Soares dos Santos
"Estamos a pedir a incompetentes para gerirem empresas públicas"
09 nov, 2011
Patrão do Pingo Doce critica nivelamento do salário dos gestores públicos ao do Presidente da República. "Eu não posso compreender como é que um tipo está para ser presidente da Carris por cinco mil euros por mês", diz.
O presidente do grupo Jerónimo Martins, Alexandre Soares dos Santos, considera que existe um convite à mediocridade nas empresas públicas através do nivelamento do salário dos gestores pelo vencimento do Presidente da República.
“Eu não posso compreender como é que um tipo está para ser presidente da Carris por cinco mil euros por mês. Estamos a pedir aos incompetentes que vão para lá. Ou então não há lugares para mais ninguém e depois aceitam cinco mil euros, mas depois criam-se todos os outros sistemas famosos em Portugal”, afirmou ontem à noite Alexandre Soares dos Santos, durante uma iniciativa da Associação Portuguesa de Gestão e Engenharia Industrial (APGEI), no Porto.
“Eu não percebo estas decisões de que se tem que ganhar menos do que o Presidente da República. O Presidente da República não faz nada, enquanto o tipo da Carris tem responsabilidades e, portanto, ele deve ganhar em função de objectivos bem claros. Senão, o que é que dá? Está-se nas tintas, desculpem-me a expressão. E a dívida vai aumentando e os autocarros vão-se estragando, etc, etc. Ou um presidente de uma Caixa Geral de Depósitos a ganhar cinco mil euros? É um convite à mediocridade”, sustentou ainda durante a sua intervenção, que teve o mote "A Crise Portuguesa: Lições para a nossa Sociedade".
O problema das elites
Soares dos Santos referiu também que Portugal "tem défice de elites". "E as que temos têm défice de responsabilidade e de consciência da sua missão."
“E porquê? Por uma questão essencial: a independência. Que é condição ‘sine qua non’ para se exercer a responsabilidade. As elites têm que ser responsáveis e considero que uma das principais ameaças ao nosso desenvolvimento é que faltam a Portugal políticos, empresários, intelectuais, sindicalistas verdadeiramente independentes”, criticou.
Afirmando ser "um cidadão tremendamente preocupado com o país", o presidente da Jerónimo Martins, dona da cadeia de supermercados Pingo Doce, criticou "a excessiva proximidade entre o poder político e económico, que remete muitas das forças vivas ao silêncio e impede de se unirem na defesa de causas comuns".
Apatia da sociedade civil
Para o empresário, "a situação terrivelmente dolorosa que se vive é o corolário de muitos erros e da apatia por parte da sociedade civil em geral e das elites em particular", considerando que estas "têm uma responsabilidade acrescida de contribuir para o bem comum, que é a única forma de devolver à sociedade os benefícios que retiram do poder que as sociedades lhes reconhecem, porque vêem mais longe e melhor".
No jantar-debate que reuniu mais de 200 empresários, Alexandre Soares dos Santos disse ainda que "falta capacidade de unir esforços à procura de soluções" e que "na raiz [disso] está o medo de retaliação, de perder concursos, um medo que precisa de ser expurgado".
Em relação ao poder político, o empresário defendeu que "o Parlamento tem que ser responsável, porque é o melhor meio para assegurar o controlo da acção governativa".
"A negligência dos sucessivos governos só foi possível, porque o Parlamento não cumpriu a sua função", rematou, considerando que "acompanhar a acção dos deputados é desmoralizante, pela superficialidade do conhecimento, pelo desrespeito entre uns e outros e pelo Parlamento".