Évora

Luís Correia, 36 anos, corticeiro

A par de Beja e Portalegre, o distrito de Évora está no fundo da tabela no que respeita ao número de deputados eleitos. Os três distritos ocupam 26% do território português, mas colocam apenas oito deputados no Parlamento, o equivalente a 3% dos 230. Évora perdeu dez mil habitantes nos últimos 15 anos. É dos poucos distritos em que a abstenção diminuiu nas legislativas de 2015 e elege apenas três deputados.

Mais de 80% do montado de sobreiros está no Alentejo, mas a indústria transformadora da cortiça instalou-se em Santa Maria da Feira, pelo poder do Grupo Amorim, onde está também o único centro de formação para a cortiça. Luís Correia é dono de uma empresa familiar no distrito de Évora que se dedica à compra, seleção e tratamento da cortiça, para ser vendida à indústria do Norte.

Só queremos que olhem para nós

É bom para o país se o interior for visto como uma região com tantas potencialidades como o litoral. A população é menor, mas em área é maior e devia haver mais deputados para olharem pelo interior. No caso de Évora, estão representados os três maiores partidos, mas seria justo haver maior diversidade de partidos na assembleia, desde que o partido conseguisse um número mínimo de eleitores. Pode ser uma população de apenas 3.000 habitantes, mas essas pessoas, no distrito de Évora, ficavam representadas e seria muito benéfico para o interior. No Alentejo, não pedimos para sermos olhados de forma especial, só queremos que olhem para nós. Enquanto não existir uma proximidade forte dos governantes, sem ser nas eleições, é muito difícil as pessoas envolverem-se politicamente.

Fala-se muito sobre incentivos, mas custam a aparecer

Tivemos uma candidatura aberta no PDR 2020, mas foi chumbada porque exigiam que fizéssemos um sobre-endividamento para colocar painéis solares, algo de que a nossa atividade não precisa. Estamos a reconstruir uma fábrica lentamente e deixámos de querer tentar obter algum incentivo ou apoio. As leis devem ser claras para todos, porque fala-se muito sobre os incentivos, mas na realidade custam a aparecer. Os apoios estão restritos às grandes empresas que têm gabinetes próprios para as candidaturas e conseguem certas vantagens fiscais. As pequenas, que são as que mais precisam, ficam enredadas em burocracias que impossibilitam a candidatura. Mas se as empresas familiares deixarem de existir, não são as grandes empresas que vão conseguir suportar toda a economia. Tem de existir um trabalho mais transparente e próximo das empresas da parte do Governo.

Abatem-se muitos sobreiros por causa da seca

Todos os sobreiros na região têm tendência a desaparecer, porque todos os anos secam e abatem-se muitas árvores por estarem doentes, com contaminações devido ao clima, devido aos anos secos que se têm registado. O Grupo Amorim está a começar a desenvolver um estudo com sobreiros regados, de forma a diminuir o tempo de extração da primeira cortiça de 30 para 10 anos. O objetivo é mostrar aos produtores que é possível acreditarem no sobreiro e fazerem com que não abandonem os montados.

As nossas fábricas têm tendência a desaparecer

No Alentejo preparamos e separamos a cortiça de acordo com a qualidade da matéria prima. As empresas do Norte vêm às nossas fábricas e compram o que necessitam, mas já começam a ir diretamente à floresta comprar ao produtor, pelo que as nossas fábricas têm tendência a desaparecer. No Norte existe um grande “know how” de elaboração da rolha e existe mais mão de obra qualificada do que no Alentejo.

A mão de obra está a desaparecer

O Alentejo devia investir na formação de corticeiros porque a mão de obra está a desaparecer. A nossa empresa já pediu ao IEFP para colocar cursos, mas isso ainda não aconteceu. Temos dois aprendizes, mas somos nós que financiamos essa aprendizagem. Os únicos cursos que existem são da CINCORK [Centro de Formação Profissional da Indústria da Cortiça, um protocolo entre o IEFP e a Associação dos Industriais e Exportadores de Cortiça do Norte], mas são para a indústria e tecnologia da cortiça, não para o trabalho manual do descortiçamento e seleção da matéria prima.

A cortiça precisa de um apoio como o que foi dado à Embraer

Na universidade de Évora, há investigação feita em relação à plantação dos sobreiros, mas falta a parte tecnológica e não há programas para incentivar os alunos a ficarem na região. A cortiça precisa de um apoio fundamental como o que foi elaborado com a Embraer, a fábrica de componentes para aviões em Évora, em que o IEFP desenvolveu cursos e criou um "cluster" empresarial especificamente para a aeronáutica. Para a indústria corticeira devia fazer o mesmo, porque o setor está muito envelhecido.

Se os nossos bisavós voltassem, morriam logo outra vez

No tempo dos nossos bisavós, não era imaginável que uma vinha ou olival fosse regado. Hoje, é completamente normal que estes cultivos sejam regados e agora até o sobreiro é regado, para aumentar o processo de produção. Toda a nossa agricultura está a virar-se para o regadio e a água é um bem escasso. Temos de ter a consciência de que a água vai ser o nosso bem mais precioso. A seca está a afetar toda a agricultura, que no Alentejo está muito dependente do regadio. Se os nossos bisavós pudessem voltar e vissem como está o nosso Alentejo, morriam logo outra vez.