Portuguesa Maro cantou com Eric Clapton na quarentena. “Chorei quando recebi o vídeo dele”

16 jul, 2020 - 09:26 • Inês Rocha

Aos 25 anos, MARO conseguiu algo que nunca imaginou ser possível: cantar com Eric Clapton, um dos melhores guitarristas de todos os tempos. Dois anos e meio depois da última conversa com a Renascença, a cantora portuguesa conta como tudo mudou: lançou cinco álbuns, gravou e correu o mundo com Jacob Collier, assinou contrato com produtora do lendário Quincy Jones. A pandemia trocou-lhe as voltas, mas acabou a fazer música com mais de duas dezenas de artistas de todo o mundo.

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Portuguesa MARO cantou com Eric Clapton na quarentena. “Chorei quando recebi o vídeo dele”
Veja o vídeo e conheça a história do dueto de MARO com Eric Clapton na música "Tears in Heaven"

“Não vou nem fingir, quando recebi o vídeo dele chorei”. É assim, com sotaque já quase brasileiro, que lhe vem dos quatro meses que passou no Brasil em confinamento, que a portuguesa Maro começa a tentar descrever como foi fazer uma versão de “Tears in Heaven” com Eric Clapton, um dos seus ídolos de infância (veja o vídeo acima para conhecer a história).

Uma colaboração à distância – como todas as que acontecem durante uma pandemia mundial –, mas nem por isso menos especial.

“Eu cresci a ouvir a música do Eric Clapton. O que eu sinto sempre é que nunca vou conseguir agradecer o suficiente pela oportunidade que me foi dada”.

MARO diz que não quer mostrar falsa modéstia. “Eu sei que se não fosse bonito não gostavam, mas ao mesmo tempo... crescer a ouvir música que eu gosto, e ter o artista que escreveu a dizer que ‘sim, vamos cantar juntos’ é... muito gratificante”, confidencia à Renascença.

Cinco álbuns, várias colaborações e uma tour com Jacob Collier em dois anos

Maro. O futuro da música portuguesa passa por esta "voz rara"?
Veja a entrevista que a cantora deu à Renascença, em janeiro de 2018

A última vez que conversou com a Renascença, em janeiro de 2018, MARO tinha acabado o curso na Berklee College of Music, em Boston, e estava pronta para partir de novo para Los Angeles, em busca de uma carreira na música.

Ainda a dar os primeiros passos na música, tinha já dado nas vistas com o projeto “Berklee People”, durante a universidade, que pôs mais de cem músicos de todo o mundo a tocar as suas versões de Rui Veloso, Sérgio Godinho, Ornatos Violeta e muitos outros artistas. A portuguesa era já um fenómeno na internet.

Dois anos e meio, cinco álbuns e dezenas de colaborações depois, a carreira de MARO deu um salto. Hoje, aos 25 anos, é representada pela produtora do norte-americano Quincy Jones, que produziu vários álbuns de Michael Jackson, incluindo “Thriller (1982)”.

Entre março e junho de 2018, lançou três volumes de um álbum em nome próprio, com as suas primeiras composições – como que a sua história trocada por canções.

Ainda no mesmo ano, já a viver em Los Angeles, lançou mais dois álbuns: “MARO & Manel”, e “it’s OK”.

O álbum com o guitarrista Manuel Rocha, que trabalha habitualmente com Luísa Sobral, foi uma “brincadeira” inesquecível, que fizeram em cinco dias.

“O álbum surgiu de eu sempre ter adorado as composições dele. Um dia propus-lhe: se arranjares uma passagem para LA, eu dou-te casa e arranjo maneira de gravarmos um álbum. E assim foi. Fizemos o álbum em cinco dias. Gravámos em três, eu “mixei” em dois, mandamos para masterizar. Em cinco dias estava feito.”

O resultado é um conjunto de pequenas histórias, contos “de embalar”.

Já o “it’s OK” foi feito inteiramente a solo. “São só composições minhas mais recentes”. Depois de três álbuns a mostrar o seu percurso na música, MARO apresentava agora um álbum mais “melancólico”, “um processo de coração partido que aconteceu e que quis combinar num álbum”.


2019: a tour mundial com Jacob Collier e a participação no “Tiny Desk” da NPR

O ano de 2019, para a artista, foi passado à volta do trabalho com o cantor e multi-instrumentista Jacob Collier. O britânico de 25 anos, uma estrela em ascensão na música mundial, arrecadou já quatro Grammys pelos seus arranjos cheios harmonias complexas.

“No fim de 2018, ele viu um vídeo meu no Instagram e enviou-me uma mensagem a dizer que seria lindo um dia fazermos música juntos”, conta a cantora à Renascença.

A colaboração acabou por acontecer numa das viagens do britânico a Los Angeles. “Ele já tinha algumas ideias e combinamos encontrar-nos para as trabalhar. Acabou por sair a ‘Lua’”.

“Lua” faz parte do álbum “Djesse, Vol. 2”. A canção, com influências da música brasileira, é cantada em inglês e português, com sotaque de Portugal.

Quando se encontraram, Jacob já tinha a música “praticamente feita”. MARO fez a letra e deu alguns contributos na melodia da canção.

“Quando eu comecei a escrever, perguntei se podíamos tentar em português e ele adorou a ideia. Depois veio a ideia de juntar os dois: eu canto em português, ele em inglês e no fim cantamos em inglês mas na realidade é quase um dialeto, já nem parece uma língua”.


