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Péter Erdő

"Um dos sinais da decadência do nosso tempo é a obsessão pelo bem-estar"

11 mar, 2015 • Aura Miguel

Presidente do Conselho das Conferências Episcopais da Europa diz, em entrevista à Renascença, que a sociedade actual baseia-se numa "ilusão": "só interessa o bem-estar momentâneo".

"Um dos sinais da decadência do nosso tempo é a obsessão pelo bem-estar"
O futuro da Europa e da Igreja passa pela família. São vários os sinais de preocupação, mas há também realidades positivas que o próximo sínodo da família vai analisar. É o que defende o cardeal húngaro Péter Erdő, presidente do Conselho das Conferências Episcopais da Europa.

"Um dos sinais da decadência do nosso tempo é a obsessão pelo bem-estar. Uma ilusão que distrai do essencial e preocupa a Igreja, uma vez que o culto do bem-estar e do sentir-se bem no momento como objectivo principal da vida significa que não são importantes nem o contexto social e institucional, nem o passado, nem o futuro. Só interessa o bem-estar momentâneo", diz à Renascença o arcebispo de Budapeste, relator-geral do próximo sínodo dos bispos.

"Esta é uma ilusão porque a nossa vida está enraizada no contexto da história e da sociedade e naturalmente estamos convencidos que também está enraizada na relação entre Homem e Deus", afirma o cardeal, que esteve em Portugal para participar na homenagem, em Fátima, ao padre Luís Kondor, símbolo da ligação dos católicos da Hungria ao santuário português.

"Devemos dar sinais e oferecer algo que dê sentido à vida. Penso que temos de ir ao essencial. É preciso falar de Jesus Cristo", diz o cardeal húngaro.

"Se eu estou convencido de todas estas coisas e se as posso dizer a mim próprio – porque eu sou também um homem de hoje – então será compreensível também para os outros. Talvez não o aceitem, mas será compreensível. Por isso, é preciso partir assim, de um radicalismo do essencial", diz.

"Há ainda outra coisa", acrescenta. "A centralidade da pessoa de Jesus Cristo. Jesus Cristo não é uma figura mitológica, não é uma tese filosófica; é uma pessoa verdadeira que é preciso conhecer com paixão para perceber a sua mensagem."

Preocupação e "ilhas" de esperança
O actual relator geral do sínodo dos bispos sobre a família, que se realizará em Outubro, sublinha alguns fenómenos que considera preocupantes.

"Há fenómenos novos relativamente ao que se passava há 40 anos. Sobretudo, o individualismo de que falava o Santo Padre perante o Conselho da Europa em Estrasburgo. Este individualismo significa e implica uma alienação do indivíduo face às instituições sociais. O matrimónio e a família são instituições. O resultado é que a proporção dos casais que vivem casados, qualquer que seja o tipo de casamento, religioso ou civil, está em queda contínua. Preferem coabitar. Este fenómeno parece ser global", reflecte.

E prossegue: "Porque é que pessoas fogem das instituições? Porque não querem comprometer-se para toda a vida. Há um culto da mobilidade e da força de trabalho que parece um valor para a economia, mas é uma catástrofe para a pessoa e para a família e que empurra as pessoas para o isolamento."

Mas também há sinais positivos relativos à família, aponta. O cardeal considera urgente "reforçar a consciência, através de ilhas de autênticas comunidades humanas". "E este é o outro grande sinal que vemos em quase todas as respostas das conferências episcopais, que chegam de quase todas as paróquias: comunidades compostas por boas famílias, por famílias que se encontram e se ajudam até na transmissão da fé e também ao nível de problemas humanos como o desemprego, a doença, etc., e estas famílias também preparam, por exemplo, casais para o matrimónio, ajudam casais em crise e em muitos países assumem tarefas nas próprias paróquias. São, por isso, um sinal dos tempos. Por isso, a família não é só problema, é também solução."

"Na Hungria, a situação demográfica é catastrófica. Cada ano perdemos dezenas de milhares de habitantes e, no entanto, neste país nos últimos 20 anos apareceram nas paróquias, sem organização superior ou dos bispos, imensas comunidades de famílias, porque as pessoas querem, porque o Espírito Santo actua e as coisas florescem. Por isso, há milagres na História. Nós, que vimos como o mundo mudou em 89/90, acreditamos nos milagres".

A entrevista ao cardeal Péter Erdő poderá ser ouvida na íntegra na Renascença, depois das 23h00