09 nov, 2024 - 23:12 • Alexandre Abrantes Neves
“Está difícil”. Amélia Galvão é uma das dezenas de trabalhadoras da grande distribuição em greve este sábado. A participar na manifestação nacional da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP), Amélia carrega uma longa faixa a pedir melhores salários. No seu caso, não é só isso que está em jogo.
“Queria um aumento já em setembro para fazer face ao Orçamento do Estado [risos]. Mas, no meu caso, é mais do que dinheiro. São as condições de trabalho. Há falta de pessoal e saio prejudicada”, assinala.
Em casa, não é a única com queixas. A filha recém-licenciada tem cada vez mais dificuldade em encontrar emprego na área e em suportar a renda de uma casa. São preocupações de muitos jovens, que vamos encontrando aqui e ali na longa mancha vermelha, pintada por bandeiras da CGTP e, de quando em vez, pela de Portugal também.
Rodrigo Azevedo, de 28 anos, acusa o Governo de pensar apenas em alguns – “não há um aumento geral de salários e o IRS Jovem só chega a 30%, deixa uma larga maioria de fora”. Na habitação, as medidas anunciadas para janeiro também não são melhores – “mas quem é o jovem que consegue suportar a prestação de uma casa?” –, e, por isso, a sentença de Rodrigo está feita: “nas nossas vidas, não tem impacto nenhum”.
CGTP
Melhores salários, pensões e o combate à habitação(...)
A cada esquina, a cada metro entre o Cais do Sodré e a Praça dos Restauradores, ouvem-se queixas de muitas das profissões que andaram nas bocas do mundo – desde professores a oficiais de justiça, aqui o acordo com o governo não faz esquecer o “aperto nos bolsos provocado pela pandemia e inflação”.
Os megafones – mais potentes do que o coro de vozes (cerca de mil, segundo a organização) que os segue – vão rodando entre vários gritos de ordem e trazendo à vez o que está na cabeça dos manifestantes. “Para os patrões são milhões, para os salários são tostões” ou “35 horas para todos” são frases que trazem curiosos à janela, que motivam perguntas por turistas e que até fazem empregados de cafés e restaurantes juntarem-se ao protesto por momentos nas esplanadas.
Mas, para Marta Saavedra, nada disto é novidade. As críticas, afinal, não são só para o governo – neste caso, foi a desilusão com “o partido de sempre” a principal causa para sair à rua.
“É a vontade dos políticos portugueses e não só os da direita. Devemos todos marcar uma posição como é preciso defender todos os grupos mais frágeis da população. (…) Estou muito zangada com o meu partido. Não tem sido um partido de esquerda”, lamenta à Renascença.
Marta prefere não dizer nomes, mas o do PS e de Pedro Nuno Santos paira no ar. E também é responsável pelo que se vê – e sente – quando se abre um site de arrendamento e venda de casas em Portugal.
“[Para] trabalhar em Lisboa quase que é preciso ir viver para Leiria. Isto nem é uma piada, é verdade. E o Orçamento do Estado é uma pouca vergonha. Não ajuda nisto e só fragiliza mais os serviços públicos”, critica.
A cabeça do amigo Luís Dias vai anuindo à medida que a ouve. No almanaque para 2025, só vê “perspetivas negativas” e também na saúde, nomeadamente na emergência médica. Mas o pior é mesmo os salários – e a ilusão dos últimos meses.
“No mês de outubro e novembro, as coisas podem ter melhorado um pouco com o acerto do IRS. Agora em dezembro ainda há o subsídio de Natal. Mas em janeiro do ano que vem, vamos ser confrontados com a dura realidade – e os problemas que aí estão”, alerta.
Crise na Saúde
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Também o dinheiro no bolso – ou aquele que lhe falta – foi o que fez João Santos ver o pôr do sol frente ao Palácio Foz. É reformado, “ainda não fez as pazes” com a direita desde a Troika e, por isso, não tem “grandes expectativas” para os próximos anos. E se a falta de estabilidade para as filhas o preocupa, ainda mais para os netos.
“Espero que este o meu seja um país para os meus netos também. Ainda são muito novinhos, tenho esperança que seja possível alterar as coisas”.
E se não for? “É continuar a luta”.