11 jun, 2014 • Maria João Costa
Descreve casos de tortura que diz serem “inacreditáveis”, mas nunca perde o tom calmo com que fala. Suzanne Jabbour nasceu há 54 anos, no Líbano. Formada em Psicologia, têm-se dedicado à defesa dos direitos humanos e das vítimas de tortura. É, actualmente, directora do centro Restart, que ajuda a reabilitar vítimas de violência e tortura no Líbano. Uma instituição que nos últimos anos se tem visto a braços com uma vaga de refugiados sírios.
Entrevistada em Lisboa pela Renascença, antes de receber o Prémio Norte-Sul atribuído pelo Conselho da Europa, Suzanne Jabbour desafia os líderes mundiais: “não é aceitável que se mantenham em silêncio quando são cometidos diariamente crimes e há centenas de milhar de vítimas de tortura e violência em todo o mundo que precisam de ser tratadas e precisam de apoio. Nós estamos a investir nas coisas erradas.”
Todos os dias, esta psicóloga ouve testemunhos no seu centro de reabilitação, histórias que, “a nível emocional, se não estamos muito preparados e treinados para ouvir pode ser-se afectado”. Segundo a activista, “as histórias e os testemunhos são inacreditáveis. Questionamo-nos se estão mesmo a acontecer na realidade, se são acções de humanos ou de animais.”
Suzanne Jabbour refere-se, sobretudo, aos casos chegados da Síria. No mesmo tom calmo com que fala à Renascença num luxuoso hotel em Lisboa, bem longe desses casos que descreve, explica que “a tortura é agora mais sofisticada e usa diferentes ferramentas.” Referindo-se à Síria, diz que “o que é diferente é que podemos identificar tortura contra crianças. O que elas testemunham é também uma forma de tortura psicológica. As crianças sírias vêem imagens horríveis de seres humanos que são mortos, corpos para um lado, cabeças para o outro” e desabafa: “Sabe, são histórias horríveis!”
Há anos que trabalha com vítimas de tortura e violência e continua a não encontrar uma justificação para este tipo de actos. Suzanne Jabbour diz que “o problema é que a tortura é uma ferramenta usada nas guerras e usada pelas autoridades para conseguirem confissões, para mudar as convicções e para impedir as pessoas de reagirem, para paralisar as mentes das pessoas”. Talvez por isso diga que as vítimas de violência perderam a esperança no futuro.
Sobre o seu país natal, lamenta a actual situação dos direitos humanos, diz que não são uma prioridade. “Para ser franca consigo, não há qualquer vontade política para avançar nesta matéria. No que diz respeito às mulheres há uma nova cultura, que não sei bem de onde e como vem, mas que é uma cultura de tolerância à violência e abusos.” E, acrescenta, “se descrevesse agora os direitos humanos no meu país, posso dizer que estão a deteriorar-se”.
Suzanne Jabbour recebe esta quinta-feira, em Lisboa, o Prémio Norte-Sul, também atribuído ao príncipe Aga Khan e à rede Aga Khan para o Desenvolvimento. Um galardão que a surpreendeu “por duas razões. Porque o reconhecimento vem da Europa e não do Líbano” e porque é “uma mulher e do Médio Oriente”, o que “quer dizer que esta região ainda faz parte dos interesses da Europa.”