22 jun, 2023 - 11:19 • Olímpia Mairos
O Papa Francisco abre caminho à beatificação da irmã Lúcia de Jesus e do Coração Imaculado, a mais velha dos três videntes de Fátima e figura central no conhecimento e divulgação da Mensagem dirigida à humanidade por Nossa Senhora nas Aparições na Cova da Iria, em 1917.
Sua Santidade aprovou a publicação do decreto que reconhece as “virtudes heróicas” de Lúcia de Jesus e do Coração Imaculado, após uma audiência concedida ao prefeito do Dicastério para as Causas dos Santos, cardeal Marcello Semeraro.
O reconhecimento das “virtudes heróicas” é um passo central no processo que leva à proclamação de um fiel católico como beato. Trata-se da penúltima etapa para a declaração da santidade. Para a beatificação, exige-se o reconhecimento de um milagre atribuído à intercessão da agora venerável Lúcia de Jesus.
Para o bispo de Leiria-Fátima, D. José Ornelas, o reconhecimento das virtudes da irmã Lúcia “representa para nós todos um motivo muito feliz de alegria e para todos aqueles que amam Fátima e se deixam inspirar pela presença de Maria para si próprios e para toda a Igreja”.
Segundo D. José Ornelas, os três pastorinhos não ficariam completos “sem Lúcia e é completar a Mensagem de Fátima com aquela que foi particular testemunho e que nos deu as memórias de todos os acontecimentos de Fátima”.
“Se os dois primeiros pastorinhos, Francisco e Jacinta, representam a idade da infância, aqueles que foram objeto especial do carinho materno de Maria, a Lúcia representa a idade adulta, a idade da razão, das memórias meditadas, amadurecidas, transmitidas pela sua própria pena”, destaca, frisando que tais memórias significam para a Mensagem de Fátima “algo de inestimável”.
Para o bispo de Leiria-Fátima, o reconhecimento “agora das suas virtudes, não só daquilo que disse, mas daquilo que foi a sua vida é o confirmar-se do efeito que a Mensagem de Fátima traz a pessoas como os dois primeiros pastorinhos na sua inocência e Lúcia na sua idade adulta, madura de completa dedicação ao Senhor na vida consagrada”.
“É isso que nós agradecemos agora e esperamos que em breve, de facto, possamos celebrar na Igreja os três pastorinhos, como estão juntos no céu que estejam juntos, também na admiração e na Mensagem que trazem juntos para a Igreja”, conclui.
Lúcia Rosa dos Santos, a Irmã Maria Lúcia de Jesus e do Coração Imaculado, faleceu a 13 de fevereiro de 2005, aos 97 anos de idade, depois várias décadas vividas em clausura no Carmelo de Coimbra.
No santuário de Fátima, esta manhã, os sinos tocaram a repique, em sinal festivo pela “alegria que nos responsabiliza” como referiu o reitor, padre Carlos cabecinhas, que presidiu a uma oração espontânea na Capelinha das Aparições, na qual participaram funcionários, voluntários e peregrinos presentes no momento.
Numa declaração publicada pelo Santuário, Carlos Cabecinhas refere-se a este momento como “de enorme alegria para o Santuário de Fátima, enorme alegria antes de mais, porque é o reconhecimento de Fátima como uma escola de Santidade, a Mensagem de Fátima como caminho de comunhão com Deus e é isso que nós vemos espelhado na vida da Irmã Lúcia, e que é reconhecido com esta declaração da heroicidade das suas virtudes”.
“É motivo de grande alegria e por outro lado que nos responsabiliza e nos responsabiliza no sentido de dar a conhecer a vida da Irmã Lúcia”, acrescenta.
Na visão do sacerdote, se a Igreja reconhece a heroicidade das suas virtudes é então “fundamental que procuremos dar a conhecer cada vez mais profundamente e melhor a vida desta venerável que procurou viver de forma intensa a sua relação com Deus”.
Destacando que “a Irmã Lúcia há muito que tem fama de santidade entre o povo cristão”, o sacerdote destaca que “esta declaração da Igreja e o reconhecimento da sua exemplaridade e o reconhecimento da sua exemplaridade compromete-nos no procurar dar a conhecer essa vida, essas virtudes, esse modo de vivência cristã”.
“O anúncio da heroicidade das virtudes da irmã Lúcia, compromete-nos também numa outra vertente, numa outra dimensão que é a oração. A oração para que o senhor leve a bom termo este processo que procurará conduzir à beatificação e canonização da Irmã Lúcia de Jesus”, acrescenta.
Para o padre Carlos Cabecinhas, a irmã Lúcia “foi uma figura marcante do século 20 português, foi uma figura marcante da vida da Igreja, marcante na sua vida discreta, mas na sua capacidade de influenciar as nossas vidas”.
