São centenas de pessoas, de todos os caminhos da vida, de diversas religiões. Passam turnos num espaço modesto na Rua da Mãe de Água, em Lisboa, de frente para a maior clínica de aborto de Lisboa, a observar mulheres que entram e saem pesarosas e homens que esperam à porta. E rezam.
Estamos quase a meio dos primeiros “40 dias de Oração pela Vida” que se organizam em Portugal. A iniciativa começou nos Estados Unidos, onde já deu muitos frutos. Paula Pimentel, uma das organizadoras, explica o objectivo: “São 40 dias em que pessoas de várias religiões, que tenham como objectivo único defender a vida e defender as mulheres que sofrem com esta situação, se juntam para rezar, para se juntarem ao sofrimento destas mães e tornarem-se mais próximas das pessoas.”
Aqui não há lugar para cartazes, palavras de ordem ou slogans. A esmagadora maioria dos participantes não tem qualquer contacto directo com os utentes nem os funcionários da clínica. Alguns preferem rezar dentro da pequena casa que serve de sede à associação Mãos Erguidas, que aconselha as grávidas que, à última da hora, mudam de opinião.
“Já passaram aqui centenas de pessoas e todas têm estilos diferentes. Há pessoas que nos disseram logo que não querem rezar na rua. A casa está sempre de porta aberta e vê-se lá para dentro, mas há quem não goste de rezar nas escadas cá fora. Outros gostam de rezar cá fora, mais perto possível da clínica. Deixamos ao critério de cada um”, explica Paula Pimentel.
A oração mais frequente é o terço. Há quem goste de cantar. Mas ninguém deve sentir-se excluído. Há uma muçulmana e um evangélico que têm participado e que rezam à sua maneira. “A oração faz duas coisas, por um lado torna-nos melhores e por outro que consigamos aproximar-nos mais do sofrimento das pessoas e não as julgar nem criticar. Se não tivermos este processo podemos cair na tentação de julgar as pessoas e não é isso que queremos, queremos apoiá-las e estarmos próximos delas.”
Ajuda materialEm simultâneo com a oração estão presentes as voluntárias das Mãos Erguidas, pessoas com maior sensibilidade para abordagem directa que procuram, sempre de forma amigável, falar com quem entra e sai da clínica. Há muito apoio moral, mas isso não basta: “não é só estar aqui a dizer às grávidas para não abortarem, temos de nos preocupar com os problemas delas e dar apoio. Vão a um médico nosso amigo que as vê a custo zero do princípio ao fim da gravidez. Ajuda-se com enxovais, fraldas, processos de legalização, porque há pessoas que vêm aqui em situações muito complicadas.”
Em tempo de crise a tentação de resolver gravidezes inesperadas recorrendo ao aborto pode ser grande, mas é um erro, considera: “As pessoas pensam que vêm aqui e depois de abortarem voltam a ser quem eram antes, porque já resolveram o problema, tiraram aquilo que as incomodava. Mas uma mulher, depois de engravidar nunca mais volta a ser a mesma, quer tenha um bebé, porque nos tornamos mães de um filho, quer não deixemos a criança nascer. Embora venha aqui e aparentemente possa sair com alívio, a angústia vai depois ser muito maior.”
Paula Pimentel não duvida que a oração está a dar frutos, que Deus move o coração das pessoas. Por respeito à privacidade das pessoas evita falar de casos concretos, mas algumas das histórias mais tocantes são publicadas diariamente no site do evento. “Mesmo que nenhuma mulher desistisse de abortar, nem nenhum profissional desistisse do seu trabalho, já teria valido a pena porque a oração é um fim em si mesmo, não precisamos que tenha nenhum efeito visível. Mas a verdade é que Nosso Senhor tem sido muito sensível e estamos muito agradecidos por isso e têm acontecido coisas muito boas.”
Com mais 21 dias de oração pela frente a necessidade mais premente é de voluntários que garantam a presença de alguém sempre, entre as 08h e as 22h. Até agora não houve falhas, mas os organizadores estão sempre à procura de mais pessoas para ajudar: “Há muito mais gente do que pensamos que gosta de rezar e pessoas que gostariam de rezar e já pensaram em sair de si mesmos para rezar por alguém e não sabem como, aqui há espaço para todos e podem vir ter connosco.
Se se quiserem inscrever pela internet podem, se quiserem só aparecer também podem.”