Há um ano, a pandemia escancarou a ferida. Portugal escandalizava-se com a falta de condições em que viviam milhares de trabalhadores imigrantes no sudoeste alentejano, apesar de a situação não ser nova para quem vive na região. Casas, armazéns e anexos estavam repletos de gente, a viver sem as mínimas condições de higiene, sobretudo devido à falta de habitação condigna.
O Governo interveio, criou legislação para acelerar a legalização das habitações temporárias instaladas pelos produtores de frutos vermelhos nas explorações e para instalar alojamento temporário e amovível que desse resposta às necessidades. Mas um ano depois, em matéria de habitação, está tudo na mesma.
Que o diga Harnek Singh, natural de uma aldeia no estado indiano do Punjab. Chegou há quase dois anos e, entretanto, conseguiu trazer a família para junto dele. Não tem sido fácil devido à falta de habitação.
"Um lugar para viver, sozinho, arranja-se", diz, encolhendo os ombros. "Agora, com família, é muito difícil", explica o trabalhador, enquanto aguarda pela abertura de uma loja no centro de Odemira onde espera poder imprimir uma foto da filha, para a inscrever na escola pública.
"Há um ano que tenho cá a minha família e, desde então, mudei de casa três vezes", revela Singh, que admite que chega a ganhar 1.400 euros por mês, graças a muitas horas extraordinárias que se dispõe a fazer. Sobretudo agora, que é mais difícil "suportar a família, porque está tudo mais caro" devido ao aumento do custo de vida.
Como tantos outros milhares de migrantes que vieram da India, Bangladesh, Nepal ou Tailândia, também entrou na rede de tráfico de pessoas para exploração laboral. Acontece, sobretudo, no recrutamento dos trabalhadores estrangeiros pelas empresas de trabalho temporário, muitas delas já lideradas por outros estrangeiros que, a troco de trabalho, prometem alojamento, transporte e salário. Só que a realidade quando chegam a Portugal é bem diferente.
"Todos pagam para chegar aqui, todos. E agora é mais caro", explica Singh. Mas quanto pagou este imigrante? Cinco mil Euros? Dez mil? Quinze? "Por aí...", responde.
Na costa alentejana, os imigrantes não falam das redes que se aproveitam da pobreza nos países de origem.