30 out, 2013 • André Rodrigues
No dia em que o vice primeiro-ministro, Paulo Portas, dá a conhecer ao país as linhas essenciais da reforma do Estado, a Renascença revisita o relatório encomendado pelo Governo ao Fundo Monetário Internacional (FMI), cujas conclusões foram publicadas no início do ano e depois revistas em Julho.
Função pública, pensionistas, educação, saúde e forças de segurança são os mais visados pela nova onda de austeridade. O Fundo apela ao consenso para que a reforma seja bem sucedida.
A avaliação do FMI não deixa margem para para dúvidas: o Estado português é grande, ineficiente e oferece regalias de duvidosa fundamentação. A solução? “Reformas inteligentes” que passam por cortes de 20% nas pensões dos funcionários públicos, emagrecimento na educação, saúde e forças de segurança e poupança nos salários da função pública.
E é aqui que o Fundo Monetário prevê a maior poupança, cerca de três mil milhões de euros, sugerindo a anulação de uma eventual transitoriedade da medida. Pode ler-se que “para evitar a natureza temporária de medidas tomadas no passado (redução salarial de 5% introduzida em 2011 e suspensão do pagamento do 14.º mês), começando em 2014, deveria ser introduzido um corte permanente nos salários base de forma transversal que visaria obter a mesma poupança gerada pelos cortes salariais do Orçamento de 2013”.
No âmbito das pensões, o FMI aponta um corte de 10% a todas as prestações, estimando uma poupança de dois mil e 300 milhões de euros. “Contudo, este enfoque não resolve problemas de equidade e de incentivos errados do actual sistema de pensões”, adverte o FMI que, considerando que “está previsto um aumento nos gastos com pensões até 2020”, admite “medidas adicionais na próxima década”. A saber: “incorporar um corte fixo de 15% para todas as pensões acima da mínima”, com uma poupança estimada de 1.500 milhões de euros.
Fazer mais com menos
Na educação, o FMI defende que “o desafio principal do sistema educativo português é conseguir resultados com menores custos”, fazer mais com menos.
Um dos caminhos é a redução de “14 mil professores e funcionários administrativos” que “poderia gerar poupanças adicionais em salários de 300 milhões de euros”, o correspondente a 0,2% do Produto Interno Bruto (PIB).
A reestruturação no sector da educação prevê ainda o regime de mobilidade especial para 30 a 50 mil docentes e o despedimento, passados dois anos, dos que sejam considerados excedentários.
Há também aumentos das propinas para o ensino superior entre as propostas do FMI, que considera “razoável que a educação pública superior contribua para os ajustamentos das propinas, o que poderia ajudar a alcançar significativas poupanças orçamentais”. Mas sem esquecer a questão do acesso dos alunos mais carenciados ao ensino superior. O FMI conclui que “a recuperação dos custos não deve ser conseguida à custa do acesso ao ensino superior e pode necessitar de apoio aos estudantes com baixos recursos”.
Regalias injustificadas
Médicos, militares e forças de segurança também não escapam ao exame. O Fundo conclui que são classes profissionais com regalias injustificadas, “que em última análise são um obstáculo ao crescimento”.
No caso dos médicos, “a compensação por horas extraordinárias tem sido usada de modo aberto para aumentar os salários”, por isso a proposta-chave avançada no relatório passa pela limitação do “recurso rotineiro a horas extraordinárias que impulsiona as remunerações actuais”.
Já nas forças de segurança e militares, que representam cerca de 17% da função pública, “as despesas com estas funções estão acima da média europeia, em grande medida devido ao número de forças activas e não por conta de vencimentos excessivos”. E conclui o FMI: “o emprego em excesso é uma preocupação não apenas para as forças no activo mas também para os efectivos em reserva, devido ao seu impacto no sistema de pensões”.
Consenso e sustentabilidade
A árdua tarefa de reduzir quatro mil milhões na despesa pública exige que as dificuldades sejam encaradas “aberta e francamente”. Entende o FMI que essa “é a melhor forma de alargar o consenso social”.
O relatório reconhece que “de entre os vários tipos de corte na despesa, a melhor opção pode muitas vezes não ser alcançável politicamente”. Lembra ainda que a redução da despesa pública, apesar de ser “claramente necessária”, “não pode pôr em causa a coesão social”. E remata, sublinhando que o consenso e a confiança “podem permitir ao Estado suportar a implementação das reformas e fazer com que os efeitos positivos sejam colhidos mais cedo”.