Hugo viu pessoas esperarem horas para ver o familiar ao longe

O trabalho nos transportes do hospital fez com que Hugo Marques testemunhasse momentos emocionantes. “Acaba por mexer connosco”, reconhece o motorista do Hospital de São José, em Lisboa.

Oiça aqui o essencial da entrevista a Hugo Marques, motorista do Centro Hospitalar de Lisboa Central

Hugo Marques é motorista e trabalha no departamento de transportes do Centro Hospitalar de Lisboa Central há cerca de um ano - trabalhava noutra área, do turismo, e entrou no hospital exatamente na altura em que a pandemia chegou a Portugal.

Foi por isso um ano intenso, cheio de novidades e de desafios.

Hugo e os seus colegas são uma parte essencial no funcionamento deste Centro Hospitalar, constituído por seis hospitais: São José, Santa Marta, Dona Estefânia, Curry Cabral, Santo António dos Capuchos e maternidade Alfredo da Costa.

São eles que transferem os doentes entre diferentes serviços ou diferentes hospitais; vão também buscar e levar doentes a casa quando há necessidade; são também eles que transportam os corpos dos hospitais para as morgues.

Estes últimos meses foram particularmente difíceis para Hugo.

“Quando se transporta um, dois falecidos num dia e se passa a transportar doze e treze, é uma coisa brutal. Saber que se vai buscar o familiar de alguém, saber que se entra numa enfermaria e se vai buscar um falecido e é uma coisa que não pára, é uma coisa esgotante emocionalmente, é brutal”, confessa.

“Nós também temos família”. Hugo sabe o que é ter família nesta situação: o irmão tem covid-19 acabou de sair de uma unidade de cuidados intensivos para passar para os cuidados intermédios.

“Saber que pode ser ele, que posso ter de transportar um familiar, acarreta um desgaste grande”.

O trabalho nos transportes do hospital também o fez testemunhar momentos emocionantes - como uma família a esperar durante horas à porta do Curry Cabral para poder ver o familiar que estava a ser transferido de serviço, ao longe. “Para poder vê-lo passar. Para poder dizer às pessoas que não se esquecem, que gostam delas.”

“Acaba por mexer connosco”, diz o motorista.

Ao fim de um ano, Hugo assume cansaço mas diz não ser ainda tempo de fazer balanços.

“Ainda estamos numa altura de estar alerta, ainda não sabemos qual é que é o fim”. Ainda assim, diz que foi um “desafio grande” e uma “aprendizagem”.