A década de 90 foi decisiva na construção legislativa e orgânica do SEF, não só do ponto de vista interno; com a criação da carreira de investigação e fiscalização, e a atualização da lei orgânica do serviço, mas também no âmbito da sua atividade, neste caso com os primeiros regimes legais para o controlo de entradas, a que se vulgarizou chamar lei dos estrangeiros, as diretivas europeias a que Portugal começava a estar obrigado ou as regularizações extraordinárias de ilegais. Houve mais três: em 1996, 2000 e agora em 2023, na contagem decrescente para o fim do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
Uma década de intensa atividade, muitas vezes polémica, gerida politicamente por seis ministros da Administração Interna – três do PSD e três do PS - e por dois diretores do SEF.
Para além de Daniel Sanches, que saiu em 1994 para ser diretor do SIS, na liderança do SEF seguiu-se António Lencastre Bernardo, um tenente-coronel na reserva, que já tinha sido diretor adjunto da Judiciária e chefe da casa militar do Presidente da República, Ramalho Eanes.
Esteve sete anos à frente do SEF, durante os quais se destacam a construção e aprovação de uma nova Lei Orgânica, a preparação e execução do segundo processo extraordinário de legalização de imigrantes e a preparação e acompanhamento da Expo 98 – até aí o maior evento internacional jamais realizado em Portugal.
Foi nessa primeira década do século XXI, e muito por força da Lei Orgânica de 2000, que os inspetores formados nos dois primeiros cursos se começaram a aproximar da direção do Serviço, mas, até que um deles chegasse mesmo a “número 1”, o SEF ainda foi dirigido por dois magistrados.
Primeiro, Júlio Pereira, um procurador-geral adjunto que vinha de três anos como diretor adjunto do SIS e que, entre 2001 e 2003, deixou marca, sobretudo, na atualização da legislação relativa aos títulos de residência e na preparação de mais um curso de admissão de inspetores, a pensar no Euro 2004 que Portugal estava a organizar.
Depois, Gabriel Catarino, um juiz desembargador que vinha de pouco mais de um ano como diretor adjunto da PSP na área dos recursos humanos, e que, entre 2003 e 2005, para além da participação ativa na segurança do Europeu de Futebol, também é recordado pelo impulso que deu à investigação criminal, nomeadamente no investimento e protagonismo que dedicou à Direção Central de Investigação, Pesquisa e Análise da Informação (DCIPAI).
O PRIMEIRO DIRETOR DA CASA
A mudança de paradigma, no que à liderança do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras diz respeito, aconteceu em 2005.
António Costa, então ministro da Administração Interna do primeiro Governo de José Sócrates, escolhe para diretor, pela primeira vez na história do SEF, um inspetor de carreira.
Manuel Jarmela Palos, com apenas 40 anos, no SEF desde o primeiro curso da carreira de investigação em 1990, foi promovido a “número 1” numa altura em que já levava quatro anos como diretor adjunto.
Fernando Silva, penúltimo diretor do SEF, entre abril de 2022 e agosto de 2023, e companheiro de Manuel Palos no primeiro curso em 1990, sublinha a “normalidade” com que a nomeação foi recebida.
“Enquanto adjunto, Manuel Jarmela Palos já tinha áreas fundamentais como as fronteiras, a dimensão internacional e a documentação dos estrangeiros”, e, para além disso, “era consensual, chegava a todas as carreiras”.
A esta distância, Fernando Silva conclui que Manuel Palos chegou à liderança com a visão internacional de Lencastre Bernardo, o cuidado jurídico de Júlio Pereira, e a operacionalidade de Gabriel Catarino.
Conhecia a casa, e a sua entrada “muda muita coisa”, recorda Fernando Silva. “Identifica algumas dificuldades, como por exemplo a informática. Esse é o grande salto do SEF, que chegou a estar à frente de todas as forças e serviços de segurança deste país, em termos de inovação e de capacidade informática”.
O sétimo diretor do SEF esteve nove anos no cargo. Um período repleto de desafios, durante o qual o SEF estabilizou, por um lado, o seu modelo interno de organização e, por outro, passou a estar definitivamente integrado no sistema global deste universo em que se move. O diretor do SEF chegou, inclusive, a ser vice-presidente da Frontex.
Estes anos foram também de profunda transformação tecnológica. Apareceu o RAPID – sistema de reconhecimento automático de passageiros, o passaporte eletrónico, corredores específicos para o espaço Schengen e os países CPLP, uma outra forma de fabricar documentos de identificação e de viagem, e com o SIS-one4ALL criado por uma empresa nacional, Portugal até ajudou vários estados-membros a usufruírem das vantagens do espaço Schengen.