As acções do Presidente da Bolívia, Evo Morales, na recepção ao Papa Francisco, na quarta-feira, estão a causar alguma polémica e mal-estar na igreja boliviana, nomeadamente a oferta de um crucifixo colocado numa foice e martelo.
O crucifixo é uma réplica da cruz usada pelo padre Luis Espinal, um missionário espanhol que foi morto no Chile por paramilitares em 1980.
Quando Evo Morales foi eleito Presidente da Bolívia, uma das primeiras coisas que fez foi tirar o crucifixo do palácio presidencial.
Dois livros, temas diferentes O Papa e Evo Morales também trocaram entre si livros. Francisco ofereceu ao Presidente boliviano um exemplar da sua encíclica sobre ecologia, Laudato Si, publicada recentemente. A ecologia é um tema caro para os sul-americanos e Francisco tem falado diversas vezes sobre o assunto durante a sua visita.
Já Evo Morales ofereceu ao líder da Igreja Católica um livro sobre a disputa territorial entre o seu país e o Chile. Depois de uma guerra entre os dois países, em 1884 o Chile anexou a orla costeira da Bolívia, pondo fim ao seu acesso ao Oceano Pacífico. Morales referiu-se ainda a esse facto no seu discurso de boas-vindas ao Papa, dizendo que Francisco chegava a um país cujo acesso ao mar tinha sido "mutilado através de uma invasão". No momento em que Morales ofereceu o livro ao Papa ouviram-se assobios na catedral de La Paz, onde se tinham reunidos muitos que aguardavam a chegada do Papa à cidade.
Por sua vez, Francisco aludiu à importância de os países desenvolverem as suas relações diplomáticas para evitar conflitos.
Católico e politeísta Apesar das suas frequentes críticas à Igreja Católica, tendo chegado a ameaçar acabar com ela na Bolívia, Evo Morales assume-se como católico, tal como fazem 80% dos seus conterrâneos.
Mas o seu catolicismo convive com a prática de religiões indígenas e politeístas. Quando foi eleito, para além de ter acabado com os símbolos cristãos no palácio presidencial, substituiu os ritos católicos por outros dedicados à Pachamama (ou "mãe terra").
Desde que o Papa Francisco foi eleito, contudo, o seu tom mudou e, em vez de criticar a Igreja, passou a tentar usá-la para justificar a sua "revolução social".
Pouco antes da visita de Francisco, Morales declarou: "A verdade é que o Papa e eu coincidimos muito em termos de visão política, económica e social". No seu discurso a Francisco, afirmou: "No processo de mudança, quem trai um pobre trai o Papa Francisco".
O aproveitamento político de Morales foi ao ponto de este ter ouvido o hino nacional de punho erguido, ao lado de Francisco.
Coca para beber e para mascar No meio de tudo isto, o facto de o Papa ter recebido, à chegada ao aeroporto, uma bolsa tradicional com folhas de coca para mascar parece até ser um dado normal. É que as folhas de coca são um conhecido antídoto para evitar os efeitos da tontura e da indisposição causados pela falta de oxigénio a quatro mil metros de altitude.
O Papa não foi visto a mascar, mas no próprio avião papal foi servido um chá de coca a toda a comitiva, incluindo jornalistas, e no palácio presidencial o gesto repetiu-se.
Esta foi apenas a segunda vez que Francisco esteve em La Paz em toda a sua vida. O Papa, que tem problemas pulmonares, ignorou avisos dos seus médicos para ir à cidade, mas não pernoitou, tendo voado para Santa Cruz de la Sierra, que se situa ao nível do mar, poucas horas depois de aterrar na capital. Da primeira vez que tinha ido à cidade, em 1968, tinha-se sentido tão mal que partiu de imediato também.
[Notícia actualizada às 17h33]A Renascença V+ transmite em directo os principais momentos da visita do Papa à América Latina, até domingo. Veja o programa das transmissões