A primeira ópera original construída no Douro sobe hoje ao palco

17 dez, 2021 - 06:33 • Olímpia Mairos

"Mátria - Aqui na Terra" tem libreto de Eduarda Freitas e música do compositor Fernando Lapa.

A+ / A-

A história começa numa aldeia transmontana, onde vive um rapaz fascinado com as histórias de encantar, acreditando que existe um tesouro escondido na barriga do monte para onde leva as ovelhas. O menino - Rodrigo - transforma-se num homem inquieto, que procura fora de si uma qualquer paz. Cruza-se com outras vidas, cada qual com a sua inquietação. E é quando a velhice se cola aos ossos, que o velho homem sente o apelo do regresso, à procura das certezas de menino. Esta é a Mátria, a primeira ópera escrita a partir da obra de Miguel Torga e que sobe ao placo esta sexta-feira, no Teatro de Vila Real.

O libreto foi escrito por Eduarda Freitas e é totalmente inspirado nos “Contos da Montanha” (editados em 1941) e nos “Novos Contos da Montanha” (editados em 1944), escritos por Miguel Torga.

A autora explica que, usando as palavras de Torga, retira as personagens das ruas “das nossas aldeias e dos contos do autor transmontano, trazendo-as até ao palco e ao espetador, provocando um encontro quase de espanto”.

“São episódios da vida real, às vezes quase surreal”, sublinha.

A música é do Fernando C. Lapa. O compositor vilarealense, com uma longa carreira nacional e internacional, destaca que esta obra “traz um desafio adicional, além dos que envolvem espetáculos deste género”.

“Conseguir fazer com que um projeto deste tipo possa ser de muita gente e ajudar a dizer que a música dita clássica ou erudita não é privilégio de classe ou casta”, observa.

O compositor tem esperança que o que Miguel Torga diz “no fantástico libreto que a Eduarda criou possa ser assumido por todos: palavras de um tempo, mas afinal palavras de sempre, como nas obras maiores de todos os grandes escritores de todos os tempos. Oxalá que a música as possa servir justamente”.

“Uma ópera que vem das pessoas e não das instituições”

A ópera Mátria está organizada em dois atos, de duração muito desigual. O primeiro contém onze cenas, de carácter mais abreviado e de sequência mais rápida e contrastada. O segundo, apenas três, de recorte mais denso e continuado.

Em palco vão estar 21 elementos dos coros comunitário, formado para a ópera, e Moços do Coro, sete solistas e cerca de 30 músicos da Orquestra Mátria, com direção do maestro Jan Wierzba.

A responsabilidade da encenação é de Ángel Fragua para quem o “conciliar horários com os participantes” e “o pouco tempo de ensaios” foi a maior dificuldade.

O encenador que gosta “de criar a partir da simplicidade, ou encontrar a simplicidade no que aparentemente pode ser complicado” explica que assim se encontra “no coro o suporte da ausência de cenografia”.

“Poderia dizer-se que o coro assume a personagem principal da Mátria. Utilizamos os corpos do coro, como elementos para criar espaços, ambientes e ações. O coração da Mátria radica no coro”, sublinha.

O coro e todos os outros participantes são vestidos por Cláudia Ribeiro que desenhou os figurinos para “invadir o palco” porque “não há cenário, mas há cenário'”. Conta que pegou nas palavras que o texto contém, e fez do coro “também montanha e rebanho de ovelhas e a vinha onde fazem a apanha da uva”. Criou uma capa em tons cinza e creme, com texturas e tecidos diferentes, e que, conjuntamente com o jogo de luzes, podem representar todos os elementos do Reino maravilhoso: árvores, montanhas, rochas e animais.

O projeto Mátria - Aqui na Terra apresenta-se como sendo um evento único em Portugal, com dimensão internacional, e com uma forte componente comunitária. Quer contribuir para divulgação da obra de Miguel Torga, como património cultural imaterial, para a divulgação do território escrito por Torga e para a captação de novos públicos.

“É uma ópera que vem das pessoas e não das instituições, com muita gente a trabalhar e a querer fazer” destaca Eduarda Freitas, observando que com o projeto estão a dar trabalho a pessoas da região em diferentes áreas, “desde o vídeo, fotografia, escrita, cantores, músicos, orquestra, enfim...muita gente que está envolvida neste projeto”.

A Mátria é uma ideia original e com produção da Inquieta, uma agência criativa direcionada para a comunicação e a produção cultural, com sede em Vila Real. Foi apoiada pela DGARTES e tem o Alto Patrocínio da Presidência da República. Tem ainda o apoio dos Teatros de Vila Real e Bragança, da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, do Conservatório Regional de Vila Real e da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro entre outras instituições.

Depois da estreia - esta sexta-feira - a ópera volta a subir ao palco do Teatro de Vila Real dia 18 às 21h30 e dia 19 de dezembro, às 17h30.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

Destaques V+