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Discussão do OE 2025. Do “praticamente impossível” aos “duodécimos não são solução”

27 set, 2024 - 07:00 • Manuela Pires

Ao longo de seis meses, o país assistiu ao jogo do rato e do gato, com declarações públicas de um lado e de outro, mas sem nunca se ter falado de propostas concretas. E é num ambiente crispado que Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro se reúnem esta sexta-feira.

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A um mês da discussão e votação do Orçamento do Estado no Parlamento, o líder do Partido Socialista e o primeiro-ministro reúnem-se esta sexta-feira em São Bento, para discutir a viabilização da proposta do Governo.

Sem maioria na Assembleia, Luís Montenegro precisa da abstenção do PS para aprovar as contas do Estado, depois de André Ventura ter anunciado que “com toda a probabilidade votará contra” o Orçamento para o próximo ano.

Ao longo de seis meses, o país assistiu ao jogo do rato e do gato, com declarações públicas de um lado e de outro, mas sem nunca se ter falado de propostas concretas. Modelar, calibrar as medidas são palavras usadas com frequência, sem que se saiba concretamente até onde o Governo e o PS estão disponíveis a ceder.

E depois de tanto “bate-boca”, eis que a novela atinge um novo patamar com acusações em praça pública: o PS aponta o dedo ao Governo, acusando-o de ter “discussões infantis e estéreis na praça pública”, e o executivo responde, dizendo que está a tentar marcar uma reunião com o líder do PS, mas que a resposta tem sido sempre negativa.

Para adensar a trama, esta segunda-feira, o primeiro-ministro reuniu-se com os líderes da Iniciativa Liberal e do Chega, reuniões que não foram oficialmente anunciadas pelo gabinete do primeiro-ministro.

Enquanto isto, Marcelo Rebelo de Sousa faz saber, através do Correio da Manhã, que quer eleições se não houver Orçamento do Estado para 2025. Publicamente, o Presidente da República não confirma nem desmente, mas alinha com o Governo na dramatização e aleta para uma crise política e económica, ao mesmo tempo que diz que a única solução boa é a viabilização do Orçamento do Estado.

De eleições antecipadas ninguém fala abertamente, mas esta semana Luís Montenegro deu mais um passo na clarificação do que pode acontecer em caso de chumbo do Orçamento do Estado: o primeiro-ministro rejeita governar em regime de duodécimos.


CRONOLOGIA

Seis meses de discussão sem negociação do Orçamento do Estado


19 março — Partidos recebidos em Belém

Ainda se contavam os votos da emigração quando Pedro Nuno Santos foi recebido pelo Presidente da República, a 19 de março, no Palácio de Belém. À saída, o líder do PS garantia ser “praticamente impossível” o partido socialista viabilizar o Orçamento do Estado para 2025.

Do praticamente impossível, o Partido Socialista foi matizando o discurso: disse “estar aberto a entendimentos”, “disponível para negociar” e “disponível para viabilizar um Orçamento do PSD", mas com "cedências por parte do Governo”.

Ao longo dos últimos seis meses, a tática do primeiro-ministro tem assentado num princípio que estabeleceu desde o dia da posse, a 2 de abril, segundo a qual, a não rejeição do programa do Governo implica a sua execução até ao final do mandato, de quatro anos e meio.


11 abril – Discussão do programa de Governo na Assembleia da República

No primeiro discurso como líder do Governo, Luís Montenegro não falou em Orçamento do Estado, mas repetiu o que já tinha dito semanas antes na posse do Governo.

“Não seremos nós a pôr em causa a estabilidade política e governativa (…) Não rejeitar o Programa do Governo significa permitir o início da ação governativa. Mas significa mais: significa permitir a sua execução até ao final do mandato ou, no limite, até à aprovação de uma moção de censura. Não se trata de aderir ao programa, trata-se de não bloquear a sua execução”, repetiu Luís Montenegro no Parlamento.


3 julho — Entrevista do líder do PS à RTP

O “praticamente impossível” de Pedro Nuno Santos é atenuado numa entrevista à RTP3. Frente às câmaras, o líder do Partido Socialista avisa que se o “PS for ignorado vamos ter um problema”, mas acrescenta que “o PS não tem uma atitude irresponsável perante o país, não pode é violentar-se” votando um documento para o qual não seja tido em conta.

“O PS, como maior partido da oposição, não vai prescindir, se for para o viabilizar, de ter uma palavra significativa a dizer nas políticas que o Orçamento consagra”, alertou o líder dos socialistas.


17 de julho — Debate do Estado da Nação

"Está disponível para repensar connosco, com o PS, a estratégia e a política para o IRC?". A pergunta, em jeito de desafio, foi lançada pelo secretário-geral do PS ao primeiro-ministro durante o debate do Estado da Nação.

O desafio é prontamente aceite por Luís Montenegro que coloca, no entanto, condições para se negociar. "Se tiver disponibilidade para olhar para o futuro com esta confiança no nosso tecido económico vamos sentar-nos, se não tiver confiança não simule a disponibilidade", respondeu Montenegro.

O Partido Socialista, nessa altura, criticou a forma como o Governo quer reduzir a carga fiscal para as empresas, através de uma descida da taxa de IRC, de 21% para 19% já em 2025 e até 15% em 2027. Pedro Nuno Santos considerou a medida ineficaz e injusta, posição que mantém até à data.

Montenegro mostra-se disponível para fazer aproximações, mas sempre dentro (e tendo como base) o programa do Governo.


19 julho — Primeira ronda negocial em São Bento

A primeira ronda negocial fica marcada pelas ausências do primeiro-ministro, por razões de saúde, e do líder do PS.

Na residência oficial, três ministros — das Finanças, da Presidência e dos Assuntos Parlamentares — recebem os partidos com assento parlamentar.

À saída, Alexandra Leitão, líder parlamentar do PS, foi muito sucinta nas declarações que fez aos jornalistas, repetindo haver margem para o diálogo. “Estamos todos com abertura negocial e esse é o primeiro passo para que as negociações cheguem a bom porto.”


1 agosto – Ministro das Finanças dá entrevista à Renascença e ao Público

Já com o país a banhos, o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, admitiu, em entrevista ao programa Hora da Verdade, da Renascença e do Jornal Público, que o governo estaria disponível para “calibrar” as medidas do IRC e do IRS Jovem, mas sem deixar cair o essencial das propostas.

Mas o Governo foi dramatizando e deixando avisos de que não vai permitir propostas que desvirtuem o programa com que ganhou as eleições.

“Se a oposição desvirtuar o Programa do Governo, teremos de perguntar aos portugueses se aceitam”, afirmou Joaquim Miranda Sarmento.


14 agosto — Festa do Pontal

O Orçamento do Estado para 2025 não cabe no discurso que Luís Montenegro fez no Algarve na noite de 14 de agosto. Em plena crise nas urgências hospitalares, o primeiro-ministro anunciava um suplemento extraordinário entre 100 e 200 euros para as pensões mais baixas a ser pago em outubro, um passe ferroviário de 20 euros e mais dois cursos de medicina. Os comentadores viram nestes anúncios uma forma de pressionar o PS a viabilizar o Orçamento e de preparar o caminho para eleições antecipadas.


1 de setembro – Universidade de verão do PSD e a Academia Socialista

O regresso de férias fica marcado pela carta que o PS enviou ao primeiro-ministro e que não teve resposta, onde Pedro Nuno Santos pedia informações sobre as contas públicas de 2025. Na Universidade de Verão do PSD, Luís Montenegro avisa que “a instabilidade política está na oposição” e que o “país está com o Governo". E acrescentava: "Aquilo que não sabemos é se a oposição vai estar com o país.”

No discurso, Luís Montenegro diz ainda não perceber “qual é a pressa” do Partido Socialista e o porquê de tanta agitação por parte de Pedro Nuno Santos, lembrando que a segunda ronda negocial ficou marcada para setembro. “Sente-se despeitado porque durante o mês de agosto ninguém disse nada. (…) Não era isso que estava combinado.”

Em Tomar, Pedro Nuno Santos volta a pedir informações sobre as contas públicas para iniciar negociações e coloca mais duas condições, sobre IRS Jovem e IRC. “O PS nunca viabilizará um Orçamento de Estado que inclua ou tenha como pressuposto os regimes para o IRS e IRC que deram entrada na Assembleia da República.”

O líder do PS diz também estar disponível para aprovar um retificativo que permita o cumprimento dos acordos assumidos com vários grupos profissionais. “No caso de o OE2025 não ser aprovado, estaremos disponíveis para aprovar um orçamento retificativo que garanta a execução desses acordos”, referiu em Tomar.


10 de setembro – Segunda ronda negocial no Parlamento

Os dias anteriores à segunda ronda negocial ficam marcados pelas acusações do PS ao Governo, e pelas ameaças de faltar á reunião sobre o Orçamento, alegando que não tem a informação essencial. Além disso, diz que os dados que constam do Quadro Plurianual das Despesas Públicas são insuficientes.

Na reunião, o Governo revela aos partidos o cenário macroeconómico, e o Partido Socialista pede dois dias para analisar os dados, ficando disponível para nova reunião.


22 de setembro – A troca de comunicados e a marcação do encontro

Em 12 dias, PS e Governo não reuniram presencialmente, mas na comunicação social iam trocando argumentos. Na Renascença e no Jornal Público, o ministro dos Assuntos Parlamentares dizia ser possível chegar a uma solução a meio do caminho nas medidas do IRC e do IRS Jovem, mas o líder do PS respondia que isso nunca ia existir.

Mas o clima estava a subir de tom. O ministro da presidência, António Leitão Amaro, garantia que o Governo continuava à espera das propostas do PS para avançar com as negociações, dizendo que “ninguém sabe o que o PS quer”.

No domingo, por volta da hora do jantar, fica marcada a reunião para 27 de setembro, às três da tarde, mas, só depois de uma troca de acusações entre o gabinete do primeiro-ministro e do Partido Socialista sobre quem é que não quer reunir-se.

O Governo afirma que está desde 4 de setembro a tentar marcar o encontro, mas Pedro Nuno Santos não se mostrou disponível. O líder do PS responde, diz que não é bem assim, e alega que estava disponível, mas queria que o encontro fosse tornado público.

No dia seguinte, as reuniões “discretas” com André Ventura e Rui Rocha em São Bento são motivo para mais um momento de tensão entre o Governo e o PS. E é neste clima que os dois líderes se reúnem esta sexta-feira à tarde, depois de o PS ter acusado o Governo de irresponsabilidade e de “discussões infantis e estéreis de gestão de agendas na praça pública”.

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  • ze
    27 set, 2024 aldeia 10:37
    entre estes pêésses.....é só show-off, no fim tudo fica na mesma e bem,pois são practicamente iguais nas politicas para o país.

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