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Francisco é "o grande reformador", entre o "Santo do deserto" e o "grande político"

13 mar, 2015 • Aura Miguel

São 24 meses de pontificado. O biógrafo Austen Ivereigh diz-se impressionado com a sua extraordinária capacidade de liderança e coragem. "Como muitos na Argentina disseram 'é uma combinação extraordinária de um Santo do deserto e um grande político'".

Francisco é "o grande reformador", entre o "Santo do deserto" e o "grande político"
Dois anos depois da eleição do Papa Francisco há alterações visíveis na Igreja. A análise é do jornalista Austen Ivereigh, que escreveu "O Grande Reformador", uma biografia do Papa.

Em entrevista à Renascença, diz que as "mudanças enormes" estão relacionadas com a forma como a Igreja é vista pelo mundo.

Pode falar-se numa reforma de fundo levada a cabo por Francisco?
É uma reforma que ele quer que a Igreja adopte: uma atitude muito mais missionária, isto é, que a Igreja esteja menos preocupada em conservar e defender a religião contra os inimigos. Em vez dessa atitude, talvez defensiva, ele quer mais uma atitude de encontrar pessoas que estejam longe da Igreja, longe das paróquias. É uma mudança, eu diria, de enfoque. O pontificado do Francisco é basicamente diferente. Não é uma mudança de doutrina, de ensinamento. Ele usa uma grande mudança de energia de recursos numa direcção bastante diferente das últimas duas décadas.

E como é que se poderia definir essa direcção?
Diria na misericórdia de Deus. As pessoas estão a ver a cara do Deus misericordioso, de amor e de enfoque também sobre os pobres, sobre o sofrimento.

Mas essa faceta também existia nos pontificados anteriores, de certo modo…
São as duas facetas da Igreja que sempre têm existido, mas acho que o mundo fora da Igreja não via isso nos últimos anos. E esse foi o discernimento do Francisco.

A popularidade do Papa Francisco atinge sectores que não costumam frequentar a Igreja. Não acha que nestes dois anos também há alguma ambiguidade por causa desta popularidade de Francisco?
Sem dúvida, porque muitos estão a projectar os seus desejos no Papa e há muitas pessoas que interpretam mal esta mudança…alguns liberais e também alguns conservadores. Francisco não está a procurar mudar, modernizar, diluir o ensinamento da Igreja. É difícil o mundo fora da igreja entender. Isto foi muito evidente no final do seu primeiro ano quando a revista "Time" o "canonizou", elegendo-o personagem do ano. 

O que mais o impressiona em Francisco?
Duas coisas principalmente. A sua extraordinária capacidade de liderança, presente deste o primeiro momento, que está relacionada com a sua capacidade de entender como se pode reunir uma Igreja dividida. A segunda coisa, que também me impressionou muito, foi a sua extraordinária coragem que vinha de umas experiências espirituais muito fortes e a sua capacidade de viver na tensão.

O que estamos a ver agora no pontificado é uma habilidade de suportar um nível de tensão, de contradição, e acho que isto é uma das grandes capacidades dos grandes líderes. Como muitos na Argentina me disseram, "é uma combinação extraordinária de um Santo do deserto e um grande político". E estas coisas normalmente não se encontram juntas na mesma pessoa.