A hora de regressar a casa aproxima-se. Os utentes do centro de dia da Santa Casa da Misericórdia de Campo Maior, no distrito de Portalegre, entoam, quase em uníssono e em jeito de celebração de fim de tarde, as famosas saias da região, cantigas tradicionais do Alto Alentejo.
Maria Laurinda Saragoça, de 67 anos, sorri, enquanto vai tomando o seu lugar naquele coro improvisado. Começou a frequentar o centro de dia há um ano e meio, em plena pandemia. “Tive uma grande depressão. Deixei de fazer o almoço, o jantar. Não abria uma janela, não saía à rua. Assim me pus. Sem saber se estava lá, se estava cá”, desabafa, suspirando.
Desde que passou a sair de casa, todos os dias, e tornou a conviver com outras pessoas, foi “voltando a ser quem era”.
“Aqui faço renda, coso, escrevo”, conta a antiga funcionária da junta de freguesia local, que tem sentido “um bocadinho” os efeitos da atual crise económica. “A reforma é à justa, mas a pensão de sobrevivência do meu marido ajuda-me a pagar a luz e a água.” E assegura com confiança: “Cada vez temos de poupar mais e gerir bem o dinheiro. Não sei se foi de ficar boa, mas penso que há de ser o que for.” Só tem um desejo: que não lhe tirem o centro de dia. “Aqui estou bastante bem.”
Maria Laurinda Saragoça, como grande parte dos 260 utentes da Santa Casa da Misericórdia de Campo Maior, vai-se apercebendo dos efeitos da atual situação económica, marcada pela guerra na Ucrânia, mas, por enquanto, não sente no dia-a-dia as dificuldades que afetam a instituição que, além do centro de dia, tem também residência para idosos, apoio domiciliário, berçário, infantário e pré-escolar.
Com o aumento da inflação e a crise energética, os gastos mensais dispararam, conta à Renascença o provedor da organização, Luís Machado.
“Tínhamos consumos mensais de gás e eletricidade na ordem dos 2.000 a 2.500 euros. Neste momento, estamos a gastar 6.000 a 6.300 euros.”
O responsável menciona também os acréscimos com os transportes, a alimentação e os materiais.
“Tornámos a entrar na agonia e nas dificuldades permanentes. As nossas contas estão no vermelho”, sublinha. E alerta: “Nesta faixa interior até Bragança, mais envelhecida, mais despovoada, mais esquecida, a angústia das instituições é total.”