Sabia que também há o Cão Serra da Estrela de pêlo curto?

28 mai, 2022 - 09:00 • Liliana Carona

Ao longo de dez anos tem sido a raça portuguesa mais registada em Portugal, com cerca de 4.500 exemplares de pelo comprido, mas pouco mais de 600 de pêlo curto. A Renascença falou com a mais antiga criadora do país.

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“Tu és um bom cão, dá-me beijinhos”, diz carinhosamente, Suzette da Mota Veiga, enquanto afaga um dos três cães de pêlo curto do Canil da Fonte Santa, criado em 1990, através de um protocolo entre várias entidades. O objetivo principal era defender e sublimar as características étnicas do cão Serra da Estrela e dos poucos (cerca de duas dezenas) dedicados à criação desta raça, nomeadamente os de pêlo curto.

“Não é meu este canil, mas eu ajudo a cuidar”, revela à Renascença a criadora com 80 anos de idade, proprietária do outro canil existente em Manteigas, o Canil da Quinta de S. Fernando, com 15 cães.

“Sei que sou a mais antiga criadora desta raça, e talvez até das outras raças”, sublinha confiante, deixando um desabafo: “As pessoas deixaram de procurar o cão de pêlo curto e é pena, só querem os de pêlo comprido”.

Muitos olham para o Serra de pêlo curto como o patinho feio, mas Suzette reivindica um novo olhar. “Não há muitos de pelo curto e não são típicos. Agora, o Clube Português de Canicultura, permite que uma pessoa cruze pelo curto com pelo comprido para melhorar o pelo curto. As pessoas preferem pelo comprido que é mais vistoso”, observa.

Não esconde a pronúncia que relembra a sua origem. “Sou suíça e em 1970 casei com um português daqui de Manteigas. Era hospedeira, da então designada Swiss Air, chamava-se assim no meu tempo e comecei a fazer criação de cães em 1984”, recorda.

Muitos pastores não estão dispostos a pagar 500 ou 600€

“Há alguns pastores que têm bons cães, mas já não é como antigamente. Muitos desenrascam-se com cães pequenos, mas não querem comprar um cão que custa 600 €, já não é igual”, assinala a criadora.

Antigamente havia mais cães de pêlo curto, porque ao pastor dá-lhe mais jeito. “É um cão muito bom e dá menos trabalho a cuidar: o de pelo curto também é fofinho”, garante, sem deixar de realçar que alguns criadores desistiram de manter a criação de cães desta variedade. “Tenho uma amiga no Alentejo que também faz criação e no início tinha pelo curto, mas vendia mal. Como há pouca procura... ninguém faz criação”, sustenta.

A mais antiga criadora de cães Serra da Estrela do país tem uma rotina de entrega ao cuidado pelos animais.

Tenho 15 cães grandes, quatro ou cinco visitas diárias. É preciso limpar tudo, não deixar cocós, limpar tudo, andar de trela, os cães devem ser treinados. É uma atividade gratificante. O cão é o melhor amigo do homem e esta raça tem uma personalidade muito especial. Muito independente, faz o que quer, e ao mesmo tempo inteligente, é muito bom cão de guarda e não precisam do dono sempre ao pé deles. O Serra da Estrela faz tudo por si próprio. Tem de ser robusto e com as orelhas repuxadas”, nota Suzette.

Quem visita os dois canis de Manteigas, vem doutras paragens. Aida Reguenha, 36 anos, saiu de Sines bem cedo, para levar o filho Leonardo, de 3 anos, a ver os cães da Serra da Estrela, de pêlo curto, no canil da Fonte Santa. “Acho-os lindo, estamos fascinados, a essência é a mesma. O olhar deles é o mesmo, transmite-nos tranquilidade”, afirma.

Nos dois canis que existem em Manteigas, os animais vão recebendo nomes, conforme a imaginação ou o momento ditar. “Este aqui, invade a minha propriedade para vir roubar comida, chamei-lhe Putin, porque invade território alheio”, conta Suzette.

“Há pouco mais de 600 cães de pêlo curto, mas não se pode falar em extinção”

O presidente da Liga dos Criadores e Amigos do Cão da Serra da EstrelaContactada (Licrase) admite que o cão da Serra da Estrela de pêlo curto “não é tao apetecível visualmente e tem menos procura”, mas recusa falar em extinção das variedades.

“Há algum material, está estável. Não corre risco de extinção nem nada disso, até porque é mais prático para os pastores”, conclui Pedro Silva.

Também Hugo Pinto, coordenador dos Serviços Administrativos Clube Português de Canicultura, revela que o Serra da Estrela tem sido repetidamente a raça portuguesa mais registada em Portugal, sendo que os números de registos são muito díspares entre as duas variedades.

“Não sendo fácil apontar um número de cães atualmente existente, pois a comunicação de falecimentos não é muito efetiva, informamos que nos últimos 10 anos foram registados cerca de 4.500 exemplares de pêlo comprido e pouco mais de 600 de pêlo curto”, ressalva.

Não se sabe com exatidão, quando surgiu o cão da raça Serra da Estrela, mas Suzette aponta que “há um texto que fala dos romanos que passavam em S. Romão, na companhia dos seus cães. Eu suponho que há cães na serra, a partir do momento em que havia pastores, antes da era de Jesus Cristo”.

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  • Luis Moura
    30 mai, 2022 Lx 22:27
    Sendo que grande parte da responsabilidade da recuperação desta variedade cabe à Sílvia Ribeiro, do Grupo Lobo, e ao seu Programa Cão de Gado.

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