada um se encontra e como é que Deus vai comunicando com cada um, é um trabalho muito exigente, e que leva tempo”, afirma ainda. Mas, espera que todos na Igreja “vamos ganhando esta consciência de nos acompanharmos uns aos outros, sermos uma espécie de cuidadores, isto é, de não partirmos de ideias pré-feitas nas nossas cabeças, mas da realidade. Que sejamos capazes de agarrar na realidade e com ela construir a própria Igreja, e não levar uma forma e dizer 'ou é assim, ou então temos pena'. É o que eu espero do Sínodo”.

Nesse sentido, João Goulão acredita que o encontro “Sai da tua bolha” pode ajudar. “Isto tem de acontecer cada vez mais. Temos de nos habituar a pensar as coisas em conjunto com os diferentes de nós, seja em sensibilidade, seja porque vivem noutro sítio ou porque falam de outra maneira. Se isto acontecer nas nossas comunidades locais, então já estaremos a construir aquilo que eu espero seja o fruto do Sínodo, que é exatamente provocar a conversa a partir da realidade”.

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