Tempo
|

Carlos do Carmo, 1939-2020

“Lisboa, Menina e Moça” despediu-se de Carlos do Carmo

04 jan, 2021 - 21:00 • Maria João Costa

Funeral do fadista contou com a presença de personalidades do meio artístico e do fado, e com entidades oficiais, como o Presidente da República, o primeiro-ministro, a ministra da Cultura e o autarca de Lisboa. Dezenas de populares foram também despedir-se do fadista.

A+ / A-

O termómetro marcava 11 graus, o céu ameaçava chuva, mas nada demoveu quem quis dizer um último adeus a Carlos do Carmo, esta segunda-feira na Basílica da Estrela, em Lisboa. Foi o caso de Teresa e José Costa. O casal viajou de Sines a Lisboa para se despedir do fadista de quem viram vários concertos ao longo da vida. Ficaram à porta da Basílica da Estrela, onde recordaram o último espetáculo a que assistiram no Coliseu de Lisboa, onde o fadista se despediu dos palcos.

Carlos do Carmo morreu na sexta-feira, aos 81 anos. As cerimónias fúnebres contaram com a presença do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, do primeiro-ministro, António Costa, o presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, a ministra da Cultura, Graça Fonseca, e o autarca de Lisboa. Fernando Medina tinha decretado, neste dia de luto nacional, que a canção “Lisboa, Menina e Moça”, eternizada na voz de Carlos do Carmo, passasse a ser o hino da capital portuguesa.

E foi ao som de “Lisboa, Menina e Moça” que saiu o cortejo fúnebre da Basílica da Estrela. Passavam poucos minutos das quatro da tarde quando as portas da igreja se abriram. Lá de dentro, saíram oito guitarristas e dez violas a tocar. À frente, um dos decanos da guitarra portuguesa, o mestre António Chaínho. Atrás de si, a nova geração de guitarristas, com Angelo Freire, Pedro de Castro, Luís Guerreiro, Gaspar Varela e André Dias ladeados por outros dois guitarristas de outra geração, Mário Pacheco e Paulo Soares.

“Lisboa, Menina e Moça” foi acompanhada por dezenas de populares presentes, com palmas e entoando a letra que Ary dos Santos escreveu. Nas escadarias da Basílica da Estrela, surgiram os rostos de vários fadistas. Mariza, visivelmente emocionada, não quis falar. Também pela igreja passaram, durante o dia, Camané e Carminho. De outra geração, João Braga recorda o amigo com quem partilhou muitos e bem-humorados jantares, mas também aquele que se preocupou em dar a mão a uma nova geração do fado.

O fadista conta à Renascença que, em 1990, disse a Carlos do Carmo que era dos mais novos do fado. João Braga lembra que o amigo brincava com a diferença de idades que tinham, e alertou Carlos do Carmo para a necessidade de renovação do fado. “O que não se renova, morre”, sublinha o fadista que, com Carlos do Carmo, diz ter feito um “trabalho de equipa” nessa renovação da arte do fado.

Exemplo disso são fadistas como Marco Rodrigues, também presente no funeral. O jovem fadista lembra o primeiro encontro do qual guardou um ensinamento de Carlos do Carmo. “Eu disse que tinha sorte em algum dia me ter cruzado com ele. Depois repeti a palavra sorte uma série de vezes e cheguei a um ponto em que o Carlos me disse: 'ter sorte dá muito trabalho, portanto, se está com sorte é porque trabalhou para isso'”, lembra Marco Rodrigues.

Presentes também na missa de despedida a Carlos do Carmo estiveram músicos de outras áreas, como Ágir e o cabo-verdiano Tito Paris. Lado a lado, recordam Carlos do Carmo. Agir, filho de Paulo de Carvalho, sublinha a forma como o fadista “fazia questão de partilhar o palco com mais novos, mais velhos, com fado e não fado”. Agir fala em “agregação” que vai deixar “saudade, mas também um exemplo a seguir”. Já Tito Paris lembra que foi a ouvir Carlos do Carmo que o seu ouvido despertou para o fado e diz que hoje “a lusofonia ficou mais pobre”.

O mundo do espetáculo, com vários atores, músicos como Rui Veloso e o cineasta António Pedro Vasconcelos, estiveram neste derradeiro adeus a Carlos do Carmo. Também os empresários do setor marcaram presença, desde as discográficas aos produtores como Álvaro Covões que, à Renascença, lamenta a partida do fadista “que nunca desistiu, que sempre acreditou na cultura portuguesa e que, a par com a Amália Rodrigues, levou o fado a todos os cantos do mundo e fez de Portugal um país diferente.”

É o adeus ao homem “que nunca desistiu e cantou até aos 80 anos”, como referiu Covões, que hoje Lisboa se despediu com aplausos e gritos de “obrigado”.

“Vai continuar a ser uma referência para as novas gerações”, afirmou o empresário de espetáculos que chegou a sonhar fazer ainda em vida um concerto de homenagem a Carlos do Carmo.

O funeral seguiu para o cemitério dos Prazeres, numa cerimónia restrita para a família do fadista.

Saiba Mais
Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

Destaques V+