Quando o álbum saiu, Jacob Collier convidou MARO para se juntar a ele na digressão de apresentação.

Ao todo, em 2019 deu 90 concertos, em 28 países. Tocou na Sydney Opera House e nos escritórios da NPR, a rádio norte-americana por detrás dos incónicos concertos “Tiny Desk”, em Washington D.C.

Com mais de dez anos de atividade, já passaram por aquele “estúdio” artistas como Adele, Sting, John Legend, Taylor Swift, Alicia Keys e tantos outros, para concertos curtos, de menos de meia hora, com versões acústicas das suas canções.

Tocar naquela “Tiny Desk” (pequena secretária em português) foi uma experiência inesquecível para MARO.

“Já se tinha estabelecido um nível de relação em que havia um orgulho tão grande pelo que o Jacob estava a conseguir e a conquistar e o facto de podermos experienciar isso com ele... acho que isso foi o mais mágico desse dia. Hoje em dia eu olho para esse vídeo e lembro-me como me senti, estávamos todos tão felizes por ele, por ele ter conseguido o seu primeiro concerto Tiny Desk.”

Além disso, foi também uma experiência “gira” ver os bastidores daquele cenário já tão conhecido em todo o mundo. “Chegar lá e ver que aquilo é realmente um escritório normal. Achei isso bizarramente interessante”, conta.


2020: confinamento no Brasil e mais de 20 colaborações à distância

Quando a pandemia chegou, MARO estava à procura de casa em Los Angeles e com “um monte de projetos” a começar. Mas com concertos cancelados e a perspetiva de a situação não melhorar durante algum tempo, optou por mudar de planos.

Acabou por se mudar para a fazenda de uns amigos, nos arredores de São Paulo, no Brasil, onde tem um estúdio. Assim poderia trabalhar durante o período de confinamento.

“Felizmente estamos bem afastados de tudo”, conta. Ainda assim, aquilo que pensava serem dois meses, no máximo, transformou-se em quatro e a situação no país ficou cada vez pior.

“Ninguém está com muito cuidado, o Presidente [Jair Bolsonaro] não ajuda”, critica.

Daqui a duas semanas, a cantora tem viagem marcada para Portugal, mas admite ter algum receio. “Ter de ir para a cidade apanhar um avião, não sei como vai ser”.

Durante estes meses, procurou aquilo que procura sempre: fazer música com outros artistas que admira.

“Para mim, a coisa mais mágica da música em geral é colaborar, sempre senti isso. Na Berklee era o projeto Berklee People. Claro que eu posso ficar quatro horas sozinha a tocar guitarra e vou adorar, mas para mim a coisa ganha vida e dimensão quando dá para partilhar. Acho que a música é uma coisa universal, que está acima de nós e podemos usar como linguagem.”

No projeto #CallMaro, ou "ITSA ME, MARO", a artista "ligou" a mais de duas dezenas de artistas para cantar com eles. Alguns nomes mais conhecidos, como Maria Gadú, Mayra Andrade, Tiago Nacarato ou Luísa Sobral, mas também alguns colegas de curso cuja música admira.

“É uma coisa que espero nunca perder, a música tem de me tocar. Não interessa se tem 100 milhões de seguidores e é a pessoa mais conhecida do mundo ou com o meu colega de Berklee que muito pouca gente conhece, mas a música toca-me igualmente.”

Ainda assim, o projeto ajudou-a a chegar a outros públicos. “A nível de seguidores, é sempre assim, se de repente há uma colaboração com alguém maior a nível mundial, que tenha um público diferente, traz sempre seguidores, pessoas que não conheciam o trabalho e começam a conhecer”, diz.

Ainda assim, a portuguesa não consegue dizer que estes foram tempos positivos.

“Eu não quero dizer que foi bom que tenha acontecido, porque eu sei que, por causa da pandemia, pessoas morreram, empresas faliram, é uma coisa que eu nunca vou dizer que foi bom que tenha acontecido. Mas pelo menos eu tenho tido sorte de não estar a ser tão mau para mim”, afirma.


Concertos? Enquanto houver risco, “não vou ser capaz”

Sobre a possibilidade de dar concertos nos próximos tempos, que irá passar em Portugal, MARO diz não estar nos seus planos.

“Eu prefiro não tocar durante uns tempos”, revela. “Enquanto isto não está completamente resolvido, eu não vou ser capaz de dar um concerto sabendo que há pessoas no público a correr risco de apanhar o vírus porque eu organizei um concerto”.

Ainda assim, a artista não vai parar: “vou começar a gravar o meu próximo álbum, daqui a uns meses. Prefiro ir trabalhando nas minhas coisas”.

Sem poder dar grandes pormenores, a artista levanta o véu do que será o próximo trabalho. “A única coisa que posso dizer é que é bem mais... não quero dizer comercial porque tem uma conotação de venda, mas é menos música do mundo, é mais ‘mainstream’, mais eletrónico, explora a minha voz de maneiras diferentes do que fiz no passado”, revela.

Será gravado em Portugal, durante “um mês e meio intenso”, produzido por um amigo que virá dos Estados Unidos para trabalhar com a portuguesa.

“Sempre quis fazer um projeto assim. Não vai ter um género só, tem coisas mais para o pop e experimental mas noutras vai cair mais para o RnB, outras para o trap”.

“Veremos”, brinca, ainda com o sotaque do Brasil. “Aqui dizem que eu pareço “gringa” a falar, uma americana que aprendeu português”.

“Agora volto a Portugal e vai dar certo”, garante.

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