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Há uma nova exposição “revolucionária” em Fátima contra um mundo "onde só queremos ser servidos"

30 nov, 2024 - 12:00 • Alexandre Abrantes Neves

"Servir: a única pregação" é inaugurada este sábado no Santuário, em homenagem à Associação dos Servitas. São mais de cem obras que destacam exemplos de serviço ao próximo (como o de Cristo e o do Evangelho) e que não fecham os olhos aos grandes temas da Igreja, nomeadamente a ordenação de mulheres.

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Reportagem "Servir: a única pregação" de Alexandre Abrantes Neves
Ouça aqui a reportagem da Renascença. Foto: Santuário de Fátima

Logo à entrada, antevê-se a imponência da exposição. O enorme púlpito da Igreja de Santa Cruz de Nicolau de Chanterene atrasa por um segundo o ciclo normal de uma respiração. Aqui representado num modelo didático, cedido pela Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, esta obra típica do período do Renascimento é a primeira a retratar exemplos de serviço, com representações de personagens bíblicas (como Abraão) ou personalidades da Igreja (exemplo de Santo Agostinho).

Em pouco mais de hora e meia de visita guiada, a exposição “Servir: A Única Pregação”, patente no Santuário de Fátima a partir deste sábado, traz mais de uma centena de obras, clássicas e contemporâneas, para destacar mensagens e personalidades que dedicaram a vida aos outros. “Mas não só no Santuário. É uma forma de comunicar sobre Fátima, mas também sobre o Cristianismo no geral”, aponta Marco Daniel Duarte, diretor do Museu do Santuário e comissário da exposição.

Ao longo de sete núcleos, artistas como Artur Bual, Ana Lima-Netto, Paulo Neves, Lígia Rodrigues ou Baltazar Gomes Figueira trazem obras que tentam dar uma visão transversal do ato de servir a Deus, inspirados em exemplos como Cristo, a Virgem Maria, os evangelistas, os anjos e figuras emblemáticas do catolicismo, como São Francisco de Assis.

Pelo meio das obras de arte, vão aparecendo “objetos inusitados do quotidiano” como uma forma de “desafio” para os visitantes e os peregrinos mergulharem a fundo nas reflexões propostas pela exposição. É o caso dos vários jarros que vão estando expostos aqui e ali, primeiro em metal esmaltado e depois em prata.

Estes objetos representam o serviço de Cristo no lava-pés da Última Ceia – e cujo momento está representado num cenáculo, com uma bacia de água e panos, onde os visitantes vão poder imaginar e refletir sobre a importância de ser “servidor”: “muito diferente de ser escravo, os escravos são obrigados, os servos não”.

Mais à frente, os jarros voltam a aparecer, mas agora como parte do momento colaborativo da exposição. Depois de se confrontarem com a própria imagem num espelho baço, os visitantes são convidados a pegar num jarro com uma caneta amarrada e a escreverem o seu testemunho de serviço num mural. Mas nem sempre se vão conseguir ler estes contributos.

“Sempre que alguém escreve, damos a oportunidade de abrirmos a luz negra – isto para que a pessoa também tenha o sentido de que Deus vê tudo e também viu aquela forma de servir. Isto não é apenas uma questão religiosa, é a própria pessoa, é mais do que isso. É uma questão de sermos mais humanos, porque a humanidade não se sustenta sem que passe por esta ideia de servir o próximo”, explica Marco Daniel Duarte.

Se os contributos vão ficar sobrepostos ou se este painel vai ser depois exposto, isso só se saberá no final da exposição. De qualquer das formas, aqui o objetivo é outro: dar uma mensagem “revolucionária”. “Parece que nos colocamos só na parte do mundo que quer ser servida. Esta exposição quer inverter os papéis. Como é que eu sou capaz de me ver como servidor?”, desafia Marco Daniel Duarte.

Em contracorrente com a atualidade está também o último núcleo da exposição. A partir do significado da palavra Evangelho – “boa notícia” –, aqui a ideia é mostrar aos visitantes “exemplos de boas notícias, de serviço aos outros”, ao contrário da “tristeza e das más notícias que aparecem na comunicação social”.

Para isso, há dois ecrãs com títulos e resumos de artigos, reportagens e entrevistas com “exemplos” de atos solidários e de serviço aos outros na atualidade, publicados em órgãos de comunicação social de vários países – muitos destes contributos vindos da Renascença.

E o papel das mulheres aqui tão perto

Precisamente sobre atualidade, a exposição também não foge aos temas que marcam o debate interno da Igreja. Depois do Sínodo dos Bispos, o Santuário de Fátima “não podia ignorar” o tema do serviço das mulheres e o debate da ordenação de diaconisas. Daí, o grande destaque dado à peça “Veste para Febe?”, cosida a alumínio e decorada com pérolas.

Esta exposição não esquece que a História não pode continuar a ser escrita apenas no masculino. (...) Essa peça é decalcada na dalmática usada pelos ministros do diaconado. O Papa Francisco quer que a Igreja olhe para este tema e perceba se, de facto, as mulheres podem ou não aceder a esta ordem do ministério ordenado. A exposição aqui coloca esse debate em cima da mesa”, esclarece.

A exposição é também uma homenagem à Associação dos Servitas de Nossa Senhora de Fátima, que comemora este ano o seu centenário. Ao longo do percurso, vão surgindo objetos doados ou representativos da ação deste grupo de fiéis, que ajudam os peregrinos que visitam o Santuário.

“Essa associação devia ganhar a expressão que tem quando está dentro das celebrações do santuário ou nos bastidores” e daí os muitos objetos que permitem contar a missão e história desta associação – e que vão desde o andor utilizado até há poucos anos para colocar Nossa Senhora de Fátima até à comunicação da bênção apostólica dada pelo Papa Francisco.

Numa altura “em que se discute muito a nível nacional” o valor dos bilhetes de entrada em museus, Marco Daniel Duarte reforça que o Santuário continua a fazer questão de garantir entrada livre nas exposições – “este ponto é muito importante para nós, tal como o centenário dos servitas”. A exposição está patente até 15 de outubro de 2025 no Santuário e pode ser visitada todos os dias entre as 9h00 e as 12h30 e as 14h e as 17h30.

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