Quando se fala em meditação, a maioria pensará em Budismo ou Hinduísmo, religiões que popularizaram esta prática no Ocidente. Mas a meditação também existe no Cristianismo e tem raízes que remontam aos ensinamentos de Jesus Cristo.
“Quando vemos os Seus ensinamentos nos Evangelhos percebemos que é um professor da contemplação. Não nos trouxe regras para a oração, disse-nos que quando rezamos devemos entrar no nosso quarto interior, fechar a porta e rezar ao nosso pai que está no segredo do nosso coração”, diz o padre Laurence Freeman, coordenador da Comunidade Mundial de Meditação Cristã (WCCM).
“Diz-nos para não usar muitas palavras quando rezamos, mas confiar que Deus conhece as nossas necessidades antes sequer de pedirmos. Todos os elementos dos ensinamentos de Jesus sobre a oração são contemplativos”, continua.
Em Portugal para proferir duas conferências e dirigir um retiro para o ramo português da WCCM, este monge beneditino falou à
Renascença dos benefícios e das dificuldades da meditação e do seu lugar na tradição cristã.
Oração do coração “A meditação é uma sabedoria espiritual universal. Encontramo-la em todas as grandes tradições religiosas da família humana, encontramo-la no coração das grandes tradições religiosas. Está presente no Cristianismo, mas por várias razões, históricas e culturais, foi marginalizada”, explica.
Este fenómeno deu-se de forma particular no Cristianismo ocidental, que se tornou exageradamente mental, considera.
“Claro que a oração mental é perfeitamente válida, mas há também outra forma de oração: a oração do coração. E o coração é um símbolo da totalidade do nosso ser. É aqui que a meditação encontra o seu sentido”, defende Laurence Freeman.
A oração meditada é feita com todo o corpo e não só com a mente, explica: “O bem-estar do ser humano resume-se a isto, a experienciar Deus com todo o nosso ser, cada aspecto do nosso ser ganha vida com esse conhecimento de Deus. Mas somos muito fracos no que toca à espiritualidade do corpo. É uma das razões por que temos dificuldade em transmitir a nossa espiritualidade a um mundo secularizado.”
A fé em Cristo e a centralidade, por exemplo, da Eucaristia, tornam a meditação cristã inevitavelmente diferente da meditação secular ou budista, por exemplo. Mas há semelhanças, nomeadamente no que diz respeito aos desafios e às dificuldades.
“Todos experimentamos distracções, temos dificuldade em concentrar-nos, a disciplina custa. A meditação não é um comprimido que se toma, enquanto exercício espiritual é uma parte da nossa vida. Leva tempo, não se pode forçar. Requer tempo e perseverança. Nesse sentido, a meditação é campo de diálogo entre todas as religiões e culturas”, confirma o monge beneditino.
Atire-se de cabeça
Para quem está interessado em iniciar a prática da meditação, o coordenador da WCCM tem alguns conselhos mas, acima de tudo, diz que se deve evitar perder tempo: “Aprenderá mais pela prática do que pelo estudo ou a leitura. Depois, tente ligar-se a um grupo ou a uma comunidade, porque isso ajuda-o a fortalecer o seu compromisso.”
E seja livre, nos progressos e nos recuos, pede o monge: “Não avalie o seu progresso, este é um dos poucos aspectos da nossa vida em que não temos de ser avaliados ou julgados.”
O padre Laurence Freeman profere hoje uma conferência sobre “A espiritualidade celta e a sua importância no desenvolvimento da contemplação”, no Centro Galego de Lisboa, pelas 15h00.
A WCCM é uma comunidade ecuménica fundada em 1991, presente em mais de 100 países. Existe uma delegação em Portugal (
http://www.meditacaocrista.com/) que organiza actividades frequentes e organiza encontros de meditação.
A coordenadora, Maria Cristina Sousa, fala dos benefícios de meditar acompanhada: “Fazer parte da comunidade é já em si um dom inestimável. Há muita coesão pelo facto de estarmos no mesmo caminho espiritual, um caminho muito profundo de silêncio e de quietude. É uma tentativa de ir à procura do eu profundo, onde está Deus. Fazer isto em conjunto com outras pessoas dá uma grande estabilidade e uma grande força”, revela.