O Imposto Municipal Sobre Imóveis (IMI) tem sido comparado a uma bomba ao retardador. Para milhares de portugueses, isto é mais do que uma metáfora: representa menos dinheiro no orçamento familiar e mais ginástica financeira.
A fazer contas à vida anda Aurélio José, morador no concelho de Loures, nos subúrbios de Lisboa. De um dia para o outro, a sua casa, com 37 anos, passou a valer mais 300%, segundo a carta que recebeu das Finanças.
Este é um dos mais de cinco milhões de imóveis vendidos antes de 2004 que estão a ser alvo de um processo de reavaliação, que deverá estar concluído até ao final do ano e que se vai traduzir num aumento generalizado do IMI e contribuir com mais euros para os cofres estatais.
Ao amargo e enorme "cocktail" de medidas de austeridade anunciadas pelo Governo, Aurélio José e sua mulher, que se encontra de baixa, vão ter que adicionar uma dose extra de IMI. "Isto vai ser bastante gravoso", desabafa o reformado.
Em 2012 pagou 74 euros de IMI, mas com a reavaliação da casa vai desembolsar 149 euros em 2013, valor que pode chegar aos 214 euros em 2014. Contas feitas, pode representar um agravamento final de 186% e o equivalente a mais de uma prestação mensal do empréstimo contraído para a compra da habitação.
Quem também já sabe que vai pagar mais de IMI é João Seixas. Mas neste caso há um efeito multiplicador, porque é proprietário de vários imóveis, que arrenda, no concelho de Loures.
Este senhorio dá o exemplo de três casas que estavam avaliadas entre 8 mil e 10 mil euros cada e que passaram a valer entre 43 mil e 46 mil euros. Estima que por cada um destes fogos vá pagar "cerca de 200 euros" de IMI.
"Isto não se aguenta" e "há certos fogos em que o valor da renda não chega para pagar ao Estado”, afirma João Seixas, recordando outros custos, como o condomínio, os seguros ou obras de recuperação, além dos inquilinos incumpridores.
"Não temos mais por onde cortar”
Nesta viagem pelo Portugal do IMI, a próxima paragem é o concelho de Vila Franca de Xira. É lá que mora Susana, com o marido e o filho de 21 meses.
Terminado o período de isenção, Susana pagou IMI pela primeira vez em 2012. O orçamento anual da família perdeu um total de 389,84 euros, o equivalente a uma prestação ao banco ou a cerca de duas mensalidades do infantário.
"Teve mesmo muito [impacto]. Tenho um filho com 21 meses. Antigamente éramos só dois, o impacto não era tão grande, tínhamos férias. Agora, com um filho, temos de pagar o infantário e, agora, o IMI. Já não podemos fazer a vida que fazíamos antes. Antigamente conseguíamos também fazer um pé-de-meia e agora isso não é possível."
A juntar a esta conta de subtrair há outra parcela: o marido de Susana, como trabalha para o Estado, perdeu os subsídios de férias e de Natal em 2012 e no próximo ano também vai sofrer novos cortes.
A Norte, no concelho de Vila Nova de Gaia, Sérgio Costa desembolsou praticamente o salário de um mês para pagar o IMI de 2012, no valor de 438 euros. "É uma roubalheira. Há taxas e sobretaxas que nós pagamos. Está tudo a aumentar e é mais uma forma de depenar a classe média. A classe média tem os dias contados", diz este chefe de família, casado e pai de duas meninas.
Com a reavaliação das Finanças, o valor patrimonial tributário da casa de Sérgio Costa passou de 62 mil euros para cerca de 69 mil euros. "Esperávamos um aumento, mas não tão grande. O valor do mercado imobiliário está a cair e a casa já tem 12 anos", assinala.
Sérgio ainda está a tentar perceber como vai ser com o IMI no próximo ano, mas, de acordo com o
simulador online da DECO Proteste, ainda assim deverá pagar menos que em 2012: 276 euros se a taxa em Gaia for de 0,4% ou 345 euros se for de 0,5% - actualmente, Sérgio Costa paga uma taxa de 0,7%.
Seja como for, 2013 vai ser um ano difícil para Sérgio Costa, a mulher e as duas filhas: "O problema é que nós já estamos reduzidos ao mínimo, porque, com o aumento do IRS, que equivale também a mais um ordenado no final do ano, nós não temos mais por onde cortar. Com estes impostos todos, é como o nosso ministro diz: nós temos é que emigrar e deixar o país ao Deus dará, abandonado".
Nestes testemunhos ouvidos pela
Renascença, uma queixa comum foi a dificuldade em "decifrar" a carta das Finanças com a reavalização da casa. "Colocam valores que, provavelmente, só um técnico oficial de contas é que poderá fazer as contas", diz Sérgio Costa.
Outra questão também reuniu unanimimidade. Se fosse hoje, muito provavelmente não voltariam a investir na compra de casa própria.