“Esta declaração é o reconhecimento daquela que foi a sua maior grandeza e a sua maior grandeza residiu precisamente na sua vivência cristã, numa forte vivência marcada pela Mensagem de Fátima, mas também pela sua vivência como Carmelita”, assinala.
A vice-postuladora da Causa de Beatificação e Canonização da Irmã Lúcia, irmã Ângela de Fátima Coelho, expressa “muita alegria” ao ver reconhecidas as virtudes heróicas da vidente de Fátima.
“Este é um passo importante no processo da causa de canonização da irmã Lúcia, porque significa que aquilo que do ponto de vista humano podemos estudar e conhecer, a irmã Lúcia viveu as virtudes principais da nossa fé em grau heróico, ou seja, pode ser modelo para todos os cristãos que se aproximam de Cristo neste caminho do discipulado”, observa.
Para a vice-postuladora da Causa de Beatificação e Canonização de Lúcia de Jesus, “Lúcia reúne em si toda a espiritualidade da mensagem de Fátima e também a espiritualidade do Carmelo, é uma figura que ultrapassa os limites deste espaço físico de Fátima e do Carmelo, porque Lúcia é uma figura universal. Creio que pode ser uma fonte inspiradora para tantos de nós que caminhamos em busca do Senhor, que passamos por momentos difíceis, por momentos confusos”.
“Fica-nos este rasto de Luz que a Irmã Lúcia vai deixando e os seus apelos. Ela foi eco das palavras que Nossa Senhora quis transmitir a toda a humanidade, o seu grande desejo da oração, da oração do rosário, dos primeiros sábados, consagração, uma vivência centrada em Deus... são tudo pequeninos rastos de luz que Lúcia vai deixando e deixa para cada um de nós neste nosso caminho de Igreja neste momento, em que também precisamos de figuras luminosas, que nos levantem o olhar e nos continuem a dar esperança”, sublinha ainda.
A religiosa pede “aos peregrinos que se encomendem” à irmã Lúcia e que peçam graças.
“Falta um milagre primeiro para a beatificação e depois outro para a canonização. Mas não é só pelos milagres que podemos obter e que fazem falta para o processo da causa avançar é também pela alegria que sei que é ter esta mulher como companheira de viagem e como amiga”, conclui, agradecendo ao Papa e ao Dicastério por terem aprovado o decreto que reconhece as virtudes heroicas da religiosa carmelita, cujo porto esta sepultado na Basílica de Nossa Senhora do Rosário de Fátima, tal como o dos primos Francisco e Jacinta marto, os dois primeiros santos de Fátima.
O cardeal D. António Marto, bispo emérito de Leiria-Fátima, congratula-se “com reconhecimento e a promulgação das virtudes irónicas da irmã Lúcia” e sublinha “a dimensão histórica e universal da santidade que se manifesta através do reconhecimento destas virtudes heróicas”.
O prelado destaca a “forma discreta e humilde” como Lúcia viveu o seu amor a Deus, a Nossa Senhora, à Igreja e a toda a humanidade, explicando que “ela viveu toda esta dimensão e espiritualidade de forma discreta e humilde, procurando a verdade e não a notoriedade, sempre escondida mas sempre presente a todos”.
D. António Marto explica que “esta sua espiritualidade, santidade e virtudes são muito humanas”.
“Ela não era uma extraterrestre, não vivia fora da nossa órbita, foi humana e muito feminina, uma mulher inteligente e perspicaz, desembaraçada e solidária, cheia de alegria e humor contagiante como testemunham as irmãs do Carmelo”, assinala.
O bispo emérito de Leiria-Fátima, que pertence também ao Dicastério para as Causas dos Santos, destaca que apesar de a vocação de Lúcia ter sido vivida dentro do mosteiro, na clausura, numa dimensão contemplativa, “não estava alheia à vivência e aos problemas quer da Igreja quer do mundo”, que estava mergulhado “no inferno de duas guerras e uma Igreja altamente perseguida, vítima de um ateísmo militante”.
“Ela foi portadora de uma mensagem que transmitiu à Igreja e ao mundo, mas que ela interiorizou profundamente na sua espiritualidade. Uma mensagem de misericórdia, de esperança e de paz para o mundo”, sublinha.
O prelado destaca ainda quatro aspetos da espiritualidade de Lúcia: “a sua paixão pela beleza de Deus e dos seu amor”, “a sua devoção e confiança no Coração Imaculado de Maria”, que dizia ser símbolo do amor e da misericórdia de Deus, “o seu amor à Igreja e à humanidade” vivido sempre com compaixão e a “oferta da sua vida a Deus em favor da humanidade”, o que “é muito interpelador para a Igreja de hoje, quando assistimos a uma espécie de eclipse cultural, de esquecimento e de indiferença em relação a Deus”.
“Esperamos agora que surja depressa um milagre para podermos participar na grande festa da sua beatificação e canonização”, conclui.