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Jurista diz que bispo não tinha de informar PJ no caso de abusos em Santarém

06 dez, 2013 • Filipe d’Avillez

Directrizes da Igreja em Portugal falam de colaboração, mas não esclarece em que ponto do processo a diocese deve informar as autoridades.  Diocese de  iniciou um "processo canónico" de averiguações a propósito de suspeitas sobre o pároco das paróquias de Golegã, Azinhaga e Pombalinho.

A diocese de Santarém não informou as autoridades civis quando soube das suspeitas que recaíam sobre um sacerdote, acusado de abusar de uma menor. Em vez disso o bispo terá suspendido o padre enquanto se abriu um processo canónico, que ainda está a decorrer.
 
A Polícia Judiciária apenas iniciou a sua investigação a partir do momento em que a diocese emitiu um comunicado, dando conta das suspeitas e do processo em curso.

Tratando-se de um crime público, há quem considere que qualquer pessoa está obrigada a fazer de imediato essa denúncia, mas o jurista Paulo Saragoça da Matta, a questão não é tão clara e o bispo poderá ter razão na forma como procedeu: “Embora a regra geral seja, em relação a crimes públicos, todas as pessoas tenham o dever de o denunciar às autoridades, atendendo à pessoa da Igreja, a regra não pode ser lida de forma tão linear.”

“Estamos a falar de uma entidade que goza de personalidade jurídica internacional, a Santa Sé, que tem poderes disciplinares e investigatórios em relação aos membros do clero. Por isso entendo que a regra da obrigatoriedade de denúncia deve ser entendida com alguma cautela, porque a Igreja, antes de fazer a denúncia, terá todo o direito, na minha opinião, de fazer ela própria uma investigação interna, para a confirmação desses indícios e dessas suspeitas da alegada prática de qualquer crime, ainda que público”, esclarece.

A nível das regras internas da Igreja também não se pode dizer que estas tenham sido desrespeitadas. As directrizes adoptadas pela Conferência Episcopal em Abril de 2012 são vagas, falando apenas na colaboração, mas sem estipular prazos ou obrigações.

“Ao serviço da humanidade, sem procurar servir-se a si mesma, cada pessoa jurídica canónica cooperará com a sociedade e com as respectivas autoridades civis; tomará em atenção todas as indicações que lhe cheguem e responderá com transparência e prontidão às autoridades competentes em qualquer situação relacionada com abuso de menores, na salvaguarda dos direitos das pessoas, incluindo o seu bom nome e o princípio da presunção de inocência”, lê-se.

As mesmas directrizes ordenam a abertura de uma avaliação preliminar, sempre que surgem suspeitas, que servirá para averiguar a credibiliade dos factos. Só se houver indícios credíveis de ilícito é que será aberto um processo canónico. O vigário-geral da diocese de Santarém, padre Aníbal Manuel Vieira, confirma que este processo ainda está em fase de avaliação preliminar, o que justifica não se ter informado logo a Polícia Judiciária: "Estamos a seguir rumores, não temos dados objectivos. Para envolver a Polícia Judiciária precisaríamos de mais elementos. Há aqui um entendimento relativo, a nossa disponibilidade toda para colaborar, mas também não podemos antecipar-nos aos dados que temos."

Contudo, para o jurista e professor de direito Paulo Saragoça da Matta, as dúvidas terminam precisamente a partir do momento em que a diocese conclui que as acusações são credíveis: “A partir do momento em que a própria investigação interna permite detectar a existência de indícios da prática de um ilícito criminal, há a obrigação da denúncia às autoridades judiciárias e eventualmente de carrear para esse mesmo processo os elementos probatórios que tenha obtido nessa investigação”.

O padre Aníbal confirma ainda que o sacerdote em questão está "liberto de todos os seus encargos", o que contribui para "podermos conhecer todos os contornos dos problemas", explica.

[Notícia actualizada às 14h08]