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Manifestação "Casa para Viver"

"Estabilidade sim, despejos não". Milhares de pessoas saem à rua em Lisboa pelo direito à habitação

28 set, 2024 - 23:27 • Alexandre Abrantes Neves

Jovens prestes a emigrar, outros com dificuldades em arranjar uma casa para viver com os filhos e ainda quem tenha de se mudar para longe da família para conseguir pagar uma renda. Numa cidade com um dos preços por metro quadrado mais elevado na Europa, os manifestantes prometem não deixar as ruas lisboetas enquanto não arranjarem um teto a preços acessíveis.

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Reportagem Alexandre Abrantes Neves Manifestação habitação 28 setembro 2024
Ouça aqui a reportagem da Renascença. Foto: António Cotrim/Lusa

“Queremos casa para viver, queremos casa para dormir”. O pedido parece simples, mas para Pedro Covas, de 35 anos, tem sido a razão para muitas noites em branco. Já a meio da Avenida Almirante Reis, com a Praça Martim Moniz a espreitar entre a multidão, conta à Renascença que, nos últimos nove anos, teve de mudar de casa sete vezes “por não ter forma de pagar a renda”. A solução é, por isso, só uma – emigrar.

Nos meus planos, infelizmente, está emigrar. Não é esta a estabilidade que eu procuro. Em casos como o meu, em que cada ordenado serve para pagar as contas de cada mês e pouco conseguimos poupar, não vejo segurança suficiente para iniciar uma família”, explica, antes de voltar a pegar nos cartazes que trouxe de casa.

O desfile vai descendo e a Praça Martim Moniz começa a ficar pequena para albergar tantos que pedem medidas para resolver “de vez e de forma rápida” o problema da habitação. Nos jardins da praça, há um pormenor que não passa despercebido a todos os que ali passam perto – já se começam a montar tendas para vários sem-abrigo passarem a noite, apesar de ainda faltarem mais de duas horas para o pôr do sol.

Para Diana Gomes, este é o reflexo de um problema que persiste “por políticas públicas insuficientes, com demasiadas casas vazias enquanto há muitas pessoas a necessitar e a viver na rua”. Diana chegou à capital para estudar e para começar uma vida longe da casa dos pais – mas, 15 anos depois, continua por concretizar o sonho de ter uma casa própria.

“Continuo a viver em quartos aos 32 anos. Não tenho sequer condições para arrendar uma casa só para mim, porque cada vez há mais especulação. Há demasiado tempo que não se coloca um teto às rendas. As políticas anunciadas por este governo parecem-me um tapa olhos”.

A emancipação é difícil, mas conseguir uma habitação digna para quem tem filhos também. Inês Marinho é enfermeira, mãe solteira de um bebé e está a braços com o problema “muito grande” de encontrar uma casa que possa pagar. A isto, acresce-se ainda uma previsão difícil para os próximos meses – tem 35 anos e vai deixar de ser elegível para os apoios à habitação aprovados pelo governo.

A minha geração é a Geração ‘à rasca’ e ‘à rasca’ continuará. Certamente, não vamos ter a vida que os nossos pais tiveram. A autonomia é algo que esta geração não vai ter”, lamenta, antes de voltar a pegar no megafone e acelerar o passo para apanhar a frente da manifestação, que já vai quase a sair da Praça da Figueira, no Rossio.

A chegada ao Chiado torna a mancha de manifestantes ainda mais densa e as ruas são demasiado estreitas para todos os megafones, bandeiras e cartazes que, para além de palavras de ordem como “estabilidade sim, despejos não”, também pedem o fim do racismo e a libertação da Palestina.

Ainda antes de virarmos a esquina para o Arco da Rua Augusta, cruzamo-nos com Ana Pereira e Bruno Santos. Ambos com 43 anos e casados, lamentam “não poder mudar de casa, se quisermos” e apontam o impacto emocional como o pior da crise na habitação.

Perdemos os nossos amigos e a família próxima, que têm de se mudar para longe para conseguirem suportar uma casa. Os laços vão-se perdendo por isso”, refere Bruno, enquanto a mulher acena com a cabeça, num gesto que parece misturar conformismo e tristeza.

Para além de famílias, há também muitas associações em risco de ficarem sem teto. É o caso do coletivo artístico Serigaita que pode ter de abandonar a sede nos Anjos em breve, se o tribunal der razão ao senhorio e os obrigar a obedecer à ordem de despejo.

Teresa, uma das responsáveis pelo projeto, lamenta que se esteja a perder a pouco e pouco a alma da cidade de Lisboa.

Estamos a perder espaços onde as pessoas podem conversar, fazer política fora da lógica partidária, podem aceder a cultura, podem ver artistas ou comer a preços populares. São espaços importantíssimos para as pessoas conseguirem ter uma vida preenchida”.

Ainda estamos a conversar sobre o que se pode ou não fazer para salvar estas associações, quando a música começa a tocar no palco que marca o fim do protesto.

Na frente da manifestação, a organização colocou vários imigrantes, também eles afetados pela falta de casas. As palavras que gritavam dão a entender que não vão parar de lutar até ganharem um teto para dormir – “estamos juntos, estamos fortes”.

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