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Buscas na Câmara de Lisboa, Medina e um alegado "saco azul" do PS. O que está em causa?

19 jan, 2023 - 20:20 • João Malheiro

A PJ realizou buscas na Câmara de Lisboa no âmbito de uma investigação a um alegado saco azul do Partido Socialista, durante o mandato de Medina. O que é que está a ser investigado? E será este mais um caso do Governo que pode acabar em demissão?

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Foto: Carlos M. Almeida/Lusa
Foto: Carlos M. Almeida/Lusa
Fernando Medina Foto: António Pedro Santos/Lusa
Fernando Medina Foto: António Pedro Santos/Lusa

Mais um caso no Governo e desta vez a envolver o ministro das Finanças e dos principais candidatos à sucessão da liderança de António Costa: Fernando Medina.

A Polícia Judiciária (PJ) realizou, na terça-feira, buscas na Câmara de Lisboa no âmbito de uma investigação a um alegado saco azul do Partido Socialista, durante o mandato de Fernando Medina na autarquia da capital.

O que é que está a ser investigado? E terá Fernando Medina condições para ficar no cargo? O ministro das Finanças diz estar de consciência tranquiliza e pediu à Procuradoria-Geral da República para ser ouvido.

O que está em causa?

Na quarta-feira, a CNN Portugal noticiou que a PJ realizou buscas na autarquia de Lisboa, devido a um saco azul que terá ocorrido durante o mandato de Medina.

Em causa está uma nomeação de prestação de serviços para a gestão de obras na capital, assinada por Fernando Medina, o presidente da Câmara da altura e atual ministro das Finanças, indica a CNN Portugal.

A empresa contratada pertencia a Joaquim Morão, um histórico socialista de Castelo Branco, que será um dos suspeitos, juntamente com o amigo e empresário António Realinho.

As autoridades investigam suspeitas de corrupção, participação económica em negócio e falsificação, nos anos de 2015 e 2016.

O Ministério Público (MP) acredita que o objetivo do esquema visou a angariação de dinheiro em obras públicas, com subornos de empreiteiros, para o financiamento ilícito do PS, através dos chamados sacos azuis, adianta a CNN/Portugal.

O que é um "saco azul"?

Antigamente, a expressão "saco azul" referia-se a "conjunto de valores, geralmente de dinheiro público, proveniente de receitas eventuais e reservado para despesas não orçamentadas", segundo o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa.

A expressão terá surgido, originalmente, devido ao dinheiro ser guardado e transportado em sacos, antigamente, e aos livros de contabilidade de finanças públicas serem, inicialmente, azuis.

Hoje em dia, a expressão é usada coloquialmente para classificar "valores que não entram nos registos contabilísticos legais e são usados para fins ilícitos ou para fuga ao fisco, segundo do Dicionário Priberam.

É, em parte, a explicação do caso em que o antigo presidente da Câmara de Lisboa pode estar envolvido.

Autarquia confirma buscas?

Sim. O atual presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, confirmou que as diligências existiram e incidiram sobre "executivos anteriores" ao seu.

Questionado se nesse lote de “executivos anteriores” está incluído o executivo de António Costa na Câmara Municipal de Lisboa, o atual autarca lisboeta não confirma, nem desmente.

“Não vos posso confirmar mais nada. Como sabem, por uma questão de separação de poderes, eu não fui informado a priori destas buscas”, explicou Carlos Moedas em declarações aos jornalistas.

O que diz a PGR?

O Ministério Público não esclarece se os executivos de António Costa que governaram a Câmara de Lisboa entre 1 de agosto de 2007 e 6 de abril de 2015 são visados nas buscas que ocorreram terça-feira à noite na autarquia da capital.

Em resposta às perguntas da Renascença, sobre o possível envolvimento de António Costa no inquérito, a Procuradoria Geral da República confirma “apenas a realização de buscas no âmbito de um inquérito que corre termos no DIAP de Lisboa”.

Sublinhando que o processo está sujeito a segredo de justiça, a PGR esclarece ainda que o inquérito “não tem arguidos constituídos”.

Ficam por responder as perguntas sobre qual é o período temporal sobre o qual incidem as investigações, e se o atual primeiro-ministro está, ou não, implicado.

Medina foi ouvido pelo Ministério Público?

