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Hafez Hureini senta-se numa cadeira de plástico à porta de casa, à sombra de um cipreste-do-mediterrâneo carregado de semente. Acende um cigarro, virado para a rua que sobe até à mesquita. Num dia comum, o homem de 53 anos poderia ter passado a manhã a tratar dos vegetais na estufa ao lado de casa ou a cuidar das oliveiras nos terrenos em volta. Desde 7 de outubro, isso significa correr risco de vida. “Não conseguimos ir até 10 metros da nossa casa”, conta à Renascença.
Estamos em At-Tuwani, pequena aldeia palestiniana a sul de Hebron, na Cisjordânia, onde vivem poucas centenas de pessoas. Um pinheiro no cimo da colina, encimado por uma bandeira de Israel, funciona como aviso para manter a distância. “Desde o primeiro dia [de guerra], os colonos colocaram bandeiras nas nossas árvores, nas nossas terras, e controlam-nas”, apoiados pelo exército israelita, que montou guarda ali perto. Debaixo de um toldo verde, dois militares vigiam a área, às portas do colonato de Ma’on e do “outpost” de Havat Ma'on (um colonato criado no início do século XXI e que não é legal nem à luz da lei israelita).
Logo a seguir aos ataques do Hamas a Israel, um grupo de colonos invadiu as terras de Hafez, derrubou os muros e arrasou tudo quanto encontrou à frente com “bulldozers”. Quando tentou impedi-los, foi atacado diretamente. “Chegaram mesmo a perseguir-me até à minha casa e dispararam contra mim aqui. Atacaram-me dentro da minha casa. Fiquei com uma costela partida e ferido no ombro e no braço.”
Hafez teve sorte. Poucos dias depois, a 13 de outubro, viu o seu sobrinho Zakaria sofrer consequências bem mais graves.
Era sexta-feira, dia de oração coletiva para os muçulmanos. Os homens estavam reunidos na mesquita, quando terão ouvido gritos no exterior. Saíram e deram de caras com um colono, de arma em riste, a descer a rua na sua direção. Zakaria Adra, de 28 anos, era o primeiro do grupo. O colono aproximou-se, empurrou-o com a arma e logo de seguida disparou, atingindo-o no lado esquerdo do abdómen. Tudo aconteceu em poucos segundos e está registado em vídeo, a partir de dois ângulos.
Não é certo qual a razão – ou se houve alguma em particular – que motivou o ataque. Os vídeos apenas mostram os segundos anteriores ao disparo à queima-roupa. O que é possível concluir a partir das imagens é que havia pelo menos mais um colono nas imediações – não é possível perceber se também estava armado – e que estavam acompanhados por um militar israelita, também armado, enquanto tudo acontecia.
Quando Zakaria caiu no chão e foi assistido pelos companheiros, os três indivíduos afastaram-se. O autor do disparo ainda parou a meio da subida com a arma apontada ao grupo, mas prosseguiu a retirada, entre os gritos da população.