Ainda não. Segundo a notícia original da CNN Portugal, o ministro das Finanças ainda será chamado a esclarecer se estava a par da contratação que assinou no valor de “dezenas de milhares de euros”.

Na quarta-feira, em resposta à notícia original, Fernando Medina disse não ter conhecimento "de qualquer investigação" e que os processos de contratação da autarquia "eram instruídos pelos serviços competentes para contratação, no cumprimento das normas aplicáveis".

Já esta quinta-feira, aos jornalistas, o governante anunciou que pediu à Procuradoria-Geral República (PGR) para ser ouvido no caso.

Fernando Medina admite que é sua "obrigação contribuir para o esclarecimento da situação", por isso pediu esta quinta-feira à procuradora-geral da República "que possa ser ouvido no processo que aparentemente é referido que existe", declarou.

O ministro das Finanças tenciona "expressar todos os esclarecimentos que o Ministério Público entenda necessários".

Medina assume ter contratado Joaquim Morão?

Sim. Em respostas aos jornalistas, esta quinta-feira, o antigo autarca que a decisão de contratar Joaquim Morão foi sua.

"As razões que levaram à contratação, à minha decisão de que Joaquim Morão trabalhasse na Câmara de Lisboa durante um período, estão expressas de forma muito clara no despacho que assinei naquele momento, no ano de 2015", respondeu.

No entanto, Medina defende que a contratação foi não "avulsa, desgarrada de um mandato" e garante que tudo foi feito dentro da legalidade e que o contrato de prestação de serviços com Morão foi feito por ajuste direto.

O que diz Joaquim Morão?

O "histórico" socialista e ex-autarca de Castelo Branco Joaquim Morão garante que não praticou qualquer ato ilícito no âmbito da prestação de serviços de consultadoria à Câmara de Lisboa, manifestando total disponibilidade para colaborar com a investigação.

"Estou totalmente disponível para colaborar no esclarecimento de todos os factos", referiu Joaquim Morão, numa nota enviada à agência Lusa.

O comendador disse estar ciente de não ter praticado "qualquer dos factos ilícitos veiculados pela comunicação social".


Medina vai manter-se no cargo?

Seria mais uma demissão a somar ao atual Governo, mas, por agora, não parece ser esse o desfecho. Medina disse, aos jornalistas, esta quinta-feira, que tem condições e que não está inibido no cargo.

“As condições que me dá, em primeiro lugar, a minha consciência. E a minha consciência é de quem tem mais de duas décadas de serviço público, que tomei dezenas de milhares de decisões em defesa do interesse público, sempre com a plena consciência de que as estava a tomar na defesa do interesse público, da sua correção, legalidade e da integridade que sempre pus no exercício da vida pública", defendeu.

O primeiro-ministro ainda não se pronunciou sobre o caso, mas o Presidente da República já deu uma ajuda para segurar o atual ministro das Finanças. Marcelo Rebelo de Sousa considerou esta quinta-feira que a investigação que envolverá o ministro das Finanças enquanto autarca de Lisboa é só isso mesmo, uma investigação.

Daí a tirar a conclusão de que não tem condições políticas para se manter no cargo "vai uma distância", refere o chefe de Estado.

O que diz o PSD?

Em sentido inverso, o principal partido de oposição refere que o ministro das Finanças "está muito debilitado" no seguimento do caso Alexandra Reis na TAP e este caso de saco azul na autarquia lisboeta.

O líder do grupo parlamentar do PSD, Joaquim Miranda Sarmento, evita, porém, fazer "processos de intenção" sobre o caso da Câmara de Lisboa, mas aponta que a atuação de Medina no caso da TAP tem o seu peso.

As declarações de Miranda Sarmento seguem-se às do líder do PSD, Luís Montenegro, que esta remeteu para o PS esclarecimentos sobre as buscas de terça-feira efetuadas pela PJ.

“Neste momento, quem tem de responder às questões suscitadas nesses processos é o Partido Socialista, são os anteriores presidentes da Câmara Municipal, porque os factos, tanto quanto pude perceber das notícias que foram veiculadas, dizem respeito a mandatos anteriores”, disse Luís Montenegro, aos jornalistas, esta quinta-feira.

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  • JM
    20 jan, 2023 Seixal 15:27
    Ponto da situação: o pasquim insinua que o ministro é corrupto, os jornaleiros desatam a correr atrás do mesmo ministro a perguntar-lhe quando é que se demite. Viva a transparência